HOJE NO
"PÚBLICO"
"PÚBLICO"
Pergunta a 20 bispos:
já houve queixas de pedofilia
na sua diocese?
O PÚBLICO dirigiu-se aos bispos diocesanos do país. Sete desconhecem casos. Três informaram que não vão responder. Dez não dizem nada.
A pergunta foi feita por correio electrónico às 20 dioceses do país.
Pedia-se aos bispos responsáveis pelas mesmas que respondessem
essencialmente às seguintes questões: receberam, nos últimos anos,
queixas de abusos sexuais de crianças? Como geriram as situações? Houve
comunicação à polícia? Já houve padres transferidos de paróquia na
sequência de suspeitas deste tipo?
Sete bispos dizem não ter conhecimento de abusos,
recentes ou antigos, praticados nas instituições da Igreja. Alguns não
escondem, contudo, que esta é uma preocupação que têm presente no seu
dia-a-dia. Outros três fizeram saber que não iam prestar informação, por
não ser "oportuno" ou estarem ocupados.
Os bispos de Santarém,
Bragança-Miranda, Leiria-Fátima, Beja, Viseu, Portalegre e Aveiro foram
os que garantiram desconhecer casos. E alguns aproveitaram para dizer o
que pensavam sobre como se deve lidar com eventuais suspeitas. Já o
bispo do Porto, D. Manuel Clemente, não considerou "oportuno estar a
fazer qualquer tipo de considerações".
D. Manuel Felício, bispo
da Guarda – diocese à qual pertence o Seminário Menor do Fundão cujo
vice-reitor foi detido há uma semana por suspeita de abuso sexual de
crianças –, também fez saber que "não tem disponibilidade" para
responder. Na sexta-feira, em declarações à Lusa, anunciou que "já
iniciou o processo preliminar canónico" para apurar as suspeitas que
recaem sobre aquele padre.
Por fim, D. Jorge Ortiga, bispo de
Braga, informou que não tinha tempo para respostas. Em vésperas de
Natal, as solicitações são muitas, explicou o seu secretário.
Há
pelo menos dois anos que a Rede de Cuidadores, uma associação criada
depois do escândalo da Casa Pia de Lisboa, diz que há casos de pedofilia
na Igreja, em Portugal.
Apesar das várias tentativas do PÚBLICO, fica por esclarecer como
interpretou o cardeal-patriarca a carta que a Rede de Cuidadores lhe
mandou em Dezembro de 2010, na qual Álvaro de Carvalho lhe dizia ter
recebido "denúncias". E que diligências tomou.
A associação, fundada pela ex-provedora da Casa Pia Catalina Pestana e
pelo psiquiatra Álvaro de Carvalho, actual coordenador do Plano
Nacional de Saúde Mental, dirigiu, em 2010, uma carta a D. José
Policarpo e a D. Jorge Ortiga propondo uma "conversa discreta" sobre
"denúncias" de abusos que lhes tinham chegado.
No fim-de-semana passado,
questionada pelo PÚBLICO sobre a detenção do padre do Fundão, Catalina
Pestana insistiu: "Sei que há casos de pedofilia, só na Diocese de
Lisboa conheço cinco." E garantiu que comunicou isso mesmo a D. José
Policarpo, cardeal-patriarca de Lisboa. Abriu-se uma guerra: o cardeal,
citado por dois jornais diários, fez saber que nada sabe.
Certo é
que o Ministério Público abriu um inquérito. Enquanto o porta-voz da
Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), Manuel Morujão, pediu "provas" e
não apenas "imaginações" a Catalina. E foi na sequência deste debate
que o PÚBLICO contactou por escrito os responsáveis máximos das dioceses
do país.
Dez bispos não responderam simplesmente às perguntas enviadas
para os contactos que constam do Anuário da Igreja Católica. Outros dez reagiram de alguma forma. Até ontem, chegaram estas respostas:
"Graças a Deus, não fui confrontado com nenhuma suspeita", começa por dizer o bispo D. António Vitalino, de Beja.
Somente homossexualidade
Há mais de 13 anos que
está naquela diocese alentejana e conta que "num caso houve um panfleto
anónimo, com difamações motivadas por descontentamentos pessoais, sem
apontar para a pedofilia, mas somente para a homossexualidade".
Apesar
da inexistência de casos, esta é, contudo, uma preocupação que tem
presente: "No acompanhamento dos candidatos ao seminário procuramos
estar atentos a estas tendências (...) e procuro acompanhar os membros
do clero e adverti-los para estes problemas."
