05/02/2014

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BPP. 
Rendeiro diz que clientes foram 
lesados por serem gananciosos

Fundador do BPP que responde por burla qualificada diz que nenhum burlão "se transforma na coisa burlada"

O despacho do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa que acusa João Rendeiro e dois outros ex-administradores do Banco Privado Português (BPP) de burla qualificada é um mero "exercício de hindsight", isto é, de retrospectiva. Na contestação entregue na 2ª Vara Criminal de Lisboa, onde na próxima quarta-feira começará a ser julgado, o fundador do BPP concentra-se neste argumento: o Ministério Público só terá chegado a determinadas conclusões porque avaliou "comportamentos ocorridos em 2007 e 2008 à luz da informação, conhecimento e experiência que se tem em 2013". 


Os procuradores da 9ª secção do DIAP de Lisboa que conduziram a investigação concluíram, em Fevereiro de 2013, que os ex-administradores do banco terão feito uma gestão imprudente do veículo de investimento Privado Financeiras, gestão essa que terá causado prejuízos a uma centena de clientes e investidores na ordem dos 41 milhões de euros. 

Para reforçar o capital da sociedade, o banco decidiu angariar investidores junto dos clientes com mais potencial: aqueles com capacidade para investir quantias mais avultadas, como Francisco Pinto Balsemão, terão mesmo sido contactados directamente por João Rendeiro. Acontece que os investidores não saberiam que as acções compradas seriam exclusivamente do BCP nem que a sociedade seria "alavancada": ou seja, além dos capitais próprios, a empresa recorreria a financiamento externo. 

Mas João Rendeiro contesta o argumento de que os accionistas terão sido enganados: tinham experiência suficiente, diz, para saberem estar perante um investimento de risco e se acabaram lesados foi porque foram vítimas das suas ambições. "Os presentes autos são o exemplo acabado da cupidez de muitos dos aqui assistentes, que, ao longo de vários anos, muito ganharam em estratégias de investimento em tudo semelhantes à presente, e que agora, confrontados com a perda do investimento cujo risco aceitaram, dizem-se enganados, porque sabem que só pela via da responsabilização civil conexa à imputação de um crime conseguem (tentar) recuperar o investimento realizado", afirma a defesa de João Rendeiro, na contestação a que o i teve acesso. 

O fundador do BPP vai ainda mais longe e diz que accionistas não só eram experientes como não terão legitimidade para reclamar que a Privado Financeiras tivesse apenas investido em acções do BCP quando, a título pessoal, também o fizeram. "Sofisticados especuladores bolsistas vestem a pele de ingénuos e impreparados consumidores, quando muitos deles investiram neste como antes em outros veículos, e, pasme-se, investiram também a título particular precisamente no mesmo título em que a Privado Financeiras investiu, o BCP", acusa. 

João Rendeiro diz-se disposto a provar que aquele tipo de investimento é de "alto risco" e os investidores em causa, pela experiência que tinham na matéria, teriam de estar conscientes disso. Que no passado, antes do fracasso em torno do investimento em acções do BCP, a estratégia tinha tido sempre lucros "impressionantes" e "muito acima dos indicadores dos mercados". Que não podia prever "os problemas do sub prime" e ainda menos "a crise financeira de 2008 e seguintes", nem podia adivinhar "que o BCP estivesse tão fraco" e que a proposta de fusão do BPI falhasse. 

Se, no fim de tudo, os clientes foram vítimas de uma burla, diz Rendeiro, também ele terá sido "vítima de si próprio" porque ali terá investido também o seu dinheiro. "Nenhum burlão em parte alguma do mundo - sem que exista um caso gravíssimo de desdobramento de personalidade esquizofrénica (que se não presume) - actua para ser a principal vítima de si próprio, e parafraseando o poeta "transformando-se o burlão na coisa burlada"", defende. 

A acusação não ignorou que Rendeiro, tal como os ex-administradores Salvador Fezas Vital e António Paulo Guichard, investiu dinheiro num aumento de capital da Privado Financeiras. Acontece, porém, que o dinheiro investido não seria de nenhum dos gestores mas de prémios que os três alegadamente terão recebido indevidamente do banco. 

* Um burlão qualificado que assim fala não é gago!!!


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