HOJE NO
"OBSERVADOR"
Antigo tradutor do hebraico original diz
.que “a Bíblia não fala de Deus”
Mauro Biglino, antigo tradutor das Edizioni San Paolo (uma das mais importantes editoras católicas), traduziu durante anos escritos originais da Bíblia. Agora afirma que o livro não fala sobre Deus.
Mauro Biglino trabalhou durante anos no Vaticano como tradutor de hebraico antigo para as Edizioni San Paolo,
uma das mais importantes editoras católicas do mundo, que edita a
Bíblia e outros livros católicos em todo o mundo, incluindo em Portugal
(Editora Paulus). Era responsável pela tradução dos escritos originais
da Bíblia, em hebraico, para a publicação em italiano pela editora
pertencente à Sociedade de São Paulo, congregação fundada em 1914 pelo
Beato Giacomo Alberione. Trinta anos depois de ter começado o seu
trabalho como tradutor, publicou “A Bíblia não é um Livro Sagrado”
(Livros Horizonte), obra polémica em que assegura: “A Bíblia não é
aquilo que habitualmente se diz. Conta uma outra história, não se ocupa
de Deus”.
.
Ao Observador, Biglino afirma que “não há qualquer referência a Deus nos textos da Bíblia. Há, sim, a um coletivo, chamado Elohim, e a um deles em particular, chamado Yaveh“. A dada altura, explica o autor, “as traduções foram sendo adulteradas e foram convertendo Yaveh
num Deus único e todo poderoso”. E acrescenta: “Em hebraico nem sequer
há nenhuma palavra que signifique Deus”. No seu livro, Mauro Biglino
detalha o percurso das traduções oficiais da Bíblia, acusando a Igreja
Católica de ter adulterado as traduções “para inventar o monoteísmo”.
Biglino, que nasceu em 1950 na cidade italiana de Turim,
aprendeu hebraico na comunidade hebraica de Turim. Mais tarde, a editora
do Vaticano apercebeu-se dos trabalhos de tradução de Biglino,
reconheceu o seu rigor e convidou-o para colaborar. “Além disso,
perceberam que eu também conhecia latim e grego, línguas essenciais para
entender o contexto dos textos bíblicos”, acrescenta.
“Em 2010,
comecei a escrever um livro em que denunciava algumas das contradições
que estava a encontrar nas minhas traduções dos textos bíblicos, e desde
esse momento, a colaboração foi interrompida, acabaram o meu contrato
de trabalho”, lembra. Biglino acrescenta que compreende “perfeitamente” a
decisão da editora, uma vez que se tornou “inviável” estar ao serviço
da editora e obter conclusões tão distintas.
Quando deixou de colaborar com as Edizioni San Paolo,
Biglino publicou livros em que apresentou traduções literais, palavra
por palavra, de vários textos bíblicos, que foram usados por
historiadores para identificar imprecisões. Nesses livros, que mostravam
lado a lado as palavras italianas e hebraicas, Biglino argumenta que a
Bíblia contém diversas imprecisões facilmente demonstráveis. “É por isso
que os críticos discordam das minhas conclusões mas não põem em causa o
rigor das traduções”, sublinha.
“Quando eu digo que a Bíblia não
fala de Deus, não digo que Deus não existe, porque não o sei. Digo
apenas que a Bíblia não fala de Deus”, destaca, acrescentando que, no
seu entender, “não se sabe nada sobre Deus”. Por isso, sublinha, “como
Deus me é absolutamente desconhecido, não posso acreditar nele”. Mauro
Biglino afirma ainda que não é o único a discordar das traduções
oficiais da Bíblia, mas acrescenta que “não há muitos que tenham a
coragem de divulgar as suas conclusões”.
Para o antigo tradutor, o
seu trabalho pode mesmo ter influência nas futuras traduções da Bíblia,
avançando que já se sentem alguns efeitos. “A profecia de Isaías, por
exemplo, dizia que «a Virgem irá conceber e dará à luz um Filho», mas as
bíblias alemãs, depois da aprovação da Conferência Episcopal, já não
dizem isso. Já dizem que «a Virgem vai conceber», que é o que
verdadeiramente lá está escrito”, destaca Mauro.
Contactada pelo Observador, a editora italiana confirmou que Mauro Biglino já deixou de colaborar com as Edizioni San Paolo “há muitos anos”, pelo que recusou comentar o trabalho atual do tradutor.
* A bíblia é uma colectânea de fábulas de onde se retiram as as mais prodigiosas inverdades.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário