Monarquia
Portugal foi governado por uma monarquia financeira, cujos responsáveis estão por ser julgados.
Para quando uma mudança de atitude?
Ainda agora começou a comissão parlamentar de inquérito e o pior já
se confirmou. A Caixa foi sempre vista pelos governantes como um
instrumento de poder ao seu serviço. Os recursos dos contribuintes foram
utilizados por alguns e em favor de poucos, deixando milhares de
milhões de euros em prejuízos numa factura ocultada durante mais de 15
anos, que é agora da responsabilidade do contribuinte.
Das muitas decisões desastrosas destacam-se o investimento em
Espanha, a tomada de participação no BCP, a concessão de créditos sem
garantias, a compra de várias participações em empresas cotadas (Cimpor,
EDP, ZON, BRISA, PT), a ajuda dada ao grupo Espírito Santo no controlo
da PT, entre muitas outras.
A guerra pela compra do BCP foi o culminar do desespero pelo
domínio absoluto do sistema financeiro. A desculpa foi convincente –
defesa dos centros de decisão nacionais. Mas como se pode defender uma
causa sem dinheiro? A resposta estava na utilização do dinheiro dos
contribuintes. O final foi trágico, com todas as grandes empresas a
perder accionistas de referência portugueses.
Os sucessivos governos foram cúmplices e tiveram a sua
responsabilidade no que foi uma fraude ao contribuinte. Retiravam-se
dividendos e, no fim de cada ano, devolvia-se esse montante ou mais em
aumentos de capital. Ao distribuir dividendos da CGD era possível
disfarçar o défice e apresentar contas que dependiam de resultados
financeiros, uma vez que os dividendos são contabilizados como receita.
Os aumentos de capital por sua vez acrescem à dívida, que não tem tanta
visibilidade como o défice. Desde 2007 já foram injectados na Caixa mais
de 3.850 mil milhões de euros em capital, sendo que o total se
aproximará dos 9 mil milhões de euros, concluído o presente plano de
recapitalização.
Os actores políticos, continuam a tentar passar a ideia que a
responsável pela catástrofe da Caixa foi a famigerada crise financeira.
Ora esta apenas pôs a nu o que se estava a passar – uma monarquia
financeira, orquestrada por privilegiados, que ditou os destinos de
grupos económicos e elegeu vencedores com pés de barro. Neste campo
ninguém está a salvo: administrações, governos, troika, supervisores e
auditores. Todos de uma forma ou de outra tomaram parte nesta triste
história.
Os relatórios de auditorias e de gestão omitiram, por
desconhecimento ou não, as reais imparidades e fragilidades da Caixa.
Ninguém acredita que os prejuízos agora revelados se referem ao ultimo
ano. Sendo assim, como pode um depositante ou investidor avaliar o risco
da sua entidade financeira se os relatórios de auditoria não reflectem a
veracidade da solidez financeira, ou os riscos da instituição? É
difícil perceber porque é da responsabilidade do investidor e do
depositante a avaliação do seu banco, quando aparentemente nem o
supervisor sabe o que lá se passa.
A mais recente subida de taxas de juro reflecte a insegurança dos
investidores no sector financeiro que, na próxima crise, não poderá ir
em socorro do Estado e comprar dívida. Portugal foi governado por uma
monarquia financeira, cujos responsáveis estão por ser julgados. Para
quando uma mudança de atitude?
* Economista
IN "JORNAL ECONÓMICO"
13/01/17
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