Como Cavaco acelerou a Justiça
A liberdade de
expressão é uma conquista tremenda. É por isso que encerra uma não menor
tremenda responsabilidade. Pode não gostar-se de Cavaco Silva, política
e pessoalmente, e poucos já gostarão, tendo em conta os resultados
negativos, inéditos, das últimas sondagens. E pode-se, até ao limite
máximo do uso dessa liberdade expressiva conquistada, criticá-lo. Mas o
recurso ao insulto é ir longe demais, é uma falta de respeito para com a
instituição Presidência da República, como já reconheceu Miguel Sousa
Tavares. Posto isto, é preciso dizer que se o mediático escritor
comentador, que está em promoção do seu novo livro, deveria saber qual o
impacte das suas palavras e também deveria ter previsto, enquanto
jurista, que viria aí processo certo, a forma como Cavaco se mexeu está
longe de ser impoluta. Um processo por difamação é híper comum em
Portugal, não deve haver jornalistas e políticos que não o conheça. Mas
Cavaco não seguiu a via óbvia de entregar o caso aos seus assessores
jurídicos. Fez questão de perguntar ao Ministério Público, como número
um da Nação, se via na qualificação profissional que Sousa Tavares lhe
atribuiu um crime de ofensa à honra do alto cargo que desempenha. A
resposta da justiça nunca foi tão rápida: horas depois, talvez nem
tanto, mandou abrir um inquérito. Ficou tudo claro: parece que a
celeridade da justiça depende de quem faz a queixa.
O "show-off" de Belém
O
que aconteceu na segunda-feira não foi um Conselho de Estado, foi um
Big Brother político. De onde saltaram e se traficaram todas as versões
que mais interessavam a uns e a outros, conforme a agenda de cada qual.
Mas, por muito que a situação do País crie expectativas aos cidadãos, o
Conselho de Estado é o que é e vale o que vale. O problema não está no
órgão e no que ele pode trazer sobre decisões para o País, que todos
deviam saber que é pouco ou nada. Está na forma como quem o lidera, o
Presidente, alimenta essas expectativas, usando timings específicos para
o convocar e mantendo pessoas que convidou para o integrar depois do
espetáculo que acabam de nos proporcionar. Mas mais importante nem foi o
que se soube, foi o que se foi percebendo. Veio dos relatos dos
bastidores a única coisa relevante daquela noite longa em Belém: Cavaco
Silva, por mais que insista, nunca conseguirá consensos alargados, durem
estes conselhos as horas que durarem. Até porque o CDS está preparado
para fazer a sua parte: os recados de Bagão Félix ao PS sobre a
disponibilidade dos democratas-cristãos para entrar num novo governo são
claros e tiveram eco nas palavras de Jorge Sampaio, ao afirmar que não
se pode contar com a esquerda para formar governos. O resto é show-off.
As acelerações de Gaspar
Vítor
Gaspar, depois de ter ido à Alemanha receber mais instruções do seu
professor e bom amigo Schäuble, veio anunciar, com pompa, o início de
uma nova era para Portugal: a do investimento e desenvolvimento
económico. Passe o escasso impacte que as novas propostas terão, passe o
atraso da proposta e das ideias e passe até a repetição de muitas
medidas já conhecidas, um plágio aos métodos socráticos, o que mais
ressalta da apresentação deste plano "catalisador e acelerador" é a
forma como Gaspar reduziu a um papel menor Álvaro Santos Pereira. Ao
ministro da Economia, "pai" do pacote de estímulo económico apresentado
há um mês que já continha muito do que Gaspar reanunciou agora
lentamente, coube um protagonismo tão redutor como o reservado aos
quatro restantes secretários de Estado escolhidos para ilustrar este
momento marcante para o País. Se a ideia é catalisar a economia, através
de injeções de estímulos fiscais às empresas, Gaspar, o "senhor
números", deveria ter sabido quantificar a medida. Se era para mostrar
também uma união governamental entre as duas pastas independentes que
nem sempre têm defendido o mesmo caminho, houve logo atropelamentos. O
arranque desta nova era começa, pois, cheio de solavancos e o motor
ameaça mesmo gripar a qualquer momento.
Os exemplos da união sindical
O
movimento sindical vive um momento muito especial em Portugal - porque
as duas centrais sindicais têm novas lideranças, mas, sobretudo, porque
nunca em democracia parece ter havido tantas razões para o protesto. Se
há área em que a palavra "convergência", que agora entrou no léxico
político, mais assusta é aqui, pelo que pode potenciar de uma revolta
social. Carlos Silva e Arménio Carlos perceberam-no. Aproximaram-se.
Decidiram apoiar-se em várias iniciativas já agendadas por UGT e CGTP.
Planeiam algumas em conjunto. É por isso que não se entende a arrogância
demonstrada pela coordenadora da Frente Comum, Ana Avoila, que quase
deitou a perder uma oportunidade rara de união sindical. "Nós decidimos a
nossa greve, nós vamos marcar o nosso calendário. Eu não tenho que
dizer a ninguém, digo se quiser", gritou Avoila após agendar o seu
protestozinho e fazendo questão de desdenhar da proposta de greve
conjunta desejada pela UGT. Dias depois houve acordo. Porque, perante
tanta sede de protagonismo, Carlos Silva revelou um poder de encaixe
estratégico. E fez o Governo guardar a garrafa de champanhe.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
25/05/13
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