A síndrome de Marilyn
O filme A Minha Semana com Marilyn, que marca a estreia do realizador Simon Curtis, baseado no romance de Colin Clark, Me, The Prince and The Showgirl, fez-me reflectir sobre um estilo de comportamento feminino que está cada vez mais fora de moda e com índices recessivos de sucesso junto dos homens – o da mulher que se sente sempre desprotegida e que reclama protecção masculina a qualquer preço.
O mito de Marilyn é eterno, porque nunca acusa sinais de cansaço. Norma Jean viu-se desde cedo privada da mãe, que foi dada como louca e internada num hospício, tendo vivido em orfanatos e em casa de parentes e de amigos até se lançar como modelo e depois como actriz. O trauma do abandono que nunca mais a deixou, nem mesmo depois de se ter consagrado como Marilyn Monroe, ou, arrisco dizê-lo, sobretudo depois de se ter consagrado como a actriz mais sexy de todos os tempos.
Marilyn era bela, voluptuosa, sedutora e ao mesmo tempo frágil e ingénua como uma criança. A sua vida tem mais enredo do que a soma dos filmes que protagonizou e a sua misteriosa morte em 1962 não é alheia ao caos emocional no qual viveu mergulhada desde sempre.
Marilyn cultivou a fragilidade como nenhuma outra estrela em Hollywood, provavelmente porque acreditava que podia ser salva, ignorando o sábio provérbio que os lúcidos nunca esquecem que proclama que Deus ajuda quem se ajuda a si mesmo. Mas ninguém sabe até que ponto esse papel que desempenhou na vida real não corresponde a uma encenação que a actriz escolheu para a vida. Os actores fazem este tipo de escolhas com frequência, de forma mais ou menos consciente. Conheço vários que ao longo dos anos se agarraram de tal forma a uma personagem por eles criada que depois já não conseguem libertar-se dela.
Entre os vários estilos é fácil identificar a ‘mulher sofredora’ que espera ainda e sempre que o ‘homem da sua vida’, que o destino guardou para ela, a venha finalmente resgatar, qual princesa encarcerada no alto de uma torre inóspita onde ratos convivem com bruxas, ogres, dragões e outros seres pouco simpáticos.
Tal atitude não só assusta os homens, como provoca neles uma estranheza desconfiada, surtindo o efeito contrário ao desejado. Então não andamos desde os anos 60 a lutar pela emancipação, pela igualdade de oportunidades no mercado de trabalho e pela não discriminação do género? São mais de 50 anos a proclamar um novo estatuto, esperando que os homens aprendam a ver-nos como seus iguais em direitos.
Fomos nós, as mulheres, que mudámos a visão dos homens em relação ao que eles pensam que esperamos deles. Fomos nós que nos libertámos do triângulo infernal do fogão, do tanque e das fraldas, que arranjámos empregos e lhes mostrámos que conseguimos fazer tudo sozinhas. Com tanta segurança e tanta independência, como podemos agora reclamar que nos venham salvar? Salvar-nos de quê afinal? Só se for dos nossos fantasmas e ambivalências.
Já ninguém salva ninguém; o estilo de Marilyn está fora de moda. Talvez para sempre.
IN "SOL"
17/01/12
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