HOJE NO
"DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
Cimento em vez de calçada em Lisboa?
"Está muito melhor"
Solução agrada
a quem caminha na Rua de Alcântara, mas perspetiva de se alargar ao
resto da cidade é contestada por movimento cívico. No centro histórico,
calçada é para manter
Calçada à
portuguesa ou blocos de cimento branco a revestir os passeios de Lisboa?
O debate reacendeu-se depois de, há cerca de uma semana, o presidente
da câmara municipal (CML), Fernando Medina, ter visitado a renovada Rua
de Alcântara, onde foi maioritariamente adotada a última solução,
instalada a par de uma estreita faixa tradicional junto aos prédios.
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Quem
ali reside e trabalha está satisfeito e sente-se mais seguro ao
caminhar na rua, mas, para Luís Marques da Silva, arquiteto e membro do
movimento cívico Fórum Cidadania Lx, o novo material não traz qualquer
vantagem, "a não ser na linha de partida", incluindo para pessoas que se
desloquem em cadeira-de-rodas. A autarquia contrapõe, por sua vez, que
nas "freguesias identificadas como centro histórico", o "princípio geral
é o da manutenção ou reconstrução da calçada em vidraço", devendo
"haver cuidados particulares na escolha da pedra, na execução e na
certificação dos calceteiros executantes". Já nas restantes, a
orientação é para que seja instalada "sempre uma faixa de pavimento
confortável, contínuo e antiderrapante, (...) adaptável à largura
efetiva do passeio". O objetivo é haver passeios "seguros e
confortáveis" para todos.
"Está muito
melhor. Já não escorrega", congratula-se Adelaide Marques, 75 anos e há
47 residente perto da Rua de Alcântara. Não é a única a pensar assim.
Funcionário há mais de dez anos na Pastelaria Lorena, Ângelo Leal estava
já habituado a ver, "de volta e meia", a ver pessoas, sobretudo idosos,
a cair no passeio em calçada. Agora, já não acredita que tal vá
acontecer. "Só é pena que não tenham ido até mais longe", acrescenta a
idosa.
Luís Marques da Silva tem,
porém, uma perspetiva diferente. "Quando [este pavimento] é aplicado, é
muito confortável ao andar. É novo. Com o passar do tempo, com a
degradação a que está sujeito e a manutenção que temos, não se torna
igualmente resistente como a calçada", defende o arquiteto, que antevê
que, dentro de "três ou quatro anos", passeios como o da Rua de
Alcântara se encontrem num "estado deplorável".
O
membro do Fórum Cidadania Lx defende, de resto, que a calçada à
portuguesa é tão inclusiva como as soluções que a autarquia quer adotar.
"É permeável e, quando é devidamente executada, é extraordinariamente
lisa. Logo à partida não é, mas torna-se e mantém-se ao longo do tempo",
compara, adiantando que as intervenções de maior dimensão poderiam ser
aproveitadas pela autarquia para recuperar a calçada em vez de a
substituir por outro material. E ironiza com o facto de, no centro
histórico, onde o declive é acentuado, aquela ser para continuar: "Aí
não têm direito a passeios inclusivos."
Ao
DN, a autarquia confirma, numa resposta por e-mail, que nas freguesias
de Santa Maria Maior, São Vicente, Santo António, Misericórdia, Estrela e
Belém, "o princípio geral é o da manutenção ou reconstrução da calçada
em vidraço branco", mas ressalva que, "nas áreas de maior declive e em
todas em que seja maior o risco de escorregamento", deverão ser postas
em prática "medidas específicas".
Assim,
precisa, "nas ruas com inclinação igual ou superior a 5%, dever-se-á
utilizar pedra de calcário e granito", enquanto nas restantes, "a uma
distância correspondente a um passo, deverão ser intercaladas, no
sentido da largura do passeio, travessas em pedra natural ou artificial,
de cor clara, antiderrapante, para travar as pedras e reduzir o risco
de escorregamento". As opções parecem ir ao encontro do preconizado por
Luís Marques da Silva, para quem intercalar pedras de diferentes tipos
permite manter a calçada, sem perder segurança.
Certo
é que, garante a CML, "a calçada artística, elemento da identidade de
Lisboa, deverá ser, em regra, conservada e restaurada", estando
atualmente "a ser efetuado um inventário exaustivo" daquela que "será
para manter".
Lioz na Baixa em mau estado
A
discussão em torno do futuro da calçada ganhou destaque com a
recuperação, em 2014, da Rua da Vitória, na Baixa Pombalina, desde então
pavimentada com pedra de lioz e que se encontra já partida em alguns
locais. Os danos, frisa a autarquia ao DN, estão a ser avaliados, "para
se executar as reparações necessárias logo que possível".
Em
melhor estado está a Calçada da Ajuda, onde a pedra escura e um
pavimento antiderrapante imperam. A artéria tem vindo a ser alvo de uma
intervenção profunda, tendo a solução adotada sido considerada "muito
feliz" por Fernando Medina, no seu primeiro dia enquanto presidente da
CML, a 7 de abril do ano passado. Quem nela circula a pé gosta dos
passeios mais largos, mas, para Henriques, ali comerciante há 50 anos,
estes poderiam ser mais estreitos: "Tiraram o estacionamento e, ao final
da tarde, o trânsito é uma confusão."
* A estabilidade dos passeios de cimento é ilusória, a feiura é permanente.
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