29/01/2012

ISABEL CAEIRO


Tenho prejuízo fiscal, 
        logo pago mais imposto?

As empresas que apresentem prejuízo fiscal a partir de 2011 poderão acabar por ser mais penalizadas, do ponto de vista fiscal, do que aquelas que apresentem lucro tributável.
Não terá sido por acaso que, em ano de plena crise económica, as regras da tributação autónoma em IRC se alteraram de modo a acomodar um aumento de receita para o Estado, por vezes inversamente proporcional aos lucros obtidos pelas empresas.

Estranho? Eu passo a explicar.

Até à entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2011, somente as empresas que apresentassem prejuízo fiscal nos dois exercícios anteriores ficariam sujeitas à taxa agravada de tributação autónoma de 20%, a incidir sobre as despesas dedutíveis respeitantes a viaturas ligeiras de passageiros e mistas, cujo valor de aquisição fosse superior a 40 mil euros.

A partir de 2011, inclusive, aquela regra foi alterada no sentido de todas as taxas de tributação autónoma passarem a ser agravadas em dez pontos percentuais, sempre que o contribuinte apresente prejuízo fiscal no próprio exercício a que os encargos respeitem.

Ora, aliando esta nova regra ao facto de a taxa de 20% de tributação autónoma ter passado a ser aplicada às despesas com viaturas de valor superior a 30 mil euros (para as adquiridas em 2011), independentemente de a empresa apresentar prejuízos fiscais ou não, veio fazer com que a taxa final de tributação autónoma possa ascender a uns meros 30%.

E tudo isto num exercício em que a maioria das empresas começa a sentir "na pele" os efeitos nefastos da crise económica e lutam por conseguir sobreviver.

De facto, começa a assistir-se a um sistema tributário em que cada vez mais o conceito de imposto sobre o rendimento mais parece uma miragem ou uma ideia conceptualmente correcta mas sem aplicação prática.

Quantas empresas, agora no fecho das contas do exercício de 2011, acabaram por registar como encargo de imposto do ano apenas o valor referente à tributação autónoma, a qual incide exclusivamente sobre a despesa e não sobre o rendimento, agravada ainda pelo facto de a actual conjuntura não lhes ter permitido apurar lucro tributável no exercício?

E o pior é que a maioria dos sujeitos passivos ainda não se encontra sensibilizado para estas novas regras e provavelmente só se vai aperceber deste facto quando for preencher a sua declaração Modelo 22 de 2011 no próximo mês de Maio, sem ter reflectido essa situação nas suas contas. E que surpresa vão ter.

É que, no limite, uma empresa que só possua viaturas de valor não superior ao limite legal vai calcular a sua tributação autónoma à taxa de 10%, quando a taxa correcta poderá ser de 20%, se apresentar prejuízo fiscal no exercício. Este acréscimo representará assim uma duplicação face ao valor inicialmente estimado.

Isto já para não falar no facto de a tributação autónoma ter passado a incidir sobre a totalidade das despesas elegíveis, independentemente de estas serem consideradas como fiscalmente dedutíveis ou não. É que anteriormente a 2011, somente se sujeitavam a tributação autónoma os encargos que fossem aceites para efeitos fiscais, o que significava que as despesas acrescidas ao resultado líquido do exercício não eram consideradas para efeitos desta tributação, evitando assim qualquer duplicação de colecta.

Acresce a toda esta situação o facto de a dedução dos prejuízos fiscais reportados ter passado a ser limitada a 25% do lucro tributável apurado em período de reporte, impondo assim algumas restrições a nível do apuramento dos impostos diferidos associados.

Deste modo, quando as empresas que apresentarem prejuízos fiscais procurarem calcular o respectivo activo por impostos diferidos, deverão ter em atenção que os mesmos poderão não ser recuperáveis a 100% no futuro.

Concluindo, as empresas que apresentam prejuízo fiscal a partir de 2011 poderão acabar por ser mais penalizadas, do ponto de vista fiscal, do que aquelas que apresentem lucro tributável.

TOME NOTA

1. Já lá vai o tempo em que uma situação de prejuízo fiscal não dava origem ao pagamento de impostos sobre um lucro que não existia;

2. Hoje em dia, além de as empresas com prejuízo fiscal já terem de efectuar pagamentos especiais por conta, vêem a sua taxa de tributação autónoma ser agravada em 10%;

3. Este agravamento abrange não só os encargos com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, mas também as despesas de representação, as ajudas de custo e o pagamento de subsídios por deslocação em viatura própria, bem como as remunerações variáveis e as indemnizações por cessação de funções, ambas aplicáveis a gestores, administradores e gerentes;

4. Neste contexto, as empresas sentir-se-ão tentadas a corrigir "por excesso" o seu resultado líquido contabilístico, de modo a alcançar o tão almejado lucro tributável e evitar, assim, o agravamento da tributação autónoma?



IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
26/01/12

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2 comentários:

Anónimo disse...

O que é isso de "Prejuizo fiscal". Para mim qualquer imposto é um prejuizo. Ou haverá impostos que sejam "lucro"? Fiscalistas para a Sibéria, JÁ!

MEIALEKA disse...

Sem sermos fiscalistas pensamos que autora quer referir a situação de empresas cujo exercício de actividade deu prejuízo, mas que entretanto já entregaram uns milhares de euros ao fisco na rubrica "pagamentos por conta" uma "notável" invenção de Manuela Ferreira Leite.