25/06/2018

LUÍS MARQUES MENDES

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Marques Mendes sobre ISP: 
isto é tudo um exercício de 
demagogia e leviandade

As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre a Selecção no Mundial; o fim de Bruno de Carvalho no Sporting, o ISP e as negociações do OE, entre outros temas.

OS COMBUSTÍVEIS BAIXAM?
1. O que se passa nesta matéria é uma loucura – um exercício de completa demagogia e leviandade. De todos os agentes políticos.
 
a) Governo É o maior culpado. Prometeu que este adicional no imposto sobre os produtos petrolíferos era transitório – que só existia enquanto o preço do petróleo estivesse baixo. Pois bem. Passou de transitório a definitivo, mesmo quando o preço do petróleo subiu. O Governo falhou a palavra. Ficou-se pela demagogia.
b) Oposição CDS e PSD são outros culpados. Criam a expectativa de que com esta lei o preço dos combustíveis pode baixar este ano. Mas sabem que isso é impossível. Esta lei é inconstitucional. Viola a chamada norma travão prevista na Constituição. Logo, ou a lei não seria aprovada; ou, sendo, teria de ser vetada pelo PR ou chumbaria no TC. Numa palavra: demagogia e leviandade.
c) PCP e BE – Os últimos culpados e os últimos demagogos. Apoiaram este adicional no ISP quando aprovaram o OE e agora viabilizam a iniciativa da oposição. Tentando agradar a gregos e a troianos. Sabendo que estão a ser desleais com o Governo que apoiam, com o Orçamento que aprovaram e com a Constituição que dizem respeitar.

2.O que é que isto prova?
a) Primeiro, que estão todos em campanha eleitoral. A demagogia está à solta e a regra é o vale tudo.
b) Segundo, que é assim que os políticos perdem o respeito dos cidadãos. Toda a gente percebe que tudo isto é um exercício de "esperteza saloia".

O FIM DE BRUNO DE CARVALHO

1. Primeiro apontamento: esta Assembleia Geral (a maior de sempre na vida do Sporting) é uma grande manifestação de força e de democracia. Os sócios do Sporting foram claros, foram inequívocos, foram inteligentes e tiveram a coragem de romper.
É uma grande lição para os demagogos e os populistas. O poder está no povo.

2. Segundo apontamento: por que é que Bruno de Carvalho cai com estrondo, apesar de quase toda a gente elogiar uma boa parte da sua actuação? 
a) Porque se deslumbrou e endeusou com o poder (quis ser uma espécie de Dono disto Tudo);
b)  Porque quis o poder absoluto – controlar tudo, mandar em tudo, afrontar tudo (chegou a ter votações de 90%);
c) Porque ultrapassou todos os limites – da lei, da ética, do bom senso, da razoabilidade e da decência.
Esta é outra lição para os populistas e demagogos. Em democracia, mesmo no futebol, tem que haver regras, limites e respeito. Bruno de Carvalho não respeitou nada nem ninguém. Por isso, caiu.
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3.Finalmente, esta Assembleia Geral é um grande motivo de esperança e de aviso. Por um lado, ela é a prova de que o populismo pode ser vencido. Mas atenção! Para o futuro convém ter mais cuidado. O populismo tem um preço. E um preço elevado. Bruno de Carvalho caiu mas o Sporting vai pagar uma factura pesada. É que esta gestão vai deixar sequelas fortes.

O DIA D DA SELECÇÃO

1. Primeira nota: este é um Mundial atípico. Uma caixinha de surpresas. Uma boa parte dos favoritos tem sentido dificuldades enormes (caso do Brasil, da Argentina ou da Alemanha). Em boa verdade, ninguém pode facilitar.        

2. Segunda nota: o vídeo-árbitro tem sido importantíssimo para afirmar a verdade desportiva. Mesmo assim, tem havido falhas clamorosas da arbitragem. Erros com forte influência no resultado. É uma boa lição para Portugal. Passamos a vida, cá dentro, a queixarmo-nos dos árbitros. Afinal, na mais alta competição do futebol, repetem-se os mesmos maus exemplos.        

