Carta aberta
a um funcionário público
Sei que esta é a pergunta que mais vezes tem feito a si próprio: porque é que eu tenho de sofrer mais do que todos os outros? Porque é que só eu sou espoliado de dois meses de ordenado em 2012 e 2013? Será que o funcionário público passou a ser o bode expiatório da nação?
Percebo o que sente. A medida é injusta, como é injusto todo o Orçamento de 2012. Os portugueses não mereciam ter de passar por isto. Mas desde 1974 que elegemos os nossos próprios governantes. Fomos nós que colocámos em São Bento os responsáveis pelo estado a que chegámos. Portanto, respire fundo e tente pensar claro. Existe uma razão económica que o faz sofrer mais do que os outros. Se o Estado cortasse nos salários do sector privado ficando ele com o dinheiro (como no corte de metade do subsídio de Natal), estaria apenas a aumentar impostos. Se o Estado cortasse nos salários do sector privado permitindo às empresas ficarem elas com o dinheiro, o Estado acabaria por receber menos impostos (porque as pessoas ganhariam menos). Já se o Estado cortar no seu salário, está a cortar no sítio certo – na despesa pública.
Mas se esta razão técnica não o satisfaz, então fique com a razão essencial: você sofre mais porque o seu patrão não presta. Você sofre mais do que um trabalhador privado porque lhe mentiram, dizendo-lhe que o Estado era o paraíso laboral, pois nunca despedia e tudo oferecia. Infelizmente, o Estado foi apenas glutão, irresponsável e incompetente. Você sofre mais do que todos os outros porque a empresa onde trabalha faliu. As portas continuam abertas, é certo. Mas não se engane: o seu patrão mudou. Para sempre.
IN "CORREIO DA MANHÃ"
28/10/11
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