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* Médico Pediatra
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01/05/18
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1.º de Maio
– trabalhadores e crianças
A exploração do trabalho infantil – errada e
criminosa – não impede que as crianças e, sobretudo, os adolescentes não
possam fazer certos trabalhos remunerados, embora apenas nas suas horas
livres, nas férias e aos fins de semana
Celebra-se hoje o 1.o de Maio, Dia Internacional dos
Trabalhadores, comemorativo das manifestações de trabalhadores de
Chicago em 1886, em prol de melhores condições de trabalho, brutalmente
reprimidas pelas autoridades. Durante muitos anos foi uma data proibida,
depois demasiado conotada com certos setores políticos e, finalmente,
um dia que cada um celebra como quer, sem preconceitos e sem se sentir
pressionado, ou seja, com o descanso merecido para quem passa grande
parte da vida a trabalhar.
Os pais trabalhadores O que tem o 1.o de Maio a ver com as crianças?
Muito! Em primeiro lugar, todas ou quase todas as crianças e
adolescentes são filhas de trabalhadores ativos, seja intelectuais ou
manuais, rurais, da indústria ou de serviços. Atualmente, em Portugal,
não apenas os pais, mas também as mães trabalham – o nosso país é um dos
que têm a taxa mais elevada de mulheres em idade fértil com trabalho
fora de casa –, e as implicações deste facto são grandes, tendo levado a
enormes transformações no dia-a-dia das crianças. Todos damos por isso,
mas não será hoje o motivo desta “conversa”.
O trabalho dos pais é uma forma de a criança poder beneficiar de
maiores condições para o bem-estar e é bom pensar nos proventos dos pais
e na significativa percentagem que deles se destina às crianças.
Provavelmente, alguns gastos serão exagerados e alguns bens supérfluos
ou fúteis, inadequados, caros ou desnecessários. No entanto, é do
orçamento dos pais e do fruto do seu trabalho que vem a alimentação, o
vestuário, o conforto, os brinquedos, os infantários e amas, livros e
materiais escolares, a prática de atividades de lazer, etc., etc. E os
vários indicadores (económicos, de saúde, de educação) revelam que as
crianças portuguesas têm, sem margem para dúvidas, muito mais bem-estar
do que tinham há alguns anos.
Vale a pena mencionar também os descontos que são feitos sobre os
rendimentos do trabalho e que permitem ao Estado proporcionar, através
dos impostos e do próprio trabalho de centenas de milhares de pessoas,
serviços vários – saúde, educação, etc. – que vão beneficiar a criança,
independentemente da opinião que tenhamos sobre o modo como esse
orçamento é planeado e gerido e sobre a qualidade dos referidos
serviços.
Trabalhos em casa e de colaboração com a família – um bom meio de
aprender a vida Os trabalhos em casa, que ajudam à construção e
manutenção da vida familiar, são indispensáveis. É muito pedagógico que
as crianças e jovens se habituem a ajudar os pais, através de pequenos
trabalhos desde que adequados ao seu desenvolvimento físico e às suas
capacidades, não apenas em força, mas em destreza e compreensão, e não
pensem que tudo lhes é devido, quais reizinhos sentados no sofá a
teclar.
Arrumar o quarto, pôr e levantar a mesa, lavar a loiça, aspirar e
limpar a casa, ou ajudar os pais nas fazendas, no cultivo ou a tratar
dos animais – estas e outras são tarefas que as crianças e adolescentes
deverão habituar-se a fazer, quer porque é da mais elementar justiça (se
os pais não devem escravizar os filhos, a verdade é que eles trabalham e
não podem ser eles próprios escravos dos filhos), quer porque aumenta o
sentido de responsabilidade e maturidade e cria uma atmosfera de
respeito e colaboração em objetivos comuns. Ou seja, faz parte da
aprendizagem da vida e da preparação para a vivência democrática e
participativa e da exercitação da sua própria autonomia, atual e futura.
Pequenos trabalhos remunerados A exploração do trabalho infantil –
errada e criminosa – não impede que as crianças e, sobretudo, os
adolescentes não possam fazer certos trabalhos remunerados, embora
apenas nas suas horas livres, nas férias e aos fins de semana, com a sua
concordância e adequados às suas possibilidades e capacidades, desde
que não prejudiquem também o estudo e as suas outras atividades.
Para lá dos trabalhos de ajuda no dia--a-dia da casa já referidos, há
por vezes pequenos trabalhos (lavar o carro, pintar paredes, passar
textos no computador, tratar dos animais, passear o cão, etc.) que podem
ser vistos como extras e, como tal, se forem bem executados, deverão
até ser merecedores de uma recompensa (sem exageros) à qual a criança ou
o adolescente darão destino (com supervisão dos pais, claro, mas com
uma grande liberdade de opção).
É, pois, fundamental entender a necessidade do trabalho como meio de
poder usufruir de alguns bens materiais e de-senvolver simultaneamente o
gosto pelo trabalho como meio de satisfação e mesmo de entretenimento. A
esmagadora maioria das crianças e dos adolescentes virão, mais cedo ou
mais tarde, a ser parte da classe trabalhadora, seja em trabalhos mais
intelectuais, seja em trabalhos mais manuais. Todos os empregos, porque
honestos, merecem respeito e são parte da organização da comunidade a
que todos pertencemos e de que todos necessitamos. Entender o trabalho
de cada um como uma peça do puzzle social é indispensável para a
aprendizagem da vida... e para que, afinal, o 1.o de Maio tenha algum
significado na vida de cada um e da sociedade, para além de eventuais
leituras políticas ou partidárias, que são importantes na manifestação
social mas não devem ser entendidas como a expressão única da dinâmica
dos cidadãos.
Bom feriado, bom trabalho para quem tem de trabalhar, e nunca
esqueçamos as origens deste 1.o de Maio e como é obrigação de todos
dignificar o trabalho e a sua prática, como elevação pessoal, social e
civilizacional.
P. S. Seria muito útil, quando possível, os pais levarem as crianças a
visitar o seu trabalho e falarem dele, bem como da relação que existe
entre trabalhar, ser útil, ter sustento e o nível de vida e poder de
compra que têm. A maioria das crianças, estou convencido, não entende
nada desta relação, sobretudo quando quase tudo lhes aparece como
evidente e sem esforço” – nos tempos atuais, é bom relacionar o trabalho
com o resto da vida, e também as crianças entenderem melhor que os pais
não vão sempre trabalhar com um sorriso na cara e que têm dias em que
chegam a casa e, por causa do cansaço do trabalho, só lhes apeteceria
emigrar para uma ilha deserta.
* Médico Pediatra
IN "i"
01/05/18
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