01/05/2016

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 ESTA SEMANA NA  
"VISÃO"

Morreu Paulo Varela Gomes, escritor,
. historiador, cronista, homem vertical

Vítima de um cancro, o autor e historiador perdeu este sábado a sua luta de quatro anos com a doença. Deixa um legado de livros e de opiniões que marcaram gerações

“Tenho um cancro de grau IV. De cada vez que abro o teclado do computador na intenção de escrever, ocorre-me a frase, já mil vezes repetida, “Quando estiverem a ler estas linhas, é provável que o autor já não esteja vivo”. 
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Era assim que Paulo Varela Gomes começava Morrer é mais difícil do que parece, impressionante texto escrito para o quinto volume da revista Granta, em 2015, em que assumia as lutas com a doença de que padecia, e que começara, como tantas outras, com a descoberta de “um inchaço do tamanho de uma amêndoa no lado esquerdo do pescoço.” 

O testemunho segue com a catadupa de eventos que alteraram a vida até então conhecida: a “obrigatória TAC cervical”, o médico com a “expressão macambúzia” a comunicar o impensável, a confirmação de que não havia nada a fazer. Depois, os mais de mil dias em que a vida mudou, a alimentação mudou, a homeopatia ajudou, o desespero chegou, o suicídio quase o tentou, uma espécie de redenção jubilatória o salvou. Meia dúzia de páginas escritas com uma rara lucidez e desassombro. 

Os leitores já tinham igualmente os romances que escreveu nos últimos anos, numa corrida que demonstrou que, ali, estava guardado um escritor refinado, acutilante, capaz de páginas memoráveis, ao lado do cronista brilhante e do historiador que levou à redescoberta do património e história portugueses pelo mundo.

Nascido em 1952, filho do coronel Varela Gomes, figura destacada na luta contra o regime, Paulo Varela Gomes estudou História na Faculdade de Letras de Lisboa. Antes de se reformar, por causa da doença, era investigador no CES-Centro de Estudos Sociais e docente do programa de doutoramento Patrimónios da Influência Portuguesa. Foi militante da UEC - União dos Estudantes comunistas e do PCP, antes de integrar o grupo fundador do Movimento Política XXI, uma das correntes que deu origem ao Bloco de Esquerda. 

Sobre Goa, onde viveu durante os anos em que foi representante da Fundação Oriente, escreveu crónicas que davam conta dos rastos portugueses e da diferença do outro. O seu rosto também foi presença familiar no pequeno ecrã: protagonizou os documentários O Mundo de Cá (2002) e Malta Portuguesa (2002). Era casado, tinha dois filhos e um neto. Linhas curtas onde não cabem tudo o que era.

Vencedor do Prémio PEN Narrativa 2015 atribuído ao romance Hotel, o escritor publicou (sempre na editora Tinta da China), o volume de crónicas Ouro e Cinza (2014), e os livros O Verão de 2012 (2014), Era Uma Vez em Goa (2015), Passos Perdidos (2016). Hoje, leia-se este extrato de Morrer é mais difícil do que parece, recuperado pela Granta:
«A vida é muito menos cheia de prosápia do que a morte. É uma espécie de maré pacífica, um grande e largo rio. Na vida é sempre manhã e está um tempo esplêndido. Ao contrário da morte, o amor, que é o outro nome da vida, não me deixa morrer às primeiras: obriga‑me a pensar nas pessoas, nos animais e nas plantas de quem gosto e que vou abandonar. Quando a vida manda mais em mim do que a morte, amo os que me amam, e cresce de repente no meu coração a maré da vida.»

* Partiu um HOMEM!

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