Exigências materiais dos filhos:
“Não, não compro!... Está bem, leva...”
É sexta-feira, Tânia vai buscar Mafalda (5 anos e 6 meses) à
escola e vão as duas ao supermercado fazer as compras do mês lá para
casa, como já vem sendo habitual.
Tânia: Então, querida correu bem o dia?
Mafalda: Sim! Vamos ao supermercado? Vais comprar aquelas gambas para comermos com a massa preta?
Tânia: Meu Deus, Mafalda! Tens tudo programado! Sim, querida. É o que fazemos sempre, não é?
Mafalda: Mãe, podemos ir ver se já chegaram mais bonecos da nova colecção dos Little Pet Shop?
Tânia: Podemos, mas sabes que mesmo que já tenham chegado…
Mafalda: O quê?
Tânia: Hoje não vamos trazer nenhum. É só de 15 em 15 dias, como combinámos.
Mafalda: Oh, mãe vá lá… Só hoje! Prometo!
Tânia: Querida, então? O combinado não era que a mãe te comprava um de 15 em 15 dias? E se pudesse? A semana passada comprámos um agora é só na próxima semana. Ok?
Mafalda: Sim…
Já no supermercado:
Tânia: Vá querida, vai pondo as cenouras aqui para o saco enquanto a mãe escolhe os tomates.
Mafalda: São quantas?
Tânia: Dez.
Mafalda: Já está! Podemos ir agora ver se há?
Tânia: Vamos! Mas já sabes não é?
Mafalda: Já chegaram! Não é tão querida a joaninha, mãe?
Tânia: É, querida. É um amor! É esse que queres levar para a semana?
Mafalda: Por favor, mãe. Só hoje!
Tânia: Mafalda, já falámos sobre isto.
Mafalda: Oh mãe, mas a mãe da Constança compra-lhe sempre um todas as semanas! Porque é que eu não posso?
Tânia: Porque a mãe e o pai não têm dinheiro para te dar um boneco todas as semanas e porque eu não acho que seja um bom hábito, e porque tenho a certeza que não é por isso que a Constança é mais feliz!
Mafalda: Mas pelo menos tem uma colecção maior que a minha! E vai acabar mais rápido!
Tânia: Tu também vais fazer a colecção toda. Só que mais devagarinho. Até acho que assim brincas mais com cada boneco.
Mesmo ao lado Tânia e Mafalda assistem a uma discussão entre uma mãe e um filho, de aproximadamente três anos de idade:
Mãe: António, já te disse que não vale apena pedires mais carros! Ainda ontem te comprei um!
António: Então quero um lego!
Mãe: Já te disse que não te compro mais nada!
António atira-se para o chão a chorar e a espernear enquanto grita:
António: Tu não gostas de mim! Eu quero! Ninguém gosta de mim!
Mãe: Pára com isso António! Está toda a gente a olhar para ti! Estou tão cansada!
A partir daqui, António ainda chorava e gritava mais alto captando todas as atenções. A mãe permanecia imóvel ao comportamento do filho e com um ar esgotado.
Mãe: … Está bem, leva…
António, levanta-se rapidamente e vai buscar o lego que queria. Com um leve sorriso na cara.
António: Obrigada, mãe! És a melhor mãe do mundo!
Tânia e Mafalda ficaram paradas, caladas e também imóveis enquanto António e a mãe se afastavam.
Tânia sentiu pena daquela mãe, que parecia muito cansada e sem capacidade para conseguir dizer que não ao filho que reagiu com descontrolo e chantagem emocional face à “ameaça” da mãe perante a sua ausência de tolerância à frustração.
Mafalda: Sim! Vamos ao supermercado? Vais comprar aquelas gambas para comermos com a massa preta?
Tânia: Meu Deus, Mafalda! Tens tudo programado! Sim, querida. É o que fazemos sempre, não é?
Mafalda: Mãe, podemos ir ver se já chegaram mais bonecos da nova colecção dos Little Pet Shop?
Tânia: Podemos, mas sabes que mesmo que já tenham chegado…
Mafalda: O quê?
Tânia: Hoje não vamos trazer nenhum. É só de 15 em 15 dias, como combinámos.
Mafalda: Oh, mãe vá lá… Só hoje! Prometo!
Tânia: Querida, então? O combinado não era que a mãe te comprava um de 15 em 15 dias? E se pudesse? A semana passada comprámos um agora é só na próxima semana. Ok?
Mafalda: Sim…
Já no supermercado:
Tânia: Vá querida, vai pondo as cenouras aqui para o saco enquanto a mãe escolhe os tomates.
Mafalda: São quantas?
Tânia: Dez.
Mafalda: Já está! Podemos ir agora ver se há?
Tânia: Vamos! Mas já sabes não é?
Mafalda: Já chegaram! Não é tão querida a joaninha, mãe?
Tânia: É, querida. É um amor! É esse que queres levar para a semana?
Mafalda: Por favor, mãe. Só hoje!
Tânia: Mafalda, já falámos sobre isto.
Mafalda: Oh mãe, mas a mãe da Constança compra-lhe sempre um todas as semanas! Porque é que eu não posso?
Tânia: Porque a mãe e o pai não têm dinheiro para te dar um boneco todas as semanas e porque eu não acho que seja um bom hábito, e porque tenho a certeza que não é por isso que a Constança é mais feliz!
Mafalda: Mas pelo menos tem uma colecção maior que a minha! E vai acabar mais rápido!
Tânia: Tu também vais fazer a colecção toda. Só que mais devagarinho. Até acho que assim brincas mais com cada boneco.
