12/02/2013

VERA GOUVEIA BARROS

.


Tolerância zero?

 Respondendo ao apelo de Vítor Gaspar, PSD, CDS e PS aprovaram a nova lei de enquadramento orçamental, que limita o défice estrutural e a divida pública a, respectivamente, 0,5% e 60% do PIB.

 Para o ministro das Finanças, tratou-se de "uma verdadeira transformação das finanças públicas portuguesas". Eu não vejo grande novidade. Nas aulas de Economia Pública do prof. Pinto Barbosa, aprendi a restrição orçamental de longo prazo do Estado: o rácio dívida/PIB não pode crescer a uma taxa superior à diferença entre as taxas de juro e de crescimento da economia. Controlar a dívida e o défice é, pois, uma questão de solvabilidade. Sucede que as contas dos decisores políticos são, usualmente, de votos e que um défice tem, para os eleitores, benefícios claros e imediatos, mas custos adiados. A questão torna-se, assim, legal. E mais relevante num contexto de moeda única, já que a crise orçamental de um Estado-membro tem consequências sobre toda a UEM.

Por isso, o Tratado de Maastricht impôs tectos ao défice e à dívida pública como condição de adesão ao euro. Limitações que se mantiveram na terceira fase da UEM, com o Pacto de Estabilidade e Crescimento. Sob pena de não adoptar a moeda única e com contabilidade criativa, Portugal cumpriu os critérios da cidade holandesa; mas, uma vez na área monetária, não tardou a ser pioneiro da violação do PEC. Seguiram-se-lhe quase todos os outros.

O mecanismo de "alerta prévio" não funcionou, o procedimento correctivo também não, a reforma de 2005 não produziu resultados e o PEC, de tão violado, morreu. Em sua substituição, assinou-se um Tratado onde constam as duas medidas que agora figuram na nossa lei de enquadramento orçamental. Na minha opinião, a política orçamental deve estar sujeita a regras. E estas devem ser uma norma jurídica. Mas num país em que a lei tem um carácter meramente indicativo (comprovado pela existência de zonas de tolerância zero nas estradas), duvido que esta seja uma verdadeira transformação das finanças públicas.

 Docente universitária

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
11/02/13

.

Sem comentários: