12/09/2012

PEDRO NORTON







Entre Scylla e Charybdis 

Foi a António José Seguro que saiu em rifa o grande dilema político do momento 

Os tempos não estão fáceis para ninguém, o céu da Europa enche-se de negras nuvens, a Grécia perdeu-se já no nevoeiro e em Portugal troveja. Perante tamanho dilúvio o mínimo que pode dizer-se é não deve ser nada confortável estar na pele do timoneiro da nossa nau Catrineta. Poucos de entre os que permanecem lúcidos lhes gabarão a sorte. Mas dito isto, e paradoxalmente, foi a António José Seguro que saiu em rifa o grande dilema político do momento. A fava, desse estrito ponto de vista, não mora em São Bento. Por razões que nem são difíceis de perceber. 

Por um lado, o primeiro-ministro não tem à sua mesa um cardápio de alternativas dignas desse nome. Cumpre escrupulosamente um guião austero que não tem reais poderes para alterar. E por muito que se possa pensar - e eu penso - que mais do que avaliações da troika está na hora de fazer avaliações à troika; por mais que se possa dizer - e eu digo - que o problema de Portugal não está na capacidade do Governo de cumprir à risca o grosso dos mandamentos das tábuas sagradas mas na ortodoxia inflexível do trio de Moisés que as trouxe à terra; por mais que se possa esperar - e eu espero - que o Governo se esteja a empenhar com todas as suas forças para que o autorizem a moderar a terapia de choque que nos vai sufocando; por mais que se diga tudo isto e mais umas botas, a verdade é que a única arma que o Executivo tem para tentar impedir que o País seja obrigado a agravar ainda mais a carga fiscal e a mergulhar numa espiral recessiva de imprevisível recuperação é um impecável diploma de bom comportamento. 

Se o Mundo fosse justo, isso seria seguramente suficiente. Mas estou infelizmente convencido de que o preço do precedente de uma flexibilização de metas em Portugal vai assustar os nossos credores europeus. António José Seguro terá, por seu lado, muitas e fundadas razões para defender que o País não suporta mais impostos. Tem legitimidade plena para dizer que só quem não quer ver é que não vê que os resultados do programa de ajustamento estão longe de ser os desejados. No desemprego, nas receitas fiscais, no cumprimento dos valores do défice, no comportamento do consumo privado e - até ver - da economia. E tem, pois, a oportunidade de transformar em capital eleitoral o sentimento de desalento e de desespero que grassa no País. 

Porque, ao contrário de Passos, dispõe de uma valiosa arma política. Pode votar contra um orçamento que, mais do que impopular, corre o sério risco de vir a revelar-se um instrumento de política económica concebido a pensar mais nas eleições alemãs do que na saúde de Portugal. Assim sendo, estarão os meus amigos a perguntar, por que carga de água não sorri o homem? Porque o peso da responsabilidade tira, apesar de tudo, muito soninho. E o líder do PS sabe que o sinal de rutura que tanto o tenta, será a confirmação por que esperam todos quantos, por essa Europa de desenfreados populismos, não se cansam de dizer que o nosso problema é, afinal, o problema de todas as ingovernáveis choldras. Uma tragédia que, por agora, verdadeiramente dispensamos. Ao contrário do que possa parecer, 

Seguro está entre Scylla e Charybdis. Ou between a rock and a hard place, como se diz em bom português. 

 IN "VISÃO" 
07/09/12

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