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IN "O JORNAL ECONÓMICO"
26/05/20
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Uma nova normalidade
Só vai ficar tudo bem se mudarmos muito do que estava mal na dita normalidade que estava instalada pré-Covid-19.
Não foi há muitos anos que Portugal conheceu um drama provocado por
um processo de intervenção da troika que aprofundou uma crise estrutural
crónica. Nos últimos tempos, inverteu-se caminho e deram-se passos para
uma recuperação económica e social, embora não da forma célere e
determinada que era fundamental.
Essa recuperação tem sido lenta e
não dotou o país da robustez necessária para enfrentar a nova crise
provocada pela pandemia de Covid-19. Hoje, vemo-nos novamente
mergulhados numa crise social significativa. Se aprendemos algo com os
erros do passado, é evidente que a austeridade só poderia trazer mais
problemas. Mais do que nunca, exige-se um Estado interventivo e
determinado nos investimentos necessários, que não coloque a cegueira do
défice à frente das respostas que os cidadãos precisam e que não deixe
ninguém para trás desprotegido.
Desde logo, saltam à vista três
áreas em que é preciso dar resposta às exigências que se colocam –
transportes, saúde e soberania –, sem prejuízo de outras matérias também
fundamentais.
Em tempo de confinamento houve uma modificação
muito significativa na vida diária da generalidade das pessoas. Os
índices de poluição baixaram consideravelmente, sobretudo porque as
deslocações pendulares deixaram de se realizar massivamente, o que
comprova a necessidade de uma aposta real numa boa rede de transportes
públicos, a custos comportáveis para os utentes, que desmobilize os
cidadãos da utilização diária do automóvel particular, ajudando assim à
descarbonização do país e à redução das causas das alterações
climáticas. Sem mais e melhores condições, nada vai mudar.
Também
existe hoje um reconhecimento mais generalizado da importância do
Serviço Nacional de Saúde e de todos os seus profissionais. O SNS é
determinante para garantir o direito à saúde de todos e demonstrou ser o
pilar em tempo de crise, quando as unidades privadas fechavam a porta
ao reforço de resposta que tinham capacidade de dar e agora até cobram
aos utentes pelos equipamentos de protecção.
Este surto epidémico
veio demonstrar igualmente a importância de os países ganharem robustez
em termos de soberania alimentar, porque é determinante para reduzir a
pegada ecológica, mas também porque, em tempos de crise de abastecimento
alimentar, como aquele que uma pandemia pode causar, é preciso que os
países estejam em condições de assegurar respostas aos cidadãos.
Por
outro lado, esta crise demonstrou a fragilidade de um crescimento
económico baseado essencialmente sobre o turismo e que descurou a
produção de bens diversificados, não só a nível alimentar, mas também de
bens de saúde como se viu com a questão das máscaras. Também o comércio
local, muitas vezes votado ao abandono, foi determinante para o
abastecimento das populações confinadas às suas residências e ao seu
bairro, prestando um serviço de proximidade insubstituível.
Por
muito emotivos que sejam os aplausos, os arco-íris e uma certa
romantização da quarentena, que, na maioria dos casos não é a realidade,
só vai ficar tudo bem se mudarmos muito do que estava mal na dita
normalidade que estava instalada pré-Covid-19.
* Membro da Comissão Executiva do Partido Ecologista Os Verdes
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
26/05/20
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