3. Terceira nota: para já, este Mundial vai de vento em popa para Cristiano Ronaldo. Primeiro, porque ele tem estado em grande; depois, porque os seus principais adversários à conquista da Bola de Ouro, têm estado francamente em baixo (é o caso de Messi e de Neymar).

4.  Última nota: Portugal continua fiel ao ADN de Fernando Santos – uma Selecção resultadista. Focada no resultado e não na exibição. Não é necessariamente mau. Durante anos tínhamos boas exibições e vitórias morais. Mas, apesar de tudo, podia ser um pouco melhor: podemos tentar conciliar a qualidade do resultado com a qualidade da exibição. Afinal, no meio termo está a virtude. Espera-se que ela se afirme amanhã, no jogo com o Irão.

TRAPALHADAS NO PSD

1.Mais uma semana de descoordenações no PSD. Aquilo a que antigamente se chamavam trapalhadas. A novidade é que desta vez já não são descoordenações desencadeadas pela oposição a Rui Rio. Agora, são trapalhadas entre Rio e os seus próprios apoiantes e dirigentes. Três casos em 10 dias:
 
a) Professores – David Justino a defender uma posição. Rio a defender outra. Só que Justino é vice-presidente de Rio.
b) Orçamento – Silva Peneda a defender uma coisa. Rio a defender outra. Só que Silva Peneda é do Conselho Estratégico de Rio.
c) Combustíveis – O líder parlamentar a votar de uma forma. Rio a defender outra votação. Só que Fernando Negrão é uma escolha de Rio.

2. O que é que isto revela? Três coisas: 
a) Falta de liderança. Se houvesse liderança a sério, havia coordenação. E nenhum responsável falava ou decidia sem previamente articular com Rio. Como não há liderança a sério, o PSD está em autogestão.
b) Falta de debate político. Se houvesse debate político, havia pensamento e orientação. Como não há debate, é "cada cabeça sua sentença". Uma desafinação total.
c) Tendência suicida. Quando o PS está em dificuldade e em queda nas sondagens, o PSD, em vez de aproveitar, dá tiros nos pés.

Em conclusão: um desastre. Aos olhos dos eleitores, quem não manda no partido não conseguirá mandar no governo do país. Mau para o PSD. Péssimo para o país.

3. Bloco Central?        
#  Rui Rio teima em duas outras coisas erradas: em admitir amiúde que o PSD vai perder as eleições; e em nunca fazer uma crítica a António Costa (critica o Governo mas nunca o PM). 
#  São dois erros crassos. Primeiro, porque desta forma o PSD não gera uma dinâmica de vitória; depois, porque estas atitudes legitimam as suspeitas que entre Costa e Rio passa a ideia de um futuro Bloco Central.
#  E a suspeita é mais legítima do que se pensa. Um e outro não pensam noutra coisa. Só falta saber se terão condições políticas nos respectivos partidos para imporem um Governo de Bloco Central.

AS NEGOCIAÇÕES DO OE

1. Começaram as negociações dentro da geringonça para a aprovação do próximo Orçamento. E o PR colocou pressão sobre os partidos à esquerda, dizendo que é a eles e não ao PSD que cabe aprovar o Orçamento.      
2. Nunca como este ano foi tão crispado e difícil o ambiente dentro da coligação. Mesmo assim, é do interesse de todos que o OE passe e não haja crise política 

a)É do interesse do PCP e do BE – Ambos têm medo de serem penalizados por provocarem uma crise e de beneficiarem o PS, que rapidamente se vitimizaria. Não querem repetir o erro de 2011.
b)É também do interesse do PS evitar uma crise:
# Primeiro: abrir uma crise significaria que a geringonça falhou. Seria uma derrota para o PS que a criou e a pôs de pé;           
# Segundo: mesmo que o PS se fizesse de vítima, não haveria nenhuma garantia de que obtivesse uma maioria absoluta, face à queda nas sondagens;          
# Finalmente: não tendo maioria absoluta, não poderia repetir, a seguir às eleições, a solução política que antes falhou.

