ESTA SEMANA NA
"VISÃO"
Descubra a igreja portuguesa
anti-papa Francisco
As missas em latim regressaram e revelam o movimento conservador que está a crescer no País. Atraem jovens fiéis e sacerdotes que aprendem o ritual em segredo. Um desafio ao estilo do Papa Francisco.
Quase todas jovens, na casa dos 20 anos, as raparigas tiram
da carteira um lenço branco bordado e cobrem a cabeça. Ao final da tarde
daquela sexta-feira, 12 de janeiro, o grupo alinha-se na Igreja de
Nossa Sra. da Conceição Velha, em Lisboa. Sentam-se nos bancos castanhos
corridos e preparam-se para assistir a uma missa à antiga, celebrada em
latim, seguindo os rituais tradicionais e rigorosos.
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No
altar, de costas para os fiéis, o padre Hugo Santos, 41 anos, comanda o
rito, enquanto os presentes, rapazes e raparigas, rezam de dedos
entrelaçados. Predomina um silêncio intenso, só por vezes interrompido
por um sussurrar, em latim, em resposta às orações do sacerdote. Na mão,
seguram o pequeno livro de capa preta, um missal para os ajudar a
seguir a cerimónia. O ambiente é pesado, solene, apesar das cores vivas
que decoram o altar e das vestes alegres do padre que usa uma casula
romana, indumentária obrigatória para esta missa antiga. Aqui não se
descuida o tom cerimonial – em contraste com a imagem modesta do Papa
Francisco.
Conhecida como tridentina (desde o Concílio de Trento, no
século XVI) ou missa do rito romano na sua forma extraordinária, esta
não é uma eucaristia comum e pacífica entre os católicos. Mas, desde há
cinco meses, ela realiza-se todos os dias, exceto ao domingo, na
paróquia de São Nicolau, em Lisboa. Foi a resposta da Igreja Católica
nacional à adesão, cada vez maior, dos portugueses a esta missa dos
velhos tempos, abandonada depois do Concílio Vaticano II (1962-1965). E
esta foi também uma forma de evitar que muitos fiéis passassem a
frequentar os oratórios da Fraternidade São Pio X, uma organização
ultraconservadora que tem tido alguns conflitos com o Vaticano – mas
que, por celebrar a eucaristia desta forma, está a cativar muitos
católicos.
“A maneira de fazer missa é a parte visível
da diferença doutrinal que existe”, admite o padre Samuel Bon, 45 anos –
que há dois anos lidera a Fraternidade em Portugal –, considerando que
os católicos adeptos do ritual antigo defendem a tradição e não gostam
das mudanças que o Vaticano está a impor. “Quem defende esta missa deve
necessariamente opor-se também às mudanças do Concílio Vaticano II, pois
foi aí que se criou a missa nova”, diz, não disfarçando o incómodo com o
estilo progressista do Papa Francisco. “Quando se quer agradar a toda a
gente, acaba-se por não se agradar a ninguém.”
No
último ano, garante, a quantidade de portugueses a procurar a
Fraternidade aumentou de tal forma que a organização teve de começar a
realizar três missas ao domingo, duas em Lisboa e uma em Fátima, além
das cerimónias diárias. E prepara-se para abrir uma nova igreja, em
Marvila, com 200 lugares.
Um culto ainda a medo
Pedro Froes, 21 anos, estudante da Universidade Católica,
costuma ir às missas nas igrejas da diocese de Lisboa, tanto às comuns
como às tradicionais, em São Nicolau, mas por vezes assiste também às da
Fraternidade. Não aprecia que lhe chamem conservador, prefere o termo
tradicionalista, e não esconde a satisfação ao observar que “todos os
dias estão a aparecer pessoas novas na missa em latim”.
Vasco
Câmara, 22 anos, começou a frequentar esta cerimónia, em São Nicolau,
há apenas quatro meses. “Tem mais espiritualidade”, diz o jovem, que se
tornou presença assídua. “Tento ir todos os dias”. Por isso, na
segunda-feira, 15 de janeiro, era de novo um dos fiéis que ao final da
tarde rezava em latim. Costuma estar rodeado de colegas da mesma idade,
algumas raparigas com véus na cabeça – um acessório usado pela ala
conservadora, branco para as solteiras, escuro para as casadas. Num dos
bancos, nessa segunda-feira, estava também Manuel, com pouco mais de 20
anos, que é acólito nas cerimónias. Quase todos têm receio de falar.
