A Divina Comédia
Qual é a diferença entre o céu e o inferno? Há uma velha anedota que diz que no céu os cozinheiros são franceses, os polícias são britânicos, os mecânicos são alemães, os amantes são italianos e os banqueiros são suíços.
No inferno, os britânicos são cozinheiros, os polícias são germânicos, os mecânicos são franceses, os amantes são suíços e os banqueiros são italianos.
E não é que na Europa dos nossos dias temos um banqueiro central que é italiano, uma alemã a fazer de polícia e um trio na cúpula das instituições europeias - Barroso, Rompuy e Ashton - que não manda nada e de uma neutralidade desconcertante perante os ditames do directório ‘Merkozy'. Já dizia Dante Alighieri que no inferno "os lugares mais quentes são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise".
No meio desta divina comédia, temos um grego a querer fazer referendos suicidas, uns eslovacos a boicotar o fundo de resgate europeu, uns finlandeses sempre dispostos a ajudar o próximo, um italiano que só gosta de festas e que chama de "gorda mal f..." à chanceler alemã e um francês que está sempre às turras e a mandar calar o vizinho Cameron.
Foi esta triste figura que fizemos no G20 e que levou Obama a dizer que, em dois dias, teve um curso intensivo sobre o que é a Europa. E foi a solidariedade demonstrada entre os europeus que levou Dilma a dizer que "se eles próprios não têm interesse em investir no seu fundo, porque é que o Brasil teria?".
E no meio desta Europa ecléctica, esquizofrénica e estereotipada, que a impede de conseguir um maior grau de integração económica e política, qual é o estereótipo do português? É o Zé Povinho? São os três F - Futebol, Fado, Fátima? Cavaco Silva acha que não. O presidente da República veio dizer ontem que o estereótipo do português em tempos de crise devia ser como aquela figura típica de Nelas, o moiral, que levava todos os dias os rebanhos para a Serra da Estrela. Cavaco Silva descreveu o moiral como sendo alguém para quem "não havia fins-de-semana, não havia férias, feriados nem pontes em nenhumas circunstâncias".
O Zé Povinho era homem para fazer um manguito a esta ideia. Diria que, para inferno, já nos basta a Europa que temos.
SUB-DIRECTOR
IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
07/11/11
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