Mesmo ao lado Tânia e Mafalda assistem a uma discussão entre uma mãe e um filho, de aproximadamente três anos de idade:
Mãe: António, já te disse que não vale apena pedires mais carros! Ainda ontem te comprei um!
António: Então quero um lego!
Mãe: Já te disse que não te compro mais nada!
António atira-se para o chão a chorar e a espernear enquanto grita:
António: Tu não gostas de mim! Eu quero! Ninguém gosta de mim!
Mãe: Pára com isso António! Está toda a gente a olhar para ti! Estou tão cansada!
A partir daqui, António ainda chorava e gritava mais alto captando todas as atenções. A mãe permanecia imóvel ao comportamento do filho e com um ar esgotado.
Mãe: … Está bem, leva…
António, levanta-se rapidamente e vai buscar o lego que queria. Com um leve sorriso na cara.
António: Obrigada, mãe! És a melhor mãe do mundo!
Tânia e Mafalda ficaram paradas, caladas e também imóveis enquanto António e a mãe se afastavam.
Tânia sentiu pena daquela mãe, que parecia muito cansada e sem capacidade para conseguir dizer que não ao filho que reagiu com descontrolo e chantagem emocional face à “ameaça” da mãe perante a sua ausência de tolerância à frustração.
Para os pais a questão da gestão dos pedidos dos filhos é um
constante desafio! Sobretudo, nas últimas décadas em que a nossa
sociedade passou a assumir o lema do consumo criando necessidades reais
ou não para pais e filhos. A facilidade de acesso ao crédito fácil
mergulha muitas famílias numa ilusão de que se pode ter tudo, levando-as
a adoptarem estilos de vida e de consumo muito superiores às suas reais
capacidades e necessidades.
Os pais devem gerir os pedidos dos
filhos com muita contenção. Actualmente, vivem-se tempos de crise onde
temos visto famílias que de um momento para o outro perdem os seus
empregos. Outras, veem os seus rendimentos diminuídos ou sentem uma
clara quebra no seu poder de compra. Este é um tempo difícil para todos.
Por isso, é errado transmitir às crianças que é possível comprar tudo.
Porque isso é uma ilusão.
É uma ilusão que depois elas transpõem
para os outros planos da vida, além do consumismo. Como nas próprias
relações com os outros, onde o "ter" passa a ter uma importância
superior ao "ser". Que sentido tem para os nossos filhos crescerem
habituados a utilizar bens materiais como intermediários ou como forma
de afirmação na relação com os outros? Esta é uma questão fundamental
que nos devemos colocar. Pelo menos temos a garantia que não terão
tantas oportunidades de desenvolver as suas próprias capacidades de
empatia e de afirmação social perante o grupo, e que mais tarde ou mais
cedo sofrerão estas consequências.
É importante que as crianças
cresçam com a noção da realidade e das dificuldades. Uma criança que
acha que pode ter sempre tudo o que quer cresce sem limites e com um
sentido de omnipotência. E quando não tem limites também desenvolve
sentimentos de insegurança noutras situações, como aquelas que o
dinheiro não compra. Cresce sem resistência à frustração.
A
negação de alguns pedidos por parte dos pais além de permitir à criança
confrontar-se com a realidade pode constituir boas oportunidades para
aprender a lidar com a sua frustração. Como já dissemos anteriormente
esta é uma importante função parental. Dar oportunidades para
experimentar e vivenciar sentimentos de frustração vai ajudá-la a
sentir-se mais segura e confiante para lidar com outros momentos de
frustração que a vida inevitavelmente proporciona.
Há muitas
famílias que sentem que quanto maior número de presentes ou pedidos
satisfizerem às crianças melhor e mais forte se tornam as suas relações.
Isto está longe de ser verdade, além de que constitui um enorme perigo
no desenvolvimento das relações familiares.
Quando as crianças passam a olhar com expectativa para a visita dos
avós, por exemplo, porque sabem que daí irá resultar o ganho de um
presente ou algo material está a perder-se a essência do que deveria
representar essa alegria ou expectativa. As próprias relações perdem
parte da sua essência pois passam a depender de factores externos para
lhe atribuírem significado.
É fundamental entendermos que mais do
que termos a garantia de que os nossos filhos podem ter tudo importa que
os ajudemos a crescer com um sentido da realidade, da partilha, da
solidariedade nas relações o que passa essencialmente pela construção do
ser, onde o ter não deverá assumir qualquer primazia. Este é mais um
dos grandes desafios da parentalidade!
Mas como as crianças fazem
essencialmente aquilo que vêem fazer mais do que o que ouvem dizer, os
pais devem eles próprios reflectir sobre a forma como gerem os seus
desejos e vontade de consumo.
As crianças têm que aprender a dar
valor às coisas que têm e recebem. Não ceder no imediato aos pedidos
permite-lhes desenvolver a capacidade para aguardar receber determinado
presente, esforçarem-se para ter determinada coisa, que o seu bom
comportamento pode representar maior valorização por parte dos pais sem
que tenha que implicar receber algo.
Os pais podem sentir que já
dedicam pouco tempo aos filhos no dia-a-dia e que todo o tempo que lhes
resta é para passarem em ambiente de calma e tranquilidade cedendo aos
muitos pedidos que lhes fazem e evitarem assim momentos que possam
ameaçar todo este clima que desejam manter. No entanto, como já dissemos
saber dizer não faz parte de uma educação que se quer equilibrada e
responsável. Além de ser um grande acto de amor por todas as boas
consequências que se reflectirão ao longo do crescimento dos filhos!
Psicóloga clínica e terapeuta familiar.
IN "PÚBLICO"
26/09/13
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