Riscos e falácias
da TSU socialista
O documento preparado pelos economistas do PS, que
esteve na base do programa eleitoral socialista aprovado este
fim-de-semana, já toda a gente o disse, tem a virtude de quantificar
propostas e de elevar a qualidade do debate. Mas, pelo rumo que os
argumentos parecem levar, só quem tiver um modelo de simulação
macro-económico no seu computador está habilitado a pôr em causa a
bondade de algumas soluções.
Ficam três notas, assumindo de antemão que elas não qualificam como análise económica.
Ficam três notas, assumindo de antemão que elas não qualificam como análise económica.
1. Ao longo das últimas décadas, o espectro da
falência da Segurança Social tem andado sempre a rondar. O alarme cria
maior consciência dos direitos e deveres contributivos, mas também
semeia o medo e erode a confiança no sistema público de pensões.
Uma das razões pelas quais este mesmo PS resolveu, em 2007, separar
mais claramente as prestações sociais que devem ser pagas por impostos
gerais daquelas que resultam directamente dos descontos
de cada um, foi precisamente para tornar mais clara a relação entre o
que se desconta e o que se recebe, reforçando o chamado princípio da
contributividade.
Ou seja, apesar de se entender que, em teoria, o Estado é só um, e
que em cada momento ele deve ser capaz de gerir os seus recursos e
assumir os seus compromissos, reconhece-se que o risco político é grande
e que a Segurança Social, pela sua delicadeza, deve ser especialmente
protegida.
Quando agora vem propor-se a reduzir a TSU dos trabalhadores e das
empresas e a cobrir o buraco maioritariamente por via de impostos, o PS
volta a baralhar tudo e destrói este esforço de segregação do financiamento da Segurança Social que promoveu ainda há poucos anos.
É dito que os cortes serão feitos com a máxima cautela e que há espaço para revertê-los a qualquer momento. Mas não é preciso ser-se experimentado na política para saber quão difícil é tirar aquilo que já se deu: se as medidas não tiverem o impacto esperado, muito dificilmente o PS voltará a subir o que desceu, nomeadamente no caso da TSU das empresas. A Segurança Social ficará mais debilitada, mais refém da apreciação política dos governos vindouros, e com o fantasma da insustentabilidade mais vivo do que nunca. Basta ver o que acontece hoje em dia com a Caixa Geral de Aposentações.
2.Os socialistas não falam claro sobre quem
suporta a descida da TSU das empresas. O embaraço é evidente na
tentativa de dissimulação da medida, chamando-lhe "diversificação de
fontes de financiamento", mas é-o sobretudo na justificação apresentada.
Quem ouve António Costa a falar, fica com a ideia de que o que está
aqui em causa é obrigar as grandes empresas lucrativas a pagar mais IRC
para aliviar os impostos sobre o trabalho às pequenas, que criam mais
empregos. E nada é mais enganador.
A descida da TSU das empresas custa 850 milhões de euros por ano, a
partir do quarto ano, um valor que é compensado por 100 milhões de
euros de imposto sobre heranças milionárias, 200 milhões de euros de uma
taxa que penaliza a alta rotatividade de pessoal, 240 milhões de euros
de consignação de IRC (que correspondem ao custo teórico de uma descida
de dois pontos de IRC), e os restantes 300 milhões de euros por
impostos.
Como "consignar" IRC é tão-somente sinónimo de desviar este dinheiro
do Orçamento Geral do Estado para um fim em especifico, obrigando a
aumentar impostos ou a reduzir serviços públicos, esta fonte de receita é
um financiamento por impostos gerais.
Em suma, com a proposta do PS, as empresas continuarão a pagar a
mesma taxa de IRC, todas sentirão um alívio na TSU, e 65% desta redução
será financiada pela generalidade dos contribuintes.
3.A narrativa que o partido vem construindo diz
mais ou menos isto: depois de o País ter passado por uma das piores
recessões da sua história, a prioridade das prioridades é injectar
liquidez nas empresas, aumentar a procura e relançar o crescimento
económico e o emprego. No contexto de uma união monetária os
instrumentos escasseiam, e a descida da TSU, quer para trabalhadores,
quer para empregadores, tem de fazer parte da equação. E o que está aqui
em causa é escolher entre a catástrofe que é nada fazer e este plano de
acção corajoso e controlado.
Não deixa de ser curioso notar como o mesmo partido que nos últimos
quatro ano bradou contra as soluções únicas, tão facilmente arrisca a
autonomia da Segurança Social com o argumento de que não há
alternativas.
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
07/06/15
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