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A honestidade de Piqué
Hipocrisia. A melhor definição para os adeptos que
exigem honestidade da parte dos jogadores, mas que são os primeiros a
atirar uma pedra – e a usar expressões como “não devia dizer isto” ou
“desta vez foi longe demais” – quando os homens do futebol dizem,
realmente, o que sentem, sem meias palavras e discursos politicamente
corretos.
Piqué está a sofrer na pele as
consequências da sua frontalidade. Nasceu em Barcelona, joga no
Barcelona e não tem problemas em afirmar que quer que o Real perca
sempre. Como ele, outros pensam da mesma forma. Dos dois lados da
barricada. Mas não o dizem. Há que respeitar essa opção. Mas também há
que aplaudir aqueles que não têm medo de dizer o que lhes vai na alma.
São uma espécie em vias de extinção. No futebol e na vida.
A
guerra começou no final da época passada, durante as comemorações do
campeonato ganho pelo Barça, quando o central da Catalunha agradeceu a
Kevin Roldan, cantor colombiano que esteve na festa dos 30 anos de
Cristiano Ronaldo no dia em que os merengues perderam 4-0 frente ao
Atlético de Madrid, permitindo ao Barcelona isolar-se na qualificação.
Foi um gozo. Uma provocação. Típica de um adepto rival. E então? Qual é o
problema? As gentes de Madrid não gostaram? Paciência. Agora querem que
Piqué deixe de ir à seleção por causa da rivalidade Barça-Real? Era o
que mais faltava. Hipocrisia e memória curta andam, geralmente, de mão
dada no futebol.
Piqué foi campeão do Mundo
(2010) e da Europa (2012). Tem 73 internacionalizações ao serviço da
Roja. Sempre deixou tudo em campo com a camisola de Espanha. Ninguém
pode atacá-lo de falta de compromisso num único jogo por ser um apoiante
da independência da Catalunha. Nunca foi menos jogador na seleção por
causa das suas convicções políticas. Essas nada têm a ver com futebol.
Os
adeptos merengues, anti-Barça, não deixaram de comemorar cada corte
decisivo que Piqué fez na Roja, cada um dos quatro golos que marcou
(três deles em qualificações para o Mundial) e nenhum deles reagiu com
desprezo ao golo de Iniesta - outro que vem da escola blaugrana – na
final do Mundial de África do Sul.
Piqué já
garantiu que não vai abandonar a seleção de Espanha por mais assobios e
mudanças de estádio que estejam para acontecer. Faz bem. Quem já suou
tanto com aquela camisola, não merece ser crucificado por causa da sua
paixão clubística ou ideologia política. «Sou assim e não vou mudar»,
diz ele. Não mude. Fazem falta homens genuínos no futebol. Genuínos e
corajosos.
IN "RECORD"
11/08/15
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