“Não tenho medo da Igreja, porque perseguidos já nós somos; tenho é medo
da reação das pessoas”, justifica outro estudante.
Esta
missa não é do agrado dos bispos, mas está a ganhar popularidade desde
que, em 2007, o Papa Bento XVI esclareceu que nunca esteve proibida,
como alguns julgavam. E agora há crentes a apresentar pedidos em várias
dioceses – o médico de família Francisco Lopes Vilaça, 29 anos, chegou a
lançar uma petição pública a solicitar ao Cardeal-Patriarca que a
autorizasse na Sé de Lisboa.
Ao mesmo tempo, está “a
crescer o número de sacerdotes, especialmente os mais novos, a aprender o
rito às escondidas e a celebrar missas”, explica um padre que a costuma
rezar.
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Para muitos, o sucesso desta liturgia é sinal do
crescimento do movimento conservador. A maioria dos que a frequentam e
celebram são defensores da tradição na eucaristia e na postura da
Igreja, confirma Paulo Mendes Pinto, professor de Ciência das Religiões
(ver entrevista). Muitos assumem que certas decisões do Papa Francisco
estão a aumentar o desconforto – como a que abre a porta à comunhão dos
recasados e que neste mês levou o arcebispo de Braga, D. Jorge Ortiga, a
publicar um documento com os requisitos para que os casais possam ser
acolhidos na diocese.
“Se, até hoje, 265 papas disseram
uma coisa e se um Papa diz outra, prefiro estar com os 265. Há aqui uma
contradição”, afirma Pedro Froes, ressalvando que, apesar disso, ama e
reza pelo atual sumo pontífice. Tal como Froes, os jovens que frequentam
as missas em latim admitem que o Papa Francisco lançou “confusão” e
“ambiguidade” na Igreja quanto à comunhão dos que são casados pela
segunda vez (ou mais). Mas, para eles, não há dúvidas: os recasados não
podem comungar. “A maioria das pessoas que participa na missa antiga
move-se em meios religiosos que olham para o Papa Francisco com muita
desconfiança”, adianta Mendes Pinto.
Movimento em crescendo
Pelo mundo, o fenómeno repete-se: no Brasil, este movimento
começou a surgir um pouco por todo o país, notou há já três anos uma
reportagem do jornal O Globo; e no Reino Unido, segundo a Sociedade pela
Missa em Latim de Inglaterra e Gales, o número de liturgias
tradicionais disparou, passando de 26 em 2007 para 157 em 2012. A
revista The Economist, numa reportagem sobre o movimento conservador,
relatou como este fenómeno estava a atrair jovens tradicionalistas
ativos nas redes sociais e em blogues. “É impressionante este movimento.
Em Cracóvia [Polónia], fui a uma missa destas ao domingo; cheguei
15
minutos e já não tinha um lugar sentado. Em Roma, a igreja também estava
cheia”, descreve Pedro Froes.
Todos rejeitam ser
anti-Papa Francisco, mas vão dando sinais claros de discordância. Pedro
Froes, por exemplo, assume que admira Raymond Burke, o cardeal dos EUA,
conhecido em todo o mundo como um dos principais opositores do atual
Papa. Foi um dos quatro cardeais que escreveram a dubia, uma carta em
que pedem ao sumo pontífice que esclareça a questão da comunhão dos
recasados.
Quando o cardeal veio a Portugal, em novembro
de 2017, foi recebido com entusiasmo pelos meios conservadores. Azeredo
Lopes, 64 anos, um católico de Coimbra responsável pela editora
Caminhos Romanos, que editou o livro do cardeal, foi um dos que o
acompanhou de perto. Seguidor das ideias de Burke, Azeredo apresentou
recentemente, com um conjunto de católicos da diocese de Coimbra, um
pedido ao bispo Virgílio Antunes, para que possam ter uma missa em
latim. “Não é obrigatório pedir autorização. Fizemo-lo por uma questão
de zelo, mas ainda estamos à espera”, conta, assegurando que há uma
clara resistência dos bispos. “É inexplicável, pois foi assim que a
missa se celebrou ao longo de dois mil anos”, lamenta.
