13/06/2018

ANTÓNIO VENTINHAS

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Os “congelamentos”

"Esta matéria não se resume a uma única classe profissional, mas o Governo tem de encontrar uma solução global que permita a recuperação do tempo perdido para todos aqueles que exercem funções públicas e ficaram sem progredir durante cerca de uma década."

Na última semana, as negociações entre os sindicatos dos professores e o Ministério da Educação ocuparam parte das notícias.

O debate no Parlamento com o Governo centrou-se muito nesta questão e o Primeiro-Ministro afirmou que não existe dinheiro para satisfazer as reivindicações dos professores.

Antes de avançarmos, convém ver se a reclamação é justa e razoável.

Na última década e meia os aumentos dos salários de quem exerce funções públicas foram praticamente inexistentes, durante um período os seus vencimentos sofreram "cortes", viram-se privados de subsídios de férias e Natal e o tempo de progressão na carreira ficou "congelado".

O actual Governo reconheceu que esta realidade foi injusta, razão pela qual iniciou uma politica de reposição de rendimentos nos salários ( eliminou os cortes nos vencimentos existentes), bem como iniciou o descongelamento da contagem de tempo para o futuro.

O Governo também já reconheceu que deve ser contabilizado o tempo de serviço passado, não reconhecido até agora, para efeitos de progressão na carreira, tendo efectuado recentemente uma proposta de recuperação parcial.

A não contabilização do tempo de serviço passado para efeitos de progressão implica que quem entrou este ano esteja no mesmo patamar que aqueles que já exercem funções há cerca de uma década. Tal situação é manifestamente injusta e desigual.         

Se alguém começar a trabalhar numa empresa privada e assinar um contrato em como receberá um salário mais elevado passados 4 anos, se chegar a esse momento e a entidade patronal não o aumentar, verifica-se um incumprimento do contrato de trabalho que poderá ser efectivado junto de um tribunal de trabalho.

O raciocínio tem de ser o mesmo no sector público, pois quem é admitido através de um concurso público tem de saber qual o plano de carreira com que conta e não ver frustradas as suas expectativas recorrentemente. A tutela da confiança assim o impõe.

Quem escolhe entre uma carreira no sector público ou privado tem de conhecer e confiar nas regras do jogo.

No sector público, o Estado é simultaneamente entidade empregadora e define as regras, ou seja, assume-se simultaneamente como jogador e árbitro que vai mudando as regras de acordo com as suas conveniências, o que leva ao seu descrédito.

Hoje em dia poucos dirão que o Estado é uma pessoa de bem.
A contagem do tempo integral de serviço é uma questão de inegável justiça para os professores e restantes profissões públicas.

Esta matéria não se resume a uma única classe profissional, mas o Governo tem de encontrar uma solução global que permita a recuperação do tempo perdido para todos aqueles que exercem funções públicas e ficaram sem progredir durante cerca de uma década.

O Primeiro-Ministro refere que o orçamento de 2019 não possibilita uma recuperação imediata da contagem de todo o tempo de serviço, mas permite acomodar uma parte, o que é positivo.
Numa óptica de crescimento económico para os próximos anos, o que o Governo tem de fazer é um plano de recuperação a médio prazo, diluindo os acréscimos de despesa no tempo.

Caso contrário, este Governo assumirá que concorda com as medidas do anterior executivo, o que sempre negou.

Já passaram alguns anos desde a saída da Troika de Portugal.

No entanto, ainda se continua a lutar para recuperar o que foi perdido. O combate é apenas para tornar efectivas as carreiras que estão consagradas na Lei.

Se a legislação dispõe que alguém com 20 anos de serviço deve estar num determinado escalão, porque é que está 3 ou 4 escalões abaixo?

No ano passado a direcção do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público confrontou a Senhora Ministra da Justiça com os efeitos nefastos do congelamento do tempo de serviço e as distorções que isso tem causado nas carreiras.

Nessa altura, foi-nos transmitido que a solução teria de ser enquadrada de acordo com a política geral do Governo relativamente a este assunto.

O Orçamento de Estado é o momento próprio para o Governo tomar posição sobre o que pensa relativamente ao tempo de serviço não contabilizado. Nessa altura ficaremos a saber se relativamente a este assunto a posição do governo do Dr. António Costa é diferente do Dr. Passos Coelho.           

 IN "SÁBADO"
12/06/18


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