É pior a emenda
do que o soneto
Cavaco Silva conseguiu fazer o que parecia impossível depois dos últimos dez dias de crise política em que o País está mergulhado, acrescentou mais confusão e incerteza, tão desnecessária e inexplicável como a que foi criada por Paulo Portas e Pedro Passos Coelho.
O Presidente da República passou para o centro
da decisão política em Portugal da pior forma, sem assumir as
responsabilidades que deveriam ser suas, e ‘matou' este Governo. Só
falta saber quando é o enterro e, a partir de agora, quanto mais tarde
for, pior.
Em primeiro lugar, a proposta do Presidente da República é clara, mas
pelas piores razões, e contraditória nos termos. E não agrada a
ninguém. Cavaco Silva tem razão quando diz que o País vive momentos de
excepção e que as eleições antecipadas, agora, teriam consequências
absolutamente nefastas. Aliás, os primeiros 12 minutos de uma
intervenção que durou quase 20 foram suficientemente claros do ponto de
vista das consequências económicas e financeiras para assustar os
portugueses sobre o que está em causa.
Depois da crise da última semana, Portugal ficou mais perto do
segundo resgate, por responsabilidade exclusiva do próprio Governo, os
mercados, e os credores, deixaram saber que não estavam dispostos a
acreditar na capacidade do Estado português de cumprir os compromissos
que assumiu com a ‘troika'. Os juros implícitos na dívida pública
dispararam e a PSI20 deu um trambolhão. Felizmente, como Portugal tem o
seu financiamento assegurado em 2013, o segundo resgate só se colocaria
em 2014. Mas ficaram os avisos. A crise aproximou-nos desta novo resgate
e de mais austeridade.
Ora, a solução política apresentada por Passos Coelho e Paulo Portas,
necessariamente forçada e que suscita legítimas, para dizer o mínimo,
dúvidas de credibilidade, era um mal-menor, precisamente para evitar o
desastre que Cavaco Silva identifica. E para levar o País até Julho de
2014, quando termina o acordo com a ‘troika' que está agora em vigor.
Mereceu, por isso, até o apoio explícito dos líderes europeus nos
últimos dias.
Cavaco Silva disse que o Governo está em funções, mas deixou saber
que não o quer, pelo menos não quer os seus líderes. E quer o PS e
António José Seguro, que, sabe Cavaco, não quer apoiar ou integrar
nenhuma solução sem eleições imediatas. Justiça seja feita, foi o PS o
único dos partidos do arco de Governo a fazer uma declaração clara sobre
a intervenção do Presidente. Sem a retórica vazia do PSD e do CDS. Mas
Cavaco desresponsabiliza-se de assumir uma opção, não assume uma
decisão e espera que outros o façam, por si, ou não o façam, e sejam
responsabilizados por isso.
Perante a análise política do Presidente da República, só poderia
haver uma de duas soluções: eleições antecipadas em Setembro, com os
riscos que o próprio identificou, ou a manutenção deste Governo em
verdadeira plenitude de funções, para cumprir o memorando da ‘troika'.
A terceira saída para esta crise - que vai ter seguramente
consequências já a partir de hoje nos mercados - é a escolhida por
Cavaco, a que se depreende da proposta de Cavaco, ou seja, um Governo de
iniciativa presidencial. Mas, mesmo que os partidos do governo aceitem
‘correr' com Passos e Portas, o que está longe de ser certo, como é que é
possível admitir que um Governo sem legitimidade política pode cumprir
um memorando tão exigente e aguentar em funções até Junho de 2014?
Cavaco Silva não gosta destes líderes do PSD e do CDS, estará, até,
legitimamente, zangando com a forma como foi destratado em todo este
processo. Mas a sua resposta é a pior solução para o País e tenta ser a
melhor solução para si, para salvar a sua posição. Mas engana-se,
porque, a partir de agora, deixará também de ter o apoio do PSD e do
CDS. De uma assentada, Cavaco acabou com este Governo, que deixou de ter
condições para exercer as suas funções, acabou com a réstia de apoio
que tinha e fragilizou o País e o regresso aos mercados.
DIRECTOR
IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
11/07/13
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