“Houve
um grande mal-estar dos bispos em relação à vinda desse cardeal”, diz,
por seu lado, Eduardo Almeida, um jovem de 20 anos ultraconservador e
antigo seminarista, que começou a frequentar a Fraternidade e que é um
dos elementos mais ativos nas críticas ao Papa no meio católico. “Quer
agradar mais à sociedade moderna do que aos católicos”, refere o jovem,
contando que, quando estava no seminário em 2015, já ia com um colega,
“às escondidas, a uma missa antiga”. Hoje em dia, revela, costuma
participar num grupo que está secretamente a ensinar alguns seminaristas
do Porto e de Braga a celebrar missa em latim. “Nos seminários não se
fala desse ritual”, nota, explicando que o aprendeu quando esteve uns
tempos em França e em Itália, no Instituto Cristo Rei. “Por isso, fui
acólito do cardeal Burke na missa em latim que ele celebrou na Igreja de
Nossa Senhora da Ajuda, na Foz do Porto.”
Sinais por todo o País
Todo este movimento, que passa pelas missas em latim,
críticas às posições mais modernas do Papa e apoio a religiosos como o
Burke, não agrada à hierarquia da Igreja em Portugal, que através dos
bispos tem dado alguns avisos subtis a vários sacerdotes, conta um
pároco conservador. Apesar disso, alguns padres diocesanos decidiram dar
a cara e estiveram ao lado de Burke, em Fátima, quando ele passeou pelo
Santuário com um manto vermelho
de 15 metros. Entre eles estava um
sacerdote da diocese de Coimbra, Manuel Vaz Pato,
de 29 anos, e outro
de Aveiro, Hélder Ruivo, de 31 anos. Usavam barrete preto, acessório
apreciado pelos mais tradicionalistas.
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“Sim, fui a
Fátima vê-lo”, confirma Manuel Vaz Pato, admitindo que gosta de usar
“vestes antigas”, como fez na sua ordenação, em que foi de capa e
batina. E também na primeira missa que celebrou, em que chegou com um
capelo – um chapéu preto – e usou incenso durante a cerimónia. Para ele,
ao contrário de muitos outros padres e bispos, fez todo o sentido Burke
andar a passear pelo Santuário com um manto vermelho. “É uma tradição. O
Papa João
Paulo II, enquanto cardeal, também o usou”. Manuel Vaz Pato
não se incomoda de ser visto como conservador. “Eu e muitos padres da
minha geração temos como referência papas como João Paulo II e Bento
XVI, que são muito sólidos”, diz. E Francisco? Manuel Vaz Pato responde
assim: “Este Papa é muito diferente.”
A forma de vestir é
uma maneira de transmitir essa ideia. São vários os padres que, mesmo
nas missas normais que celebram, fazem questão de usar algo que os
associe a esta forma mais conservadora de estar. No dia em que um padre
de Aveiro celebrou a sua primeira missa, vários colegas apareceram com
trajes mais tradicionalistas. Foi o caso de João Vergamota, da paróquia
da Encarnação, em Mafra, que envergou uma sobrepeliz, um manto rendado,
hoje em desuso, e dos sacerdotes Diogo Correia, pároco em Peniche, e
Paulo Pires, da Azambuja, que se apresentaram de batina, marcando a
diferença para os colegas modernistas que se vestem à civil e usam
gravata.
Todos estão a aprender ou aprenderam a celebrar
em latim. Vaz Pato, assim como outros sacerdotes da mesma geração, já
foi dar a missa à Igreja de São Nicolau, em Lisboa. E, há um ano,
liderou uma cerimónia em latim na Igreja de São Vicente de Fora, também
na capital, a convite de um grupo de fiéis, monárquicos, que quiseram
homenagear D. Miguel nos 150 anos da sua morte. “A missa antiga remete
para o sagrado e não a torna profana, ou seja, comum e vulgar”, defende,
garantindo que também sente um crescimento dos conservadores entre os
jovens padres. “Há, pelo menos, quatro seminaristas portugueses – dois
deles de Coimbra e os outros de Lisboa – que decidiram ir para o
estrangeiro para seminários tradicionais”, onde aprendem o ritual
antigo.
