Guerra escondida
nas europeias
Pelo segundo ano consecutivo, os Governos de todo o
mundo gastaram em 2013 menos em defesa (-1,9%), consagrando-lhe, ainda
assim, o equivalente a 2,4% do que se produz no planeta. Continuando a
ser quem mais gasta – 37% do total mundial – os Estados Unidos foi quem
voltou a cortar mais (-7,8%) e a intenção do secretário de Estado da
Defesa, Chuck Hagel, é reduzir progressivamente os gastos militares
norte-americanos à dimensão anterior à II Guerra Mundial.
Na Europa, a tendência de
contenção prossegue. No Reino Unido, mas sobretudo em França, o país da
União Europeia que investe mais neste domínio, sendo responsável por
3,3% dos gastos mundiais. Já a Alemanha tem subido ligeiramente o seu
orçamento de defesa, não impedindo que, hoje, os três "grandes" da
Europa representem menos de 10% do orçamento do mundo em homens e
máquinas de fazer guerra que, em muito lugar, têm servido para manter ou
repor a paz.
Visto o planeta por estas lentes
saltam à vista duas tremendas excepções: China e Rússia. Na última
década, os gastos militares de Pequim cresceram 170%, acima do
crescimento acumulado da economia, de 140%. Os de Moscovo escalaram
108%, mais do que duplicando os 40% que a economia cresceu entre 2004 e
2013. Pela primeira vez, a Rússia consagrou no ano passado uma maior
fatia do seu PIB à defesa do que os Estados Unidos. A China é hoje
responsável por 11% do total dos gastos militares do mundo; a Rússia por
5%.
Estes dados foram publicados nesta semana pelo
Stockholm Internacional Peace Research Institute. Junte-se-lhes o que
está programado nos Orçamentos deste ano: a China gastará mais 12% do
que no ano anterior; a Rússia mais 18%.
Agora, olhe
para a Ucrânia; pense nos Bálticos onde vivem amplas minorias russas;
lembre-se de Kaliningrado, enclave russo no coração da nova União
Europeia; e tenha em mente que, por razões várias, os Estados Unidos não
querem - talvez não possam - continuar a ser o polícia do mundo.
Sobretudo da Europa.
"A nova geração que está no Congresso não viveu a guerra fria.
Acha que os europeus têm de fazer mais pela sua segurança e que os
Estados Unidos não podem continuar a subsidiar o crescimento e o Estado
social europeu como fazem há três décadas", alertou recentemente João
Mira Gomes, o embaixador de Portugal na NATO.
Recorde-se agora da triste certeza de Kennedy: "Não é lamentável que só possamos obter a paz preparando-nos para a guerra?".
E agora pergunte a Governos e candidatos ao Parlamento Europeu:
como tencionam explicar aos eleitores que, nos próximos cinco anos,
muito provavelmente a Europa terá de gastar mais em defesa enquanto
corta em prestações sociais?
A não-resposta é sempre uma alternativa. E esta não seria a
primeira eleição em que os candidatos se envolvem em inflamadas disputas
sobre não-assuntos para se livrarem dos inevitavelmente incómodos e
incontornavelmente centrais.
* Redactora Principal
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
17/04/14
.
Sem comentários:
Enviar um comentário