22/09/2011


HOJE NO
"i"

Mais troika. 
Por que Portugal será forçado 
a pedir um segundo empréstimo
Depois da troika teremos dívida de 115% do PIB
e economia anémica

Cumprir o memorando assinado com a troika – este é o mínimo olímpico, a única variável que o governo português controla na tarefa de conseguir restaurar a confiança de quem deixou de emprestar dinheiro ao país. O ministro das Finanças espera que chegando a 2013 com um défice orçamental controlado e reformas estruturais lançadas, Portugal consiga largar as muletas da troika e pedir emprestado a juros suportáveis – as previsões do próprio FMI, contudo, parecem sugerir o contrário.

Mesmo cumprindo o essencial do ajustamento mais violento, o país chegará a 2013 com poucas condições para conseguir voltar aos mercados de dívida a juros suportáveis. O que verá quem olhar a partir de fora? Um país com uma dívida pública equivalente a 115% do PIB (previsão do FMI); uma economia com um crescimento à volta de 1%, a sair das cinzas depois de uma contracção total de 4% entre 2011 e 2012; um país sem política cambial e monetária, com dificuldade em criar rapidamente motores de crescimento. Nestas condições, só teria hipóteses de regressar aos mercados caso os líderes europeus resolvessem entretanto o problema de confiança em toda a zona euro – um cenário cada vez mais distante (ver caixa ao lado).

O cumprimento das metas mais importantes do memorando não está, por outro lado, isento de riscos. A deterioração da economia europeia, para onde vão 75% das exportações portuguesas, ameaça agravar a recessão interna, dificultando a redução do défice. A transparência imposta pela troika leva à descoberta ou contabilização de novos buracos financeiros, como no caso da Madeira ou dos hospitais-empresa. A máquina pública pode não conseguir reagir com a rapidez necessária ao ritmo exigido pela metas da troika (como mostra a diminuição do ritmo de queda do défice em Julho, revelado há dois dias). Com excepção do primeiro caso, os restantes são riscos controláveis pelo governo – ainda que signifiquem austeridade adicional, com potencial perda de apoio do eleitorado e risco de maior recessão.

A europa vai demorar a resolver 
a crise de confiança

O colapso da Grécia é um risco imediato para Portugal – mas é no tempo que a Europa vai demorar a resolver a crise de confiança do euro que está a maior ameaça ao regresso do país ao mercado de dívida.

“A reforma da governação da zona euro é politicamente e tecnicamente complexa e levará tempo considerável para pôr em prática, para ganhar a confiança dos investidores e a aceitação do público”, apontou esta semana David Riley, que lidera o departamento de dívida soberana da agência de notação Fitch. Riley não está sozinho na apreciação. Kenneth Rogoff, professor em Harvard e co-autor da obra de referência sobre falências soberanas (“This Time is Different, Eight Centuries of Financial Folly”), fala também em tempo. “A Europa precisará de uma reforma mais profunda do que a criação do Fundo Europeu de Estabilização Financeira”, apontou ao jornal francês “Les Echos”. “Para salvar o euro terá de fazer uma verdadeira reforma institucional daqui a um ou dois anos”.

Este é um horizonte que não serve aos prazos apertados de Portugal. A dificuldade está na aceitação por parte dos eleitorados europeus (sobretudo as mais ricas, do norte) de mais integração orçamental e política – um eufemismo para, grosso modo, designar uma união monetária em que os países mais frágeis têm de cumprir regras apertadas e os mais ricos de garantir o cumprimento da dívida de todos.

Além da maior integração, vários economistas – dentro e fora do país – sustentam que a resposta europeia terá que passar por um perdão de dívida da Grécia, de Portugal e da Irlanda. Rogoff defendeu este passo ontem, sendo que em Portugal o tema antes tabu começa a ser falado da esquerda (José Reis, Jorge Bateira, etc.) à direita (João César das Neves, Miguel Beleza). Sem baixar o nível de dívida – que muitos acreditam que estes países não serão capazes de cumprir – não haverá recuperação da credibilidade.

A “coisa grave” na Grécia é uma certeza
para os mercados e a Europa

Economistas, analistas de mercado e, desde há dois dias, o primeiro-ministro de Portugal: todos concordam que a precipitação da falência grega teria um efeito de contágio muito negativo para Portugal. Esta falência é dada como certa pelos credores e já foi preparada pelas maiores economias do euro, como a Alemanha – falta, apenas, saber a data.

“Penso que vai acontecer quando o novo Fundo Europeu de Estabilidade Financeira estiver em vigor e o novo presidente do Banco Central Europeu a trabalhar, portanto basicamente em Novembro”, afirmou ontem à Reuters Guntram Wolff, vice-director do instituto Bruegel, próximo da política europeia, em Bruxelas. O novo Fundo terá capacidade para ajudar preventivamente países sob pressão, podendo ser usado para recapitalizar bancos.

Por falência entende-se um perdão de dívida. O peso da dívida pública grega supera 160% do PIB e ninguém acredita que o país seja capaz de cumprir os pagamentos. Wolff faz parte de um grupo de vários economistas que referem um perdão superior a 50%, ou seja, uma perda para os credores entre 110 a 120 mil milhões de euros. Muitos destes credores são bancos – incluindo portugueses, como o BCP (que tem operações na Grécia) – que terão de ser recapitalizados pelos accionistas e pelos contribuintes, para evitar um colapso do sistema europeu.

A falência grega – num cenário em que a Europa ainda não tem resposta para a crise do euro – terá um efeito de contágio difícil de medir. “Estamos a entrar em território virgem”, admite o economista Miguel Beleza. Certo é o efeito em Portugal. “Abre-se o precedente de um país do euro não pagar as dívidas e isso tem impacto imediato nos restantes países”, diz Christopher Smallwood, economista da consultora Capital Economics. Além de minar ainda mais a confiança em Portugal (que tem um rácio de dívida acima de 100% do PIB), aperta mais o financiamento da banca, o que pode agravar a recessão e dificultar o cumprimento do memorando da troika.


* Já se sabia que os 78 mil milhões de euros eram insufcientes desde a sua negociação. Repetimos, "Os Donos do Dinheiro" querm que os países periféricos andem sempre endividados, dá-lhes lucro.

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