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HOJE NO
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Ex-espião há oito meses em casa
a receber ordenado do Estado
João Luís, acusado nas secretas, foi readmitido a 31 de Julho. Recebe salário mas ainda não tem funções. O mais provável é que Silva Carvalho também seja “emprateleirado”
Desde o Verão do ano passado que João Luís, o ex-espião do Departamento
Operacional do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED),
está em casa a receber um salário. Este deverá ser também o destino de
Jorge Silva Carvalho, que foi director do SIED e vai ser agora
reintegrado nos quadros da Presidência do Conselho de Ministros.
João Luís, acusado no processo das secretas de passar informações
reservadas a Silva Carvalho quando este já estava na Ongoing, foi
exonerado pelo director da secreta externa, Casimiro Morgado, em 2011.
Menos de um ano depois, a 31 de Julho, recebeu boas notícias: um
despacho publicado em Diário da República informava-o de que tinha sido
integrado nos quadros da Presidência do Conselho de Ministros (PCM). A
decisão, contudo, não passou do papel. Ao que o i averiguou, o
ex-espião foi chamado e logo de seguida mandado para casa, onde
permanece até hoje, a ganhar um salário equivalente ao que recebia
quando cessou formalmente funções como director do Departamento
Operacional do SIED, em Novembro de 2011.
Segundo fontes próximas do processo consultadas pelo i, o mais
provável é que também Silva Carvalho seja mandado para casa, ficando sem
funções mas com o mesmo salário que recebia na última fase da carreira
nos serviços de informações, como director da secreta externa. Ou seja,
um ordenado que deve rondar os 3500 euros mensais limpos, tendo por base
a informação que Silva Carvalho enviou ao patrão da Ongoing de que
recebia 4 mil euros antes dos cortes salariais na função pública.
Cenários
Na melhor das hipóteses, o ex--director do SIED poderá vir a ocupar um
“lugar neutro”, num cargo com pouca exposição e pouco acesso a
informação sensível, mas onde o seu currículo e os seus conhecimentos de
estratégia, segurança e defesa possam ser úteis, como nalgum instituto.
A possibilidade de ser “repescado” pela Polícia Judiciária, como
aconteceu com os ex-espiões H.S. e C.L.V., “demitidos” das secretas no
final de 2011, por suspeitas de passarem informações sobre os serviços à
imprensa, é que parece estar fora de questão. Segundo as mesmas fontes,
teme-se que a opinião pública questione de imediato a legitimidade
dessa decisão, uma vez que Silva Carvalho voltaria a ter acesso a
informações privilegiadas, antes mesmo do desfecho do processo nos
corredores da justiça.
Fim de carreira
Menos provável que isso só mesmo um regresso às secretas. As fontes ouvidas pelo i
não duvidam que a carreira nos serviços de informações acabou para
Silva Carvalho no mesmo dia em que foi acusado pelo Departamento de
Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa de abuso de poder, acesso
indevido a dados pessoais e violação do segredo de Estado. “A exposição
foi demasiado grande”, justificam. Além disso, mesmo que viesse a ser
absolvido no processo, seria pouco provável recolocá-lo na casa onde
ainda permanecem alguns dos seus “inimigos”.
Silva Carvalho foi o primeiro espião envolvido no caso das secretas a
solicitar a integração na PCM, a 1 de Dezembro de 2010, depois de pedir a
exoneração do SIED e antes de saltar para a Ongoing. Mas só esta semana
o primeiro-ministro, Passos Coelho, e o ministro das Finanças, Vítor
Gaspar, assinaram um despacho que determina a criação de um posto de
trabalho para o ex-espião.
A notícia agitou as águas no parlamento, levando o PCP a pedir a
revogação do despacho. “Quem é que protege Silva Carvalho?”, perguntou o
deputado comunista António Filipe. Neste caso, é a própria lei orgânica
do SIRP, que data de 2007 e é da responsabilidade da Assembleia da
República: a legislação que regula os serviços de informações determina
que, completados “seis anos de serviço ininterruptos”, os agentes dos
serviços de informações adquirem “automaticamente vínculo definitivo ao
Estado”, mesmo que sejam “demitidos” ou peçam a exoneração. Silva
Carvalho só poderá ser afastado se vier a ser condenado no
processo-crime ou se fosse alvo de um processo disciplinar.
Mudar a lei?
O secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Luís
Marques Guedes, explicou isso mesmo no parlamento: se os deputados estão
descontentes com este cenário, têm de pedir para mudar a lei. Ainda não
estão determinadas quais as funções que Silva Carvalho irá exercer.
Decidido está, para já, segundo Marques Guedes, que o governo irá negar
um pedido do ex-espião para que lhe sejam pagos retroactivos desde
Janeiro de 2012.
Acontece que esse pedido também consta da acção especial que o
ex-director do SIED interpôs contra o Estado no Supremo Tribunal
Administrativo e a defesa não tenciona desistir dele. O ex-espião
entende que não deve ser prejudicado pelo tempo que a PCM demorou a
integrá-lo e que tem direito a receber salários desde o momento em que
pediu para desistir da licença sem vencimento (que solicitou para
trabalhar na Ongoing) e se mostrou disponível para trabalhar de novo
para o Estado. Foi em Janeiro de 2012.
Silva Carvalho terá enviado dois requerimentos à PCM a pedir para
desistir da licença sem vencimento, ainda em 2012. Sem resposta, e
depois de ver todos os outros ex-espiões envolvidos no caso das secretas
serem integrados como manda a lei, interpôs em Fevereiro a tal acção
contra o Estado. Também nesse mês apresentou um requerimento ao Conselho
Superior de Magistratura a pedir que acelerasse o processo das
secretas. Só depois disso viu finalmente a fase de instrução ser marcada
para 3 de Abril.
Dificuldades financeiras
No requerimento, o seu advogado, João Medeiros, argumentava que o
ex-superespião tinha uma família para sustentar e precisava de “uma
resposta processual célere” a fim de “prover ao seu sustento e ao
sustento da sua família”. Na exposição ao Conselho Superior da
Magistratura não faltavam dados sobre as alegadas dificuldades
financeiras: Silva Carvalho está sem emprego desde que saiu da Ongoing,
depois de no Verão de 2011 ter rebentado o escândalo das secretas, e à
data “a única fonte regular de subsistência da família é o ordenado da
mulher”, que é médica. Silva Carvalho é “pai de família, tem três filhos
menores”, “sempre viveu do seu trabalho e não tem fortuna pessoal”,
justifica a defesa.
* Um governo sem pudor e acagaçado. No sector privados estes vígaros estavam no ollho da rua. Porque é vigarice traficar dados confidenciais.
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