O padre admite que esta missa é a face visível
do crescimento dos defensores de uma igreja mais tradicional e deixa um
recado: só razões de ordem ideológica fazem perseguir diferentes formas
de estar na Igreja, não compreendendo a falta de resposta da Igreja
portuguesa. “Os fiéis que querem esse tipo de eucaristia deviam ter esse
direito.” O mesmo pensa o padre Hélder Ruivo, da diocese de Aveiro. Tem
31 anos e conta que, muitas vezes, celebra missa antiga para si
próprio. São dois dos padres mais conservadores da Igreja e integram um
grupo que se costuma reunir às segundas-feiras, dia de folga dos
sacerdotes. “Partilhamos as mesmas preocupações”, conta outro padre
diocesano, que pede anonimato por ter receio.
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Quando se
juntam, conversam sobre a importância desta missa em latim, das ameaças à
doutrina e da falta de formação tradicional dos seminários nacionais.
Foi essa questão que levou o seminarista Lourenço Ribeiro e Castro a ir
para Itália. “Ele identifica-se com outra forma de estar na Igreja”,
conta a mãe. Leonor Ribeiro e Castro, 63 anos, conheceu a missa
tridentina no ano passado através do filho e, desde então, aproximou-se
da Fraternidade São Pio X. Em sua casa, em Fátima, tem uma capela, onde,
conta, costumam ir, em segredo, muitos sacerdotes celebrar esta missa.
“Agora até vou mudar o altar para que o padre possa dar a missa de
costas.”
A Igreja dividida
Para os progressistas, celebrar a
eucaristia desta forma é “virar as costas ao mundo”. Para os
tradicionalistas, significa a “verdadeira forma de tornar Jesus Cristo o
protagonista da celebração”, defende um sacerdote de Lisboa que se revê
neste movimento conservador, mas que prefere ficar à parte por
considerar que a tensão entre os padres está a aumentar.
“O ambiente
dentro da Igreja está a ficar tenso, resultado do extremar de posições”,
diz, notando que, alguns padres, sabendo do mal-estar que a visita de
Burke causou aos bispos, surgiram ao seu lado, com trajes ortodoxos, ao
mesmo tempo que os liberais não pouparam críticas públicas ao cardeal.
Foi o que fez o Bispo das Forças Armadas, Manuel Linda. Num texto de
opinião publicado na revista da Agência Ecclesia, e ao falar da missa
velha dada por Burke no Santuário, o bispo referiu-se a “pavões de cauda
armada” que têm “gestos barrocos e bacocos”, que praticam “rituais mais
esotéricos” e que usam “indumentária de circo, composta por capas
magnas estapafúrdias”. E ainda, referindo-se aos que gostam da missa
tridentina, falou de “latins e latinórios, rendinhas e rendilhados,
vénias e salamaleques.”
“Neste momento, há uma divisão clara”, acrescenta outro sacerdote,
também conservador, de uma diocese no Centro/Sul do País. Jovem,
aprendeu a missa velha no YouTube. É assim que muitos se instruem. Não
aceitam que se esteja a banalizar a religião, como dizem. “Não faz
sentido que hoje em dia se cantem os Parabéns a Você na missa, que os
noivos vão para o altar ou que os leigos façam as leituras”, considera o
padre, dizendo que isso significa “não cumprir as leis” da Santa Sé.
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Todos
os que praticam o ritual antigo consideram estar “a respeitar” a
tradição e as normas, mas receiam assumi-lo e, por isso, fazem-no
discretamente – com exceção do padre Geraldo Morujão, de 87 anos, da
diocese de Viseu, que todas as semanas a celebra para um grupo restrito
de fiéis. “Eles pediram ao bispo, mas, como não obtiveram resposta, eu
acabei por ajudar”, conta, explicando que, como não está colocado em
nenhuma paróquia (é assistente regional do Corpo Nacional de Escutas),
celebra na capela, em Viseu, a que pertence o seu irmão José, de 79
anos.
