16/04/2015

RUI TAVARES

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As outras presidenciais


Falemos então de presidenciais... americanas.

Ao contrário das portuguesas, arriscam-se a ser das eleições mais monótonas do milénio, de forma que podemos despachá-las já.

Não que não haja diferenças, sobretudo entre os partidos. Ao contrário de boa parte do século XX, quando ainda havia republicanos “de esquerda” e democráticos “de direita” (pois estes partidos eram mais federações de interesses do que plataformas ideológicas), no século XXI eles estão cada vez mais distantes e mais “europeus” — no sentido de se adaptarem com mais facilidade à divisão esquerda-direita do espectro político. Em questão após questão, os seus eleitorados distribuem-se como seria de esperar, do casamento gay à redistribuição e ao aquecimento global. Não é indiferente qual é a base eleitoral para que um (ou uma) presidente dos EUA trabalha: se mais ou menos plural, mais cosmopolita ou nativista, mais ecológica ou industrialista. Também não é indiferente saber quem vai poder nomear os próximos juízes do Supremo Tribunal norte-americano, e assim ajudar a determinar boa parte da agenda de direitos num dos maiores e mais influente países do mundo. Por isso, quando chegar a altura, vou torcer para que ganhe um democrático — ou, com toda a probabilidade, uma democrática.

Mas suspeito que a eleição em si vá ser sobretudo centrada em saber quem é mais patriótico ou quem acha que os EUA são o maior país do mundo. O facto de termos, com muita probabilidade, Hillary Clinton competindo com Jeb Bush, atira-nos de novo para as mesmas dinastias políticas que já conhecemos desde as eleições de 1992 (se pensarmos apenas nos Bush, desde 1972 e a era de Nixon) e equaliza os candidatos.

Claro que em grandes países federais, como os EUA, o Brasil e a Índia, a dinastia familiar é um atalho para tornar os candidatos presidenciais mais conhecidos de populações muito diversas e muito dispersas. Daí os Bush e os Clinton, ou Aécio Neves neto de Tancredo e o malogrado Eduardo Campos nas últimas eleições brasileiras, para não falar dos Nehru/Gandhi. Mas mesmo nestes países há sempre a possibilidade de candidatos desconhecidos emergirem muito rapidamente, como aconteceu com Jânio Quadros no Brasil e agora com o Partido do Homem Comum na Índia (por acaso — ou não por acaso — ambos tinham a vassoura como símbolo). Infelizmente, não se vislumbra que isso possa acontecer desta vez.

A única hipótese de se animarem estas eleições está nas primárias de cada partido. Se o senador Bernie Sanders, que se descreve como o único socialista do Congresso dos EUA, se candidatar entre os democráticos, poderemos ter um contraponto à candidatura que o conservador-libertário Rand Paul já anunciou no Partido Republicano. Estes vão ser os candidatos mais interessantes de seguir. Ou melhor — os únicos interessantes de seguir.

(A tempo: quando tudo acabar, teremos certamente um ou uma presidente dos EUA menos interessado na Europa e na sua crise. Obama encontra-se esta semana com Varoufakis e Schäuble, Dijsselbloem e Draghi estão também em Washington. A seguir.)

IN "PÚBLICO"
15/04/15

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