HOJE NO
"PÚBLICO"
Portugal é dos países onde mais austeridade significa mais pobreza infantil
Relatório da Cáritas Europa parte de estatísticas da Comissão Europeia e alerta governantes para o risco de uma ou várias “gerações perdidas”.
Portugal, Grécia, Irlanda não têm apenas em comum estarem incluídos
num programa de assistência económica e financeira para reduzir
drasticamente o peso da dívida pública e reconquistar a confiança dos
mercados nas suas economias. Esses – mais Espanha, onde vigora um plano
de assistência à banca, e Itália – incluem-se no grupo de países sobre o
qual a Cáritas Europa lança um alerta especial para os riscos das
políticas de austeridade sobre as crianças e os jovens.
Nestes cinco países, o número de crianças próximas da
linha da pobreza ou em risco de pobreza e exclusão aumentou todos os
anos, a partir de 2008, atingindo já quase de um terço nos países
listados. A conclusão consta de um relatório lançado nesta quinta-feira
na Irlanda, O Impacto da Crise Europeia – A Resposta da Cáritas à Austeridade, que será apresentado em Portugal a 6 de Março.
“A
pobreza infantil é um sintoma da pobreza crescente. Mas é inaceitável”,
considera Deirdre de Burca. A responsável pelas políticas sociais da
Cáritas Europa fala ao PÚBLICO a partir de Dublin, onde o relatório
começou por ser publicado, antes do lançamento em cada um dos cinco
países analisados, por ser a Irlanda que preside actualmente à União
Europeia (UE). "Inaceitável” e “preocupante”, se olharmos para o futuro,
diz a especialista, que evoca o risco de uma ou várias gerações
perdidas nestes cinco países. É sobre isso que a Cáritas Europa quer pôr
os governantes e as instituições que impõem a austeridade a reflectir.
“As
políticas económicas aplicadas estão a criar imensos problemas sociais
com os quais será muito difícil de lidar no futuro”, sublinha Deirdre de
Burca. “Às políticas económicas e sociais tem de ser dado o mesmo peso.
E não está a ser. A União Europeia tem de mostrar liderança e
reequilibrar o peso entre políticas económicas e sociais.” A responsável
junta a sua a outras vozes para dizer: “A austeridade não está a
funcionar.”
Jovens sem esperança
A
Cáritas Europa parte das estatísticas oficiais da Comissão Europeia
(analisados por um instituto científico na Irlanda) e constata que é nos
quatro países devedores de empréstimos da UE e do FMI e na Itália que
os riscos de pobreza ou exclusão das crianças mais dispararam nos
últimos quatro anos.
As
crianças são assim identificadas (sob risco de pobreza e exclusão) se
viverem em famílias com menos de 60% do rendimento mediano nacional (no
meio entre os dois extremos) ou cujos pais têm pouco trabalho ou nenhum
emprego ou ainda se não têm satisfeitas as necessidades básicas, como
alimentos ricos em proteínas, vestuário e aquecimento em casa.
Sob
essa definição, em Portugal, 28,6% das crianças estavam em situação de
risco de pobreza ou de exclusão em 2011. Nesse ano, eram mais de 30% na
Grécia e em Espanha, mais quatro pontos percentuais do que em 2005.
Itália e Irlanda não tinham dados actualizados em 2011, mas, em 2010,
contavam-se 37,6% na Irlanda e 28,9% em Itália.
O
índice de pobreza infantil em Portugal baixou entre 2004 e 2007, mas
está acima da média dos 27 países da UE desde 2005 e registou um aumento
considerável entre 2007 e 2008 sem nunca baixar desde então. Em
2010, esse índice (diferente do risco de pobreza e exclusão) era de
22,4% quando a média da UE era de 20,5%.
A
organização recomenda às instituições que impõem as medidas de
austeridade e aos governos destes cinco países que questionem o
significado destas tendências para as crianças no futuro. Crianças que,
na pobreza, não terão certamente o mesmo aproveitamento escolar.
Não
existem estatísticas para 2012, mas, com as de que dispõe, a Cáritas
traça um quadro futuro sombrio em que as políticas de austeridade estão a
criar uma geração de jovens sem perspectivas de futuro e sem esperança.
“Os
jovens estão a ficar desesperados. Estão sem esperança de encontrar
trabalho nos próximos anos, e sem vontade de emigrar por também terem
perdido a esperança de encontrar trabalho noutros países”, continua
Deirdre de Burca. Mais: ao ficarem desempregados muitos anos, e nos
primeiros anos da vida activa, perdem as capacidades adquiridas e a
autoconfiança e ganham uma dependência social que pode ser perniciosa.
“Por isso falo em risco de uma ou várias gerações perdidas.” É como um
ciclo do qual será difícil sair.
A medida da recessão
Tendo
uma perspectiva global dos cinco países em análise, a responsável da
Cáritas Europa considera que “a medida a que chegou a contracção da
economia” é dos aspectos mais notórios da situação portuguesa. “A
economia encolheu. Perderam-se os empregos e não se criaram novas
oportunidades. Numa economia que se contrai assim, é difícil ver como
recomeçará a crescer, quando nenhuma das políticas cria emprego”,
avisa.
Contactada pelo
PÚBLICO, a Cáritas Portuguesa remeteu os comentários sobre este
relatório para a sua apresentação em Portugal no próximo mês. Para já,
alerta em comunicado para o facto "de as medidas de austeridade, como
solução principal para o combate à crise, estarem a provocar efeitos
negativos junto da população, arrastando muitas famílias para novas
situações de pobreza". E sintetiza: os efeitos mais negativos da
austeridade fazem-se sentir sobretudo nas famílias mais carenciadas e,
neste grupo, as crianças são as mais afectadas.
* Esta notícia dói e mais revolta suscita quando assistimos a jogos palacianos dos nossos políticos com sorrisos, abraços e intrigas, estão-se nas tintas para o povo português.
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