A CANDIDATURA DE ANTÓNIO VITORINO

1. É já no próximo dia 29 (6ª feira) que ocorre a eleição do novo Director-Geral da Organização Internacional das Migrações, um organismo no âmbito das Nações Unidas. Uma eleição com três candidatos, um dos quais António Vitorino.
       
2. O que dizer desta candidatura? 
a) Primeiro: é mais uma excelente iniciativa de Portugal. Ousar propor portugueses para altos cargos internacionais é sempre uma boa aposta;
b) Segundo: é uma excelente candidatura. António Vitorino é um excelente candidato. Além das suas qualidades pessoais, políticas e profissionais, António Vitorino tem, nesta área, uma bela experiência que adquiriu, designadamente, quando foi Comissário Europeu, onde desenvolveu um trabalho notável;
c) Terceiro: esta eleição é um desafio difícil. Basta pensar que um dos seus adversários é um norte-americano. E até hoje, em nove das escolhas para directores-gerais da Organização, oito foram dirigentes dos Estados Unidos da América. Mesmo assim, há sobretudo quatro razões que reforçam as probabilidades da eleição de António Vitorino.
Primeiro, um fortíssimo apoio na UE e em África;
# Segundo, as atitudes de Trump, que desajudam o candidato americano e indirectamente favorecem Vitorino;
# Terceiro, o trabalho notável da diplomacia portuguesa;          # E, the last but not the least, a qualidade e o prestígio do nosso candidato. 

A EUROPA E AS MIGRAÇÕES

1.  Nos EUA, Trump separa pais e filhos; a Itália recusa-se a acolher barcos com refugiados em risco; risco; na Hungria, o Governo quer punir criminalmente quem ajude os imigrantes; na Alemanha, a coligação corre o risco de quebrar por causa das divisões sobre imigração. Hoje tivemos uma mini-cimeira europeia por causa da imigração. 
       
2. O que dizer de tudo isto? 
a) Do ponto de vista humanitário, tudo isto é deplorável. O que sucede nos EUA e na UE é um retrocesso da civilização. É o regresso à barbárie. O mundo ocidental é tão moderno na tecnologia (no Facebook, no Twitter, na Indústria 4.0) e depois é tão arcaico nos princípios e valores.
b) Do ponto de vista político, tudo isto é perigosíssimo. É o maior ataque à democracia e ao Estado de Direito que se conhece nas últimas décadas.
# Porquê? Porque este é o campo em que florescem os ditadores e populistas e em que se afundam os moderados de centro-esquerda e de centro-direita;
# Porque o discurso anti-imigração dá votos; e porque os eleitores são muito permeáveis à exploração do medo, da insegurança e da chantagem; 
c)Do ponto de vista europeu, a imigração é uma espécie de Cavalo de Troia:
 # Primeiro: a mesma Europa que faz o grande projecto do Euro não é capaz de se entender para acolher imigrantes que, no máximo, representam 1% da população europeia; 
# Segundo: a mesma Europa que tanto apregoa a solidariedade quando se trata de distribuir fundos estruturais não é capaz de ser solidária quando se fala de integrar pessoas.        
Finalmente: porque a UE, em vez de fazer pedagogia, deixa que os seus adversários façam demagogia. O discurso da pedagogia essencial é este: a Europa precisa de mais população; a economia europeia precisa de mais mão-de-obra; a segurança social dos países europeus precisa de mais receita; a imigração não é sinal de insegurança. Ou seja: uma política inteligente de portas abertas concilia a cultura dos valores com a lógica dos interesses europeus. 

IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
24/06/18


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