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Economia sem neoliberalismo
Não há governo no mundo que não use a economia para guiar as suas políticas de forma sensata, avaliar os seus efeitos, e prevenir disparates.
Quem frequenta uma cadeira de introdução à
economia de um semestre e nada mais pode confundir economia com
neoliberalismo. A economia moderna distinguiu-se pelo estudo do ser
humano como agente que tenta fazer o melhor que pode sujeito às muitas
limitações que enfrenta, e pela forma como os mercados e a livre troca
entre essas pessoas quase sempre levam a melhores resultados do que o
planeamento de um ditador ou de um ministro. Para além disso, a prática
da economia no setor privado mostra que é fundamental a compreensão
profunda de que não há almoços grátis, os preços são sinais dos
mercados, e para todas as escolhas há custos de oportunidade.
Praticamente todos os economistas sensatos que conheci na minha vida e
que serviram os seus países em funções públicas, regressam com a lição
que 90% do seu tempo foi passado a prevenir políticas bem intencionadas
mas claramente contraproducentes, que seriam catastróficas por ignorarem
os incentivos que criam e as restrições orçamentais que enfrentam.
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Ao mesmo tempo, quem fez mais do que uma cadeira de economia descobriu
que, depois desta introdução, a maior parte do estudo é dedicado a
estudar falhas dos mercados, escolhas individuais que levam a maus
resultados no agregado, e milhares de formas através das quais as
políticas e regulações económicas são úteis e necessárias. Sempre que os
auto-designados críticos da economia, um grupo pequeno mas com uma
visibilidade desproporcionada, publica mais um artigo a repetir os
mesmos lugares-chaves de há décadas sobre as supostas falhas da economia
moderna, 99% dos economistas não se identifica com nenhuma das
generalizações que são feitas. Mas porque há uma grande população que só
fez uma cadeira de introdução à economia, as críticas parecem fazer
sentido.
Esta semana, três respeitados economistas
convencionais, Naidu, Rodrik, e Zucman, lançaram um manifesto “Economia
depois do neoliberalismo” em conjunto com uma nova organização com nome
Economistas por uma prosperidade inclusiva.
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Pessoalmente, cada um deles
tem inclinações políticas que estão muito longe do neoliberalismo, e
isto reflete-se no seu trabalho de investigação, que se tem debruçado
sobre os direitos dos trabalhadores, sobre as consequências nefastas da
globalização, e sobre a desigualdade.
O seu objetivo é transmitir ao público que só fez uma cadeira de economia, ou nem isso, ideias e políticas que podem parecer radicais por estarem no diâmetro oposto do neoliberalismo mas que resultam de aplicações convencionais da ciência económica.
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Não há governo no mundo que não use a economia para guiar as suas
políticas de forma sensata, avaliar os seus efeitos, e prevenir
disparates. Pode-se sem dúvida ser um radical neoliberal usando
princípios de economia. Mas também se pode ser um radical anti-liberal
de esquerda ou de direita sem ter de abandonar a economia tradicional e
usar fantasias não-científicas. A economia é um instrumento que se
adapta aos valores de quem o usa.
* Professor de Economia na London School of Economics
* Professor de Economia na London School of Economics
IN "DINHEIRO VIVO"
23/02/19
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