27/09/2013

JORGE FIEL

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Tens aí um carregador Nokia?

O meu primeiro telemóvel, comprado em 98, foi um magnífico Nokia 6210. Rendido a um soft-ware amigável e intuitivo, fui fiel durante dez anos à marca finlandesa, até que lhe pus os cornos com um Huawei Android, da TMN, estreando-me no mundo das aplicações e ecrãs táteis, que haveria de me atirar para os braços do inevitável iPhone. 

"Tens aí um carregador Nokia?" foi a frase mais repetida na viragem do milénio, quando o fabricante finlandês era incensado "urbi et orbi", em particular em Lisboa, onde o Governo resumia a estratégia ao choque tecnológico e suspirava, ansioso como uma adolescente, por uma Nokia portuguesa.

Para espanto dos que que ficaram presos na narrativa de que o mundo está a mudar - e por isso não deram conta de que ele já mudou -, a Nokia desceu aos Infernos, despenhando-se de uma confortável liderança com 40% do mercado (2007), para uns irrelevantes 3% no segmento que interessa: o dos smart-phones.

Entalada entre o galope do Android e o sedutor iPhone, a Nokia optou por uma terceira via aliando-se à Microsoft para equipar os seus telemóveis com o Windows.

Render-se ao sistema operativo da Google, como a Samsung, HTC, Motorola, seria, nas palavras de um ex-CEO da Nokia, imitar os garotos finlandeses que fazem xixi nas calças para se aquecerem. Aliviam-se no momento, mas não tarda a ficarem mais enregelados do que estavam antes de esvaziarem a bexiga. A Nokia não fez xixi nas calças, mas também não evitou perder a independência, ao ser comprada, a preço de saldo, pela Microsoft.

Veterano da geração Nokia, acho justo, oportuno, correto e mobilizador extrair três lições fundamentais do desmoronar do sonho finlandês.

1.ª - O maior erro que se pode cometer na vida é deixar-se tolher pelo medo de errar. Três anos antes de a Apple lançar o iPhone, a Nokia já tinha desenvolvido ecrãs táteis, mas como se sentia confortável, achou por bem não lançá-los no mercado;

2.ª - É uma rematada idiotice acreditar em receitas milagrosas e que era possível replicar no nosso país o sucesso da Nokia. O que sobrou de positivo da retórica do choque tecnológico não foi a tentativa de importar, chave na mão, modelos estranhos à cultura e competências do nosso tecido industrial, mas sim o upgrade tecnológico de indústrias tradicionais como calçado, têxtil, metalurgia, cerâmica ou cortiça;

3.ª - Não podemos adormecer à sombra da bananeira. A Nokia nasceu como papeleira e foi fabricante de botas de borracha, televisores e telefones para o exército, até que, no início dos anos 90, um CEO visionário apostou nas comunicações móveis. O segredo do sucesso está na capacidade de nos adaptarmos rapidamente a um mercado em perpétua mudança - e no casamento entre adaptação, diferenciação e inovação. Não basta fazer o diagnóstico certo e escolher o alvo. A escolha do caminho é fundamental.

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
23/09/13

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