"Ele nem pode ver isso. Não entende como é que se pode
querer dar a missa em latim. Mas como sou o irmão mais velho, não me diz
que não”, esclarece Morujão, garantindo que o ritual antigo dá um
sentido “mais sagrado, transcendente e divino” ao momento, estando a
conquistar muitos sacerdotes. “Ainda recentemente esteve cá um padre
Fernando António, de Lisboa que me ajudou na missa”.
Ultraconservadores
De norte a sul do País, há cerimónias
destas, mas a maioria tem lugar em capelas privadas e em locais
discretos. A Igreja de São Nicolau é a única que as disponibiliza
diariamente. São, em regra, celebradas pelo padre Hugo Santos, que foi
capelão da Universidade Católica, mas de onde saiu em junho de 2017,
tendo o Cardeal- -Patriarca substituído-o por Miguel Vasconcelos, um
padre mais progressista. Agora, Hugo dedica-se a liderar estas missas.
Tudo começou depois de, em 2014, “várias dezenas de leigos cristãos”
terem entregado uma petição para que “se passasse a celebrar a Missa do
Rito Romano na Forma Extraordinária”, explica Mário Pedras, responsável
da paróquia de São Nicolau.
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Em 2015, depois de autorizado pelo
Cardeal-Patriarca, D. Manuel Clemente, o ritual foi disponibilizado aos
sábados. A afluência levou a que, pouco depois, já se celebrasse três
vezes por semana. Agora, em setembro de 2017, passou a ser diária, menos
ao domingo – o dia de missa mais importante para os católicos. Apesar
disso, quando a VISÃO pediu para fazer uma reportagem, Mário Pedras
respondeu: “Não tenho interesse em divulgar isso.”
“Foi uma forma
de tentar esvaziar a Fraternidade São Pio X que começou a ficar cada
vez mais cheia”, considera Ludgero Bernardes, 60 anos. Este escrivão do
Tribunal da Relação de Lisboa passou anos a frequentar missas modernas e
chegou a ser catequista. “Mas, depois, quando estudei teologia,
descobri a verdade”, afirma, pondo até em causa a popularidade do Papa
Francisco. “Agora na visita ao Chile viu-se que não é assim tão amado
pelo povo”, alega, explicando que se estava “à espera de 400 mil fieis e
só apareceram 80 mil”.
No domingo, dia 21 janeiro, Ludgero
chegou, bem-arranjado e com o seu missal em latim debaixo do braço, à
sede da Fraternidade São Pio X em Lisboa, numa moradia na estrada de
Chelas, junto à Penha de França. Enquanto a missa não começava, esteve a
conversar com outros membros da organização. Conhecem-se todos, ou
quase. Na hora da missa, entram e os que cabem sentam-se numa das 15
filas do pequeno oratório de paredes amarelas e tetos brancos
trabalhados. Os outros ficam espalhados pelo corredor. Há mulheres,
jovens e crianças de lenço na cabeça. Alguns homens estão de fato, como
Duarte Machado, 20 anos. “Vou assim para os sítios solenes”, conta.
A
ouvir a homilia do padre Samuel, que compara os leprosos aos pecadores,
está, entre outros, um jovem casal: Diogo, 32 anos, e Sara, 22, que
espera um filho. Casaram-se em maio de 2017, na Igreja de São Nicolau,
com uma missa antiga. “Mas o padre que ia casar-nos desistiu dois meses
antes.” Então, eles tiveram de pagar a um religioso para vir de Londres.
São conservadores. Não gostam das missas desleixadas, dizem.
Maria
de Lurdes, uma angolana de 38 anos, que está em Portugal a tirar o
mestrado em técnicas laboratoriais, explica que, quando descobriu, pela
internet, que este tipo de missa existia, ela sentiu-se “traída pela
Igreja”. Sobre o Papa Francisco, resume o pensamento de quase todos os
que se movem neste meio ultraconservador: “Prefiro não dizer nada, para
não pecar.”
* A teia emaranhada da tarântula.
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