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ONTEM NO
"PÚBLICO"
Cientistas portugueses criam
. microfígados em laboratório
Qualquer medicamento passa pelo fígado, por isso é importante que haja testes que antecipem o resultado desta travessia feita por novos fármacos. Uma equipa portuguesa conseguiu produziu, em laboratório, minúsculas estruturas de células hepáticas humanas com a mesma organização do fígado.Estes microfígados poderão ser utilizados para fazer estes testes.
As estruturas foram mantidas durante um mês a funcionar normalmente. Os resultados da experiência, publicados agora na revista Hepatology, são promissores no desenvolvimento de máquinas de apoio à função hepática como se faz actualmente com a hemodiálise que substitui o trabalho do rim.
A investigação de uma equipa do Instituto de Biologia Experimental e Tecnológica, em Oeiras, liderada por Paula Alves, começou há cerca de seis anos após o contacto de um consórcio europeu que queria criar modelos in vitro para fazer o teste de fármacos. “O objectivo era evitar os modelos animais nos testes, porque não são representativos em relação ao que se passa no homem e também por razões éticas”, explica Paula Alves ao PÚBLICO.
A equipa tinha experiência em trabalho com biorreactores – instrumentos onde se podem colocar células a crescer num meio tridimensional e é possível controlar, numa solução, parâmetros como a temperatura, o pH, o oxigénio ou o açúcar. Quando colocaram numa solução as células do fígado, chamados hepatócitos, conseguiram criar estruturas tridimensionais de 0,1 milímetros de diâmetro, onde estas células humanas adquiriram a mesma formação e fisiologia que teriam no fígado.
“As células reorganizam-se entre elas de forma parecida com a do órgão, vêem-se os canais biliares [que existem normalmente no fígado e por onde são excretados os produtos segregados pelas células]. Não é como as células tumorais que se agarram umas às outras sem nexo”, descreve a investigadora. Formaram-se assim uma espécie de microfígados.
A equipa teve sucesso em manter ao longo de um mês microfígados provenientes de hepatócitos de pessoas de idades e etnias diferentes. Ao longo desse tempo, os microfígados produziram as mesmas proteínas que o fígado humano e em quantidades equivalentes. Isto permite não só “fazer testes farmacológicos numa situação mais próxima da que ocorre no tecido vivo, onde as interacções entre células são semelhantes às que existem no fígado, como também aplicar doses repetidas de um fármaco nas mesmas células”, especifica a bioquímica.
Antes, quando os testes eram feitos em células em placas de Petri, só era possível fazer uma vez o teste farmacotoxicológico, as células depois iam para o lixo. Com os microfígados, é possível testar o mesmo fármaco várias vezes, imitando o que se passa na realidade, em que os pacientes tomam várias doses de um medicamento ao longo do tempo para a maioria dos tratamentos.
A equipa trabalhou em colaboração com a empresa sueca Cellartis, a primeira a colocar no mercado células do fígado derivadas de células estaminais humanas, que podem originar todos os tipos de tecido, para a investigação de novos medicamentos. Paula Alves recebeu mais contactos de outras empresas interessadas em testar esta tecnologia e disse que o processo ainda vai ser melhorado.
Mas este trabalho também poderá ter um impacto directo na saúde. A investigadora está à espera da aprovação de financiamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) para iniciar um projecto com o centro de transplantes do Hospital Curry Cabral, em Lisboa: a ideia é aplicar a técnica desenvolvida no apoio de doentes que sofrem de insuficiência hepática.
A aplicação só faz sentido em doentes num estado de saúde extremo. “Só arriscamos terapias novas em casos muito raros e especiais”, assegura a cientista. Por exemplo, se o fígado de um doente deixar de trabalhar, uma máquina externa com um fígado bioartificial poderia manter temporariamente a função hepática até o órgão do doente recuperar ou ser transplantado.
Estas estruturas criadas em laboratório teriam que ser maiores do que os microfígados até agora desenvolvidos, mas se o projecto avançar, a cientista dá uma “previsão de três anos para fazer ensaios em doentes”.
* Se os políticos portugueses tivessem a mesma seriedade e capacidade de trabalho dos cientistas, não tinham transformado Portugal num triste mendigo europeu.
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