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Conheça a teia de relações entre governantes e empresas
Pedro Cruz, designer de 28 anos, foi eleito em 2013 um dos embaixadores do novo mundo da informação no “Corriere della Sera”: os sistemas de visualização de dados. A sua última ideia promete torná-lo conhecido cá dentro: transformou em animação a teia de relações entre governantes e empresas detalhada no livro e documentário “Donos de Portugal”. Numa semana o ecossistema, que mais parece um insectário, teve 25 mil visualizações
A uns parecem formigas, a outros baratas. Mal se começa a explorar a
animação, avançam para círculos e rodeiam-nos velozmente. Cada uma é um
político que integrou o governo entre 1975 e 2013. Cada círculo é uma
empresa e serve esta deambulação para mostrar quem passou por onde e em
que companhia. Quanto mais políticos, maior é o círculo da empresa.
Quanto mais empresas, mais cheio é o bicho. Pedro Cruz o autor da
animação em que é possível interagir com 119 políticos e 350 empresas
portuguesas, que dá um novo formato à investigação publicada em 2010 no
livro "Donos de Portugal" - adaptada a documentário em 2012 -, rejeita
uma classificação taxonómica, mas admite que a "forma abstracta" que
escolheu como anatomia do político se presta a essa análise e a outras:
já lhe falaram de vermes e chatos. "Eu digo que são organismos vivos,
com uma determinada forma abstracta que pode induzir uma série de
interpretações que acho legítimas. A multiplicidade de interpretações é
que é interessante", diz. O ecossistema de políticos com ligações a
empresas é o 12.o trabalho que publica na internet e o que mais depressa
começou a circular nas redes sociais.
Publicado a 23 de Dezembro, numa
semana superou as 25 mil visualizações.
Aos 28 anos, Pedro Cruz já não é um anónimo no meio das artes
visuais: em 2013 foi mesmo eleito no "Corriere della Sera" um dos
embaixadores deste "novo mundo" da informação, como lhe chamou o diário
italiano, por transformar grandes quantidades de dados em sistemas
visuais apelativos. Por cá, explica, a arte das "visualizações" - nome
que prefere a infografia pois são mais dinâmicas e não tencionam
comunicar um resultado, mas deixar margem para interpretações e
"subnarrativas" - ainda tem pouca saída e poucos representantes.
Até aqui, o seu trabalho com mais sucesso - mais de 100 mil
visualizações desde que foi publicado em 2009, fasquia que o novo
ecossistema facilmente baterá - versava o declínio dos impérios
marítimos no século xix e xx
e valeu-lhe a primeira distinção da carreira, com a selecção para o
festival de animação computacional SIGGRAPH, em Los Angeles, onde obteve
o primeiro lugar numa competição para estudantes. Nos últimos anos já
tinha feito alguns trabalhos mais abstractos sobre Portugal, como
visualizações sobre tráfego em Lisboa, mas admite que interessou mais a
pessoas com gosto pela área do que a lisboetas.
Pelo caminho passou pelo Instituto de Tecnologia do Massachusetts
(MIT), onde foi ganhando gosto pelo título de designer e "explorador de
visualização" em vez de engenheiro informático - esteve no laboratório
de Carlo Ratti, referência na área, a par de Jer Thorp (ambos jurados na
votação do jornal italiano ).
Depois de um mestrado em Visualização da Informação, está a fazer o
doutoramento na Universidade de Coimbra e foi a braços com esse novo
projecto que quis experimentar outros temas, que encontraram uma
incubadora no projecto "Donos de Portugal". "Queria fazer visualização
em assuntos que importem às pessoas, explorando tecnologias que cheguem a
mais gente e apresentando a informação de forma lúdica, interactiva e
que usando metáforas visuais adequadas possa envolver o interessado na
exploração dessa visualização", explica.
