As comadres da ‘troika’
O estado de espírito da ‘troika' começa
perigosamente a ficar parecido com o da coligação do Governo: seguem
todos no mesmo barco mas, volta e meia, há um que decide remar num
sentido contrário e desorientar o rumo. É mais ou menos isso que parece
estar a acontecer com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Comissão
Europeia. Primeiro, foi o FMI que, esta semana, assumiu ter avaliado
mal a situação da Grécia e que, à conta desses lapsos, acabou por
subestimar os danos que as suas exigências causariam à economia
helénica. Um ‘mea culpa' reforçado com acusações a Bruxelas, que acusa
de ferir o crescimento económico europeu com a sua preocupação cega em
cumprir programas de ajustamento, mais do que em avaliar e ajustar o
impacto dessas políticas severas. Aborrecida com os ataques do seu
parceiro de ‘troika', a Comissão Europeia respondeu com um "nem pensar",
tudo se fez a bem do crescimento económico e criação de emprego nos
países a quem deram a mão - e emprestaram o dinheiro a troco da sua
autonomia: Grécia, Portugal, Irlanda e Chipre.
É provável que os dois tenham razão. Enquanto o FMI acredita que, ao avaliar mal o problema, ajudou a destruir a economia grega, Bruxelas defende que todas as medidas e punições aplicadas tinham como objectivo salvar a zona euro, impedindo que a saída da Grécia resultasse num contágio fatal para toda a região. Só que, na verdade, se o FMI tivesse seguido os seus critérios e padrões habituais, é possível que a Grécia nunca tivesse recebido todo o dinheiro do resgate. E, se Bruxelas não tivesse imposto metas assim que passou o dinheiro para as mãos dos gregos, provavelmente eles continuaram a boicotar as reformas estruturais no país, a gastar acima do suportável, a maquilhar as contas públicas, a fazer de conta que bastaria um ou outro empréstimo dos amigos europeus para voltar ao sítio.
Por tudo isto, é provável que os dois tenham razão. Mas também parece certo que todos cometeram erros pelo caminho. O FMI já admitiu há uns meses que, ao fazer as contas ao impacto da austeridade em países intervencionados, descobriu que os danos no crescimento económico são bem maiores do que o inicialmente previsto. Agora reconhece um novo ‘mea culpa'. E a Bruxelas também não ficaria mal admitir que a cegueira burocrática no cumprimento das regras leva a asfixias e atropelos dos quais um país pode nunca mais recuperar.
Mais do que uma zanga de comadres, esta aparente contradição entre as instituições lideradas por Christine Lagarde e Durão Barroso revela o que a Europa se tornou: uma casa onde manda quem tem dinheiro, mas onde nem sempre se tomam as decisões certas. O preocupante - e grave - é que a história dos países se constrói a partir destas casas, a partir das benesses e das exigências que lhes apresentam. As grandes decisões políticas, como as que foram tomadas nos últimos dois ou três anos, foram motivadas e empurradas pelas orientações de FMI, Comissão Europeia, Banco Central Europeu. Basta uma estar errada e não ser corrigida a tempo, e é toda uma história, um futuro, uma série de gerações que ficam hipotecadas.
Claro que, depois do engano feito, é fácil chegar de dedo em riste e lançar um "eu bem avisei". Mas assumir os erros é uma atitude nobre e, se abrir as portas a uma revisão sensata e partilhada de políticas, deve ser encorajada. É a essa porta que o Governo português deve bater agora e batalhar por uma flexibilização das metas. E não aceitar que a ‘troika' continue a impor uma fórmula que se resume a um ‘fizemos asneira, pedimos desculpa pelo incómodo, a austeridade segue dentro de momentos'. Isso não pode continuar a ser opção.
É provável que os dois tenham razão. Enquanto o FMI acredita que, ao avaliar mal o problema, ajudou a destruir a economia grega, Bruxelas defende que todas as medidas e punições aplicadas tinham como objectivo salvar a zona euro, impedindo que a saída da Grécia resultasse num contágio fatal para toda a região. Só que, na verdade, se o FMI tivesse seguido os seus critérios e padrões habituais, é possível que a Grécia nunca tivesse recebido todo o dinheiro do resgate. E, se Bruxelas não tivesse imposto metas assim que passou o dinheiro para as mãos dos gregos, provavelmente eles continuaram a boicotar as reformas estruturais no país, a gastar acima do suportável, a maquilhar as contas públicas, a fazer de conta que bastaria um ou outro empréstimo dos amigos europeus para voltar ao sítio.
Por tudo isto, é provável que os dois tenham razão. Mas também parece certo que todos cometeram erros pelo caminho. O FMI já admitiu há uns meses que, ao fazer as contas ao impacto da austeridade em países intervencionados, descobriu que os danos no crescimento económico são bem maiores do que o inicialmente previsto. Agora reconhece um novo ‘mea culpa'. E a Bruxelas também não ficaria mal admitir que a cegueira burocrática no cumprimento das regras leva a asfixias e atropelos dos quais um país pode nunca mais recuperar.
Mais do que uma zanga de comadres, esta aparente contradição entre as instituições lideradas por Christine Lagarde e Durão Barroso revela o que a Europa se tornou: uma casa onde manda quem tem dinheiro, mas onde nem sempre se tomam as decisões certas. O preocupante - e grave - é que a história dos países se constrói a partir destas casas, a partir das benesses e das exigências que lhes apresentam. As grandes decisões políticas, como as que foram tomadas nos últimos dois ou três anos, foram motivadas e empurradas pelas orientações de FMI, Comissão Europeia, Banco Central Europeu. Basta uma estar errada e não ser corrigida a tempo, e é toda uma história, um futuro, uma série de gerações que ficam hipotecadas.
Claro que, depois do engano feito, é fácil chegar de dedo em riste e lançar um "eu bem avisei". Mas assumir os erros é uma atitude nobre e, se abrir as portas a uma revisão sensata e partilhada de políticas, deve ser encorajada. É a essa porta que o Governo português deve bater agora e batalhar por uma flexibilização das metas. E não aceitar que a ‘troika' continue a impor uma fórmula que se resume a um ‘fizemos asneira, pedimos desculpa pelo incómodo, a austeridade segue dentro de momentos'. Isso não pode continuar a ser opção.
IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
07/06/13
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