18/04/2014

EVA GASPAR

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Guerra escondida 
nas europeias

Pelo segundo ano consecutivo, os Governos de todo o mundo gastaram em 2013 menos em defesa (-1,9%), consagrando-lhe, ainda assim, o equivalente a 2,4% do que se produz no planeta. Continuando a ser quem mais gasta – 37% do total mundial – os Estados Unidos foi quem voltou a cortar mais (-7,8%) e a intenção do secretário de Estado da Defesa, Chuck Hagel, é reduzir progressivamente os gastos militares norte-americanos à dimensão anterior à II Guerra Mundial.

Na Europa, a tendência de contenção prossegue. No Reino Unido, mas sobretudo em França, o país da União Europeia que investe mais neste domínio, sendo responsável por 3,3% dos gastos mundiais. Já a Alemanha tem subido ligeiramente o seu orçamento de defesa, não impedindo que, hoje, os três "grandes" da Europa representem menos de 10% do orçamento do mundo em homens e máquinas de fazer guerra que, em muito lugar, têm servido para manter ou repor a paz.

Visto o planeta por estas lentes saltam à vista duas tremendas excepções: China e Rússia. Na última década, os gastos militares de Pequim cresceram 170%, acima do crescimento acumulado da economia, de 140%. Os de Moscovo escalaram 108%, mais do que duplicando os 40% que a economia cresceu entre 2004 e 2013. Pela primeira vez, a Rússia consagrou no ano passado uma maior fatia do seu PIB à defesa do que os Estados Unidos. A China é hoje responsável por 11% do total dos gastos militares do mundo; a Rússia por 5%.

Estes dados foram publicados nesta semana pelo Stockholm Internacional Peace Research Institute. Junte-se-lhes o que está programado nos Orçamentos deste ano: a China gastará mais 12% do que no ano anterior; a Rússia mais 18%.

Agora, olhe para a Ucrânia; pense nos Bálticos onde vivem amplas minorias russas; lembre-se de Kaliningrado, enclave russo no coração da nova União Europeia; e tenha em mente que, por razões várias, os Estados Unidos não querem - talvez não possam - continuar a ser o polícia do mundo. Sobretudo da Europa.

"A nova geração que está no Congresso não viveu a guerra fria. Acha que os europeus têm de fazer mais pela sua segurança e que os Estados Unidos não podem continuar a subsidiar o crescimento e o Estado social europeu como fazem há três décadas", alertou recentemente João Mira Gomes, o embaixador de Portugal na NATO.

Recorde-se agora da triste certeza de Kennedy: "Não é lamentável que só possamos obter a paz preparando-nos para a guerra?".

E agora pergunte a Governos e candidatos ao Parlamento Europeu: como tencionam explicar aos eleitores que, nos próximos cinco anos, muito provavelmente a Europa terá de gastar mais em defesa enquanto corta em prestações sociais?

A não-resposta é sempre uma alternativa. E esta não seria a primeira eleição em que os candidatos se envolvem em inflamadas disputas sobre não-assuntos para se livrarem dos inevitavelmente incómodos e incontornavelmente centrais.

* Redactora Principal 

IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
17/04/14


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