O interesse público no tema do documentário "Donos de Portugal" foi
evidente - em ano e meio de divulgação, superou meio milhão de
visualizações. Como a recolha em que participaram Jorge Costa, Luís
Fazenda, Francisco Louçã ou Fernando Rosas terminava em 2010, completou
os percursos dos governantes até 2013 e incluiu informação de um estudo
sobre as ligações políticas das empresas cotadas em bolsa, de Maria
Teresa Bianchi.
O objectivo para o futuro é ir actualizando o ecossistema político-empresarial com outros nomes e ligações.
Ângelo Correia, ex-dirigente do PSD, é por agora o nome do
ecossistema com mais ligações a empresas, num total de 51 - onde ocupou
55 cargos. Ex aequo em segundo lugar surgem o ex-dirigente do
PSD Luís Todo Bom e o advogado Daniel Proença de Carvalho, ambos com 20
empresas. Pedro Passos Coelho passou por 11. Do actual executivo,
aparecem no ecossistema Rui Machete (12 empresas) e José Pedro
Aguiar-Branco (seis). Já entre as empresas retratadas, as que têm mais
ligações são CGD, PT, Banco de Portugal, BCP, grupo Mello ou
Champalimaud. O sistema de visualização de Pedro Cruz é interactivo, por
isso quando se clica numa destas empresas os organismos com alguma
ligação à instituição dirigem-se prontamente para a empresa em causa, o
que permite ver como se cruzam percursos, mas também cores: os insectos
social-democratas são laranja, os socialistas rosa, os centristas azuis e
os independentes (poucos) cinzentos.
Nos comentários nas redes sociais não faltam elogios ao "serviço
público" e também tiradas com humor. "O diagnóstico está feito.
Tratamento: desinfestação", lê--se no Facebook. No doutoramento, Pedro
Cruz quer explorar o potencial de retrato e caricatura nestes sistemas,
mas por agora garante que a imparcialidade foi palavra de ordem, até
porque deve ser essa a natureza das visualizações, a menos que se assuma
o contrário. Mesmo a escolha de insectos foi neutra: bichos pelos quais
não se nutre muita simpatia? "São organismos vivos", insiste Pedro
Cruz, enviando um link para um vídeo no YouTube sobre cozinha gourmet
com esta proteína. "Sobre insectos, há quem goste", contrapõe. Até à
data, conta que as reacções foram todas boas. "Ainda estou à espera das
más, Nunca mais vêm. Se calhar pode ajudar-me nisso, não?" Olhar muito
para o ecossistema (em http://pmcruz.com/eco) comichão pelo menos dá.
Entrevista a Jorge Costa, autor do documentário "Donos de Portugal"
Este trabalho acrescenta alguma coisa ao vosso projecto?
Vem divulgar a recolha que já tinha sido feita no “Donos de Portugal”, e
que explorámos no documentário, de uma maneira mais viva e interactiva.
Torna a chamar a atenção para a promiscuidade entre políticos e o
poder económico e isso é positivo.
Como se explica o interesse tão expressivo neste tema?
É
um sinal de que as pessoas querem saber mais sobre relações que podem
influenciar as suas escolhas democráticas e as políticas. A experiência
de crise propicia esse interesse, até por poderem estar na sua origem. O
documentário já teve mais de meio milhão de visualizações, é mais o
visto de sempre no país.
Existe um défice na divulgação deste tipo de informação?
A divulgação da informação e monitorização das empresas e responsáveis
políticos tem de resultar de uma mobilização colectiva, numa atitude de
vigilância e responsabilização. Claro que a imprensa e entidades
fiscalizadoras têm um papel claro, mas, se os cidadãos estão
adormecidos, estas teias de poder desenvolvem-se mais sub-repticiamente.
Tem outro projectos?
Estou a trabalhar num novo
projecto editorial com Francisco Louçã, que será publicado em breve. O
tema é o mesmo, a forma como se organiza o poder da classe política.
* Muito esclarecedor...
.
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