Há pouco mais de um
ano à frente da Diocese de Bragança-Miranda, D. José Cordeiro afirma:
"Ainda não recebi qualquer queixa de abuso sexual de menores, nem
conheço qualquer caso anterior ao início do ministério episcopal." Mas
tem opinião clara sobre como lidar com a pedofilia. "Sempre defendi que
esses casos configuram um crime, pelo que devem ser comunicados às
instâncias competentes (canónicas e civis) para serem devidamente
investigados e, se se comprovarem, punidos."
Sobre se é comum a
Igreja resolver o problema transferindo padres de paróquia, quando
surgem suspeitas de abuso sexual, garante desconhecer "transferências
por esses motivos". A existirem, diz que não lhe parece "uma solução
recomendável".
D. José Cordeiro cita, de resto, as directrizes da CEP sobre esta
matéria, publicadas este ano: "No caso de confirmação dos indícios ou da
credibilidade das evidências da prática do delito, deverá proceder-se
da seguinte forma: instauração imediata do procedimento canónico;
aconselhamento da vítima ou denunciantes a promover a participação
imediata dos factos às autoridades civis competentes; avaliação das
medidas cautelares a adoptar, de modo a reparar o dano e a impedir a
verificação de novos casos."
"Desejo de justiça"
De Portalegre chega
uma frase apenas, como resposta ao PÚBLICO: "Não recebi nenhuma queixa
nem me consta que alguém tivesse sido investigado judicialmente ou
transferido por razões dessas", diz D. Antonino Dias. Igualmente sucinta
é a resposta de Aveiro: "Enquanto Bispo de Aveiro, nunca recebi nenhuma
queixa/denúncia relacionada com este assunto."
"Nenhum registo",
comunica ainda a Diocese de Leiria-Fátima. "Até ao presente, nenhuma
queixa", informa o bispo de Santarém através do chefe de gabinete,
Joaquim Ganhão.
D. Ilídio Pinto Leandro, bispo de Viseu desde
2006, garante igualmente que nunca a diocese recebeu "por qualquer meio,
alguma queixa ou acusação deste teor". Lembrando, também ele, que há
procedimentos definidos para adoptar nestes casos, conclui: "A
transparência, rigor e desejo de justiça são objectivos muito claros a
nortear estas normas.
De Lisboa, a diocese à qual Catalina
Pestana se referiu especificamente, não chegou resposta. Mas esta
semana, D. José Policarpo, através do responsável para a comunicação do
patriarcado, padre Nuno Rosário Fernandes, disse desconhecer qualquer
denúncia. Apesar das várias tentativas do PÚBLICO, fica por esclarecer
como interpretou o cardeal-patriarca a carta que a Rede de Cuidadores
lhe mandou em Dezembro de 2010, na qual Álvaro de Carvalho lhe dizia ter
recebido "denúncias".
E que diligências tomou. Escreveu então o
psiquiatra: "Em Junho último expedi uma carta, também em nome da Rede de
Cuidadores, ao sr. D. Jorge Ortiga, na qualidade de presidente da CEP,
com conhecimento a V.ª Eminência, em que propunha uma conversa discreta
sobre denúncias que nos têm chegado, sobre a qual nunca obtive ecos.
Para colmatar a hipótese de a mesma se ter extraviado, nesta data envio
uma 2.ª via para os mesmos destinatários."
O secretário do bispo,
padre José Miguel, confirma que D. Jorge Ortiga recebeu Catalina
Pestana e Álvaro de Carvalho, no ano passado. E que lhes foi dito que
seriam tomadas medidas, o que veio a acontecer com a publicação das
directrizes da CEP.
Álvaro de Carvalho explicou esta semana que
da informação que há muito pretende debater com a Igreja não constam
casos de abusos recentes, ou "activos", até porque isso obrigaria a
associação a denunciá-los à polícia. Mas que tão-só tem querido que a
Igreja assuma, como aconteceu noutros países, que não tem sido imune a
casos de pedofilia.
De Lisboa, Setúbal, Coimbra, Algarve, Évora, Funchal, Angra, Lamego,
Vila Real e Viana do Castelo não houve qualquer reacção aos emails do
PÚBLICO – António Guerreiro Guerra, de Viana, vigário do clero, disse,
contudo, sem querer falar pelo bispo, que ali se desconhecem casos. E
não deixou de manifestar um desabafo: a Igreja tem que actuar perante
"qualquer denúncia ou suspeita", e "suspender" quem for culpado, mas os
jornais não deviam ocupar-se destes assuntos. "Que interesse tem andar a
dar estas notícias?"
* O sr. Vigário ainda pensa que estamos no tempo de "Deus, Pátria, Autoridade", tem sido a comunicação social o veículo que contraria a vontade de desinformar por parte das autoridades civis, militares, financeiras e religiosas, felizmente que os jornais se ocupam de todos os assuntos, até os do conto do vigário.
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