19/12/2011


HOJE NO
"DIÁRIO DE NOTÍCIAS"

Viarco aposta na criação de lápis 
com valor acrescentado
A fábrica remete para a Revolução Industrial e abre as portas ao público em Janeiro. Tudo o que faz é diferente

José Vieira, neto do fundador da Vieira e Araújo, a Viarco, e actual dono da fábrica e da marca, esteve na Suíça há duas semanas. Levou material de arte e lápis de cor para oferecer a um amigo artista plástico. A irmã deste, quando viu, fez várias encomendas para o Natal. Falta dizer que a Suíça é terra natal da toda-poderosa Caran d'Ache, uma das maiores multinacionais de papelaria. "Como se vê, isso não impede que haja espaço para uma empresa como nós", diz.

Quando diz "como nós", José Vieira refere-se a uma pequena, pequeníssima fábrica de lápis, a última na Península Ibérica que, incapaz de competir com o volume de produção e o marketing agressivo e milionário da marca suíça ou dos alemães da Faber-Castell ou da Staedtler, virou as agulhas para o negócio dos lápis com valor acrescentado.

Na Viarco dedicam-se a fazer diferente, receita de sucesso quando toda a gente lhe dizia que o melhor era fechar. "Nós vendemos mais do que aquilo que é o tradicional lápis escolar", destaca.

Vendem memórias (os lápis com que gerações e gerações de portugueses aprenderam escrever, a ler e contar), vendem soluções divertidas (o pior lápis do mundo, que não escreve e só serve para pregar partidas) e lápis à medida do que os clientes pedem. Estão a começar um processo de internacionalização com vendas para os Estados Unidos e a Itália, cujo pedido já foi repetido. Os produtos especiais também chegam à Alemanha, à Inglaterra e à França. E vendem também uma maneira de fazer as coisas que já não existe.

Na fábrica, no cima de uma rua, em São João da Madeira, há arqueologia industrial. Máquinas que datam do século XIX, totalmente mecânicas, carvão, uma maneira quase artesanal de produzir lápis que a câmara municipal da cidade achou, tal como José Vieira, que "é de todos" e para todos verem. Assim, a partir de Janeiro, as instalações passam a estar inseridas no roteiro industrial da autarquia, ao lado de uma fábrica têxtil, outra de calçado e outra de chapéus. A medida, defendida pelo proprietário há muito, permitirá "salvaguardar o património da fábrica".

Fundada em 1919, a Viarco está nas actuais instalações desde o final da década de 30, vinda de Vila do Conde, que foram objecto de uma restruturação importante e cuja factura é paga pela Câmara de São João da Madeira, liderada por Manuel Castro Almeida. "Não vamos pôr a fábrica nova. É para ser mantida a sua essência, não vamos descaracterizar o que ela é", sublinha José Vieira. Foi criada uma sala de acolhimento para receber os visitantes que obrigou a mudar secções de sítio e um espaço expositivo (e loja) da Viarco, com documentos, lápis e objectos que contam a história desta empresa que atravessou uma guerra mundial, uma ditadura e o ataque das multinacionais pós-adesão à Comunidade Europeia. José Vieira almeja "transformar isto num negócio rentável", de que tratarão as gerações vindouras. "Sem terem de passar pelo que nós passámos", frisa. Isto porque, lembra, "disseram-nos que devíamos vender a fábrica".

Com a Viarco trabalham imensos artistas portugueses que aproveitam a abertura da empresa para os receber nos seus ateliers. Dessas colaborações têm surgido ideias para novos produtos: um deles, o bastão de grafite, foi sugestão do pintor José Emídio. E esse é o ponto forte da empresa, segundo o seu proprietário: "A nossa disponibilidade para ouvir, para interpretar, para arriscar e não ter medo de falhar. E quando se ousa fazer o que nunca foi feito, a probabilidade de acertar é grande."

José Vieira conta que em Janeiro lançam dois novos produtos, um deles um carvão aguarelável, e têm outros 20 projectos na gaveta. "A questão é saber se vamos ter tempo para tudo!"


* A VIARCO, ela própria um enorme valor acrescentado


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