.
.
HOJE NO
"JORNAL DE NOTÍCIAS"
Conselho rejeita arquivar caso contra juiz que censurou "mulher adúltera"
Conselho Superior da Magistratura "considerou que no caso em apreciação as expressões e juízos utilizados [no acórdão] constituem infração disciplinar", revela um comunicado.
O Conselho Superior da Magistratura (CSM) decidiu rejeitar, esta
terça-feira, o projeto de arquivamento do processo disciplinar que foi
instaurado contra o juiz desembargador Joaquim Neto de Moura, em outubro
de 2017, por causa de um polémico acórdão em que o desembargador fez
referências críticas ao adultério, citando a Bíblia e o Código Penal de
1886, ao decidir um recurso num caso de violência doméstica.
Ainda em comunicado recebido do Gabinete
de Apoio ao Vice-Presidente do CSM, Mário Belo Morgado, refere-se que a
decisão do Plenário foi tomada "por oito votos a favor e sete contra".
.
.
"O
CSM considerou que no caso em apreciação as expressões e juízos
utilizados [no acórdão] constituem infração disciplinar, pelo que foi
rejeitado o projeto de arquivamento apresentado a Plenário", informou
aquele órgão de gestão e disciplina dos juízes, acrescentando que também
foi "determinada a mudança de relator [da decisão disciplinar], para
apresentação de novo projeto na próxima sessão do Plenário"
Num
segundo ponto do comunicado, o CSM assume que "ponderou que a censura
disciplinar em função do que se escreva na fundamentação de uma sentença
ou de um acórdão apenas acontece em casos excecionais, dado o princípio
da independência dos tribunais e a indispensável liberdade de
julgamento". No entanto, concluiu que aquela excecionalidade se
verificou no caso de Neto de Moura, "em virtude de as expressões em
causa serem desnecessárias e autónomas relativamente à atividade
jurisdicional".
O comunicado não
esclarece se a decisão tomada esta terça-feira diz respeito também à
situação da juíza desembargadora do Tribunal da Relação do Porto que era
adjunta de Neto de Moura e subscreveu o mesmo acórdão. A juíza Maria
Luísa Abrantes, pelo menos, também era alvo de processo disciplinar.
Por
outro lado, o Conselho não indica como vai ser distribuído o caso a
outro inspetor, nem aponta para nenhuma pena em particular. A lei prevê
sete tipos de sanções disciplinares, pela ordem de gravidade seguinte:
advertência, multa, transferência, suspensão de exercício, inatividade,
aposentação compulsiva, demissão.
Acórdão revelado pelo JN
O inquérito disciplinar tinha sido
instaurado, por despacho do vice-presidente do CSM datado de outubro de
2017, na sequência da notícia do JN que revelou o acórdão em questão e
em que, aliás, foi confirmada a condenação do arguido que estava a ser
julgado por violência doméstica.
A
defesa de Neto de Moura, a cargo do advogado Ricardo Serrano Vieira,
alegou sempre que o acórdão relatado pelo seu cliente e subscrito pela
referida juíza era tecnicamente "irrepreensível". As citações daqueles
da Bíblia e do Código Penal de 1886 serviram para contextualizar
historicamente o adultério e a violência doméstica, não refletindo um
juízo de valor de Neto de Moura, argumento então o advogado, ao JN.
Em
reação ao clamor que se levantou em diversos setores da sociedade
portuguesa contra o autor do acórdão, Ricardo Serrano acrescentou que,
até então, Neto de Moura tinha julgado 22 processos de violência
doméstica e proferido decisão condenatória em 18 deles.
A
Associação Sindical dos Juízes Portugueses também não se alheou desta
polémica, tendo o seu presidente, Manuel Soares, apontado o procedimento
disciplinar aberto pelo Conselho como sinal de uma ofensiva mais ampla e
em curso contra o princípio da independência dos juízes, porque se
propunha sindicar o conteúdo de uma decisão judicial, num exercício
reservado aos tribunais de recurso.
No
verão do ano passado, Ricardo Serrano Vieira contou ao JN que o inspetor
do CSM titular do processo disciplinar, Gabriel Catarino, já tinha
ouvido três juízes conselheiros que, na qualidade de testemunhas, tinham
afirmado que o processo disciplinar "ofendia o princípio da
independência do juiz e o próprio Estado de direito democrático".
Gabriel
Catarino é um inspetor do CSM que tem a categoria de juiz conselheiro,
estando colocado no Supremo Tribunal de Justiça desde 2011. Em tempos
mais recuados, fez várias incursões por diferentes meios policiais, sob
nomeação de governos de direita, enquanto diretor-geral adjunto da
Polícia Judiciária (1991/95), diretor nacional adjunto da PSP (2002/03) e
diretor-geral do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (2003/2005).
* O acórdão do sr. juiz Neto Moura ofende as vítimas de violência doméstica deste país.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário