.
IN "PÚBLICO"
21/11/12
.
Provincianismo
entre gigantes
Não há provincianismo mais irritante, nem mais perigoso, do que o dos
grandes centros, em particular os países grandes e os que se julgam
grandes.
Mais irritante porque o provincianismo dos pequenos meios
reconhece-se; o dos grandes centros é cego perante si mesmo e impossível
de extirpar.
Mais perigoso porquê? Porque julgando ver o mundo,
não vê senão a sua barriga. Não reconhece a diferença nem os matizes, e
aplica a mesma receita estupidamente em todo o lado. Temos exemplos.
Nada foi mais letal nesta crise do que ter os problemas da zona euro,
respeitantes a dezassete economias, discutidos entre Berlim-Paris e
Paris-Berlim. Nas próximas semanas e meses, teremos outro grande momento
do provincianismo entre gigantes: o orçamento da União, respeitante a
vinte e sete países, discutido entre Londres-Berlim e Berlim-Londres.
Se
um pequeno é obtuso e estreito de vistas, em geral, não prejudica a
mais ninguém senão ele mesmo. Quando um grande é obtuso e estreito de
vistas, prejudica ainda mais aos outros do que a ele, e nem disso se
apercebe.
O provincianismo dos grandes acabou por fatalmente
contaminar a visão da Europa sobre si mesma, e distorcer-lhe a visão
sobre o resto do mundo. Liderada pelos grandes países, a Europa continua
sem saber o que fazer das economias emergentes, sem entender que a
ascensão dos outros deve ser vivida com naturalidade. Não é possível,
nem é necessário ou saudável, que o Atlântico Norte, com apenas
dezasseis por cento da população mundial, tenha sessenta por cento do
PIB do planeta. E é necessário que a região da Ásia-Pacífico cresça para
alimentar os três mil milhões de bocas (e mais ainda) que ali viverão
nas próximas décadas. O crescimento da China e da Índia representam
apenas um regresso à normalidade da economia global durante quase dois
milénios, com exceção do par de séculos que nos precedeu.
Mas o
provincianismo dos grandes europeus também se reflete na maneira como
olham para o curto prazo e as pequenas distâncias. Embora tenham já
aceitado que, em muito breve, a União vá ter um executivo eleito, é-lhes
muito difícil aceitar que os candidatos a presidente da Comissão
Europeia tenham de fazer campanha eleitoral em todos os estados-membros
da União. Na próxima quinta-feira será votada no Parlamento Europeu uma
emenda que propõe isso mesmo, e tem sido para já inexcedivelmente
complicado explicar aos deputados dos grandes países por que é isso
importante.
Talvez não o façam por mal; parece-lhes uma bizarria
propor que um candidato a ser chefe do executivo de uma União com 27
países tenha de os visitar a todos e em cada um deles apresentar o seu
programa eleitoral. Não vêem é claro, que caso contrário uma campanha se
poderia concentrar em dois ou três países, e não entendem (pelo menos,
não entendem à primeira) o que se perde com isso: ao apresentarem o seu
programa em 27 países, os candidatos teriam de saber de que forma esse
programa beneficiaria aquelas pessoas concretas, teriam de aprender e
teriam de se comprometer com aqueles interesses e aquela maneira de ver o
mundo.
Ou seja, teriam de superar a mentalidade mesquinha e
tacanha a que injustamente chamamos provincianismo e que, a partir dos
grandes centros, tem sido a tragédia da Europa atual.
Deputado independente ao parlamento europeu, candidatura através do BE
IN "PÚBLICO"
21/11/12
.
Sem comentários:
Enviar um comentário