12/02/2016

ADRIANO MOREIRA

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A mudança do conceito 
de potência

O incidente das estátuas pudicamente cobertas, não pelo manto diáfano da fantasia mas pela dureza da submissão revelada perante o representante político de uma potência de área cultural diferente da ocidental, o que não deixa esquecer não é uma leviandade protocolar, é sim a dificuldade crescente de impedir que a Europa, não há muito considerada a "luz do mundo", seja um passado histórico e não a voz de um novo tempo de grandezas para a casa comum dos homens que se prometeu ser o globo. Tratou-se de um incidente entre a nobre soma de países, a procurar que a União Europeia recupere uma posição na hierarquia das potências, um processo que vai mostrando as dificuldades de conciliar a memória de soberania e proeminência de cada uma com as realidades do tempo mal sabido em que vivemos.
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Por surpreendente que pareça, o pudico incidente das estátuas põe em evidência que o conceito de potência, que não pode ser omitido no desenvolver do processo histórico da União Europeia, está presente nos procedimentos, formalmente diplomáticos, que inspiraram a cobertura não transparente das estátuas, mas suficientemente transparente quanto à debilidade que vai atingindo a antiga "luz do mundo". Nesta idade já chamada, entre outras denominações, pós-bipolar, o critério identificador de uma potência, e do seu lugar na real hierarquia do poder na comunidade mundial, encontra muitas dificuldades de distinguir entre um poder financeiro e económico e um poder militar, uma circunstância muito evidente nas atitudes do governo russo depois do fim do "homem soviético".
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O neoliberalismo que foi adotado depois da queda do Muro, mais parecido em muitos lugares com um neorriquismo afastado da justiça social, tornou praticamente impossível identificar os reais centros de poder, e a respetiva posição na conjuntura mundial a que fomos conduzidos. Ainda para complicar mais a conjuntura, o terrorismo mostrou, especialmente aos EUA, com a queda das Torres Gémeas, que o combate do fraco contra o forte mudou seriamente a questão da segurança e da paz. Ao mesmo tempo que as migrações descontroladas, além de acordarem os interesses e as incapacidades individuais dos Estados membros, fizeram que a questão, antes discutidíssima, da inclusão da mão-de--obra barata e favorável ao mercado local, se tornasse desafiante, impossível para muitos, como a Grécia, de resposta, e inspiradora para outros de verdadeiro regresso à política de exclusão no lugar que supúnhamos pertencer ao asilo e à proteção. Parece que a ideologia orçamentalista a que os factos conduziram os mais beneficiados quando estabeleceram regras para os carentes mostrou inquietante hesitação perante a política do governo soviético, mais orientado pela dimensão dos contingentes do que pela de cabimento orçamental, tudo porque a débil política de defesa e segurança autónoma europeia se esqueceu de estabelecer a definição de fronteiras amigas, e, como se vê pelas circunstâncias de risco atuais, também dos recursos orçamentais.
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Com a demonstração paralela de que o soft power, que os EUA foram proclamando, mesmo sem palavras, para moderar o imponderado ardor de W. Bush, não é hoje uma resposta suficiente para os problemas que a União enfrenta, e que, com imprevisibilidade, crescem os perigos da falta de confiança no projeto regional dos europeus. O regresso dos mitos raciais vai--se enriquecendo, enquanto as esperanças postas no "caminhar juntos" com a chamada democratização dos espaços muçulmanos não deu até agora resultado.
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Uma política moderadora parece absolutamente necessária, em vista da debilitação do antigo poder militar, e da dimensão vasta da inidentidade dos novos poderes. Mas sobretudo retornar ao culto dos valores que fizeram da Europa a "luz do mundo", agora decidida a não impor a hegemonia, mas pelo menos decidida a destapar as estátuas.
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Não parece aceitável que a inidentidade dos poderes que governam de facto a decadência europeia não despertem as novas gerações para uma nova visão e decisão, que reformem e reponham em ação construtiva os ideais que levaram, no fim da guerra de 1939-1945, a fundar a ONU e as suas agências, algumas das quais conseguiram responder com êxito setorial, mas é evidente que o projeto fundamental do Mundo Único não conseguiu criar raízes. Não há possibilidade de esconder as degradações em progresso, mesmo alargando a inspiração que levou a cobrir as estátuas.
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A variedade de atitudes dos Estados membros, em face da tempestade das migrações que já não podem ser olhadas como vantagem para o mercado do trabalho, é suficiente para assumir que a unidade europeia está a sofrer um novo e sério desafio, a exigir reformar os métodos de governança e o conceito de potência para não perder o eixo da roda.

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
10/01/16

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