Indicadores de desigualdade
e de pobreza em Portugal:um
IN "PÚBLICO"
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pequeno passo na direcção certa
A publicação recente pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) dos
principais indicadores de desigualdade, pobreza e exclusão social para o
período 2016/17 permite uma leitura actualizada sobre a evolução das
condições de vida da população e a identificação de alguns dos
principais factores de vulnerabilidade social no nosso país.
É importante começar por identificar claramente o período de
referência dos dados agora publicados pelo INE. Estes dados foram
obtidos a partir do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento
realizado em 2017, que incidiu sobre os rendimentos auferidos em 2016.
Consequentemente, os indicadores de pobreza e desigualdade apresentados
reflectem o nível e a distribuição dos rendimentos em 2016. No entanto,
os índices de privação material têm como base o próprio ano do
inquérito, isto é, 2017.
Saliente-se que, nos últimos anos, o INE
tem desenvolvido um esforço considerável para que estes resultados,
ainda que provisórios, sejam divulgados no próprio ano em que o
inquérito se realiza. Trata-se de um contributo importante do INE para
dotar as políticas públicas de instrumentos de análise mais
actualizados, que deverão permitir a elaboração e implementação de
medidas mais eficazes na redução da pobreza, da exclusão social e da
desigualdade.
Os dados agora publicados confirmam o ciclo descendente da
generalidade dos indicadores de pobreza e desigualdade iniciada em 2014,
que inverteu o seu forte incremento no período mais severo da crise
económica e das políticas de austeridade. No entanto, muitos dos
indicadores de pobreza ainda se encontram aquém dos seus valores
pré-crise. Por exemplo, em 2016, a taxa de pobreza do conjunto da
população teve uma diminuição significativa de 0,7 pontos percentuais
face a 2015, fixando-se em 18,3%, mas ficou ainda acima do seu valor de
17,9% em 2008/09.
Estes
novos dados apresentam, porém, alguns indicadores muito positivos que, a
manterem-se nos próximos anos, permitirão uma alteração significativa
nos principais indicadores sociais e nas condições de vida das famílias.
São de destacar:
- A redução. em 2016, da taxa de pobreza das crianças e dos jovens em 1,7 pontos percentuais, atingindo o seu valor mais baixo, 20,7%, desde 2003, o ano inicial da presente série do INE;
- O índice de Gini, apesar de uma redução menos expressiva, atingiu em 2016, 33,5%, que é igualmente o seu valor mais baixo desde 2003;
- A diminuição de 1,5 pontos percentuais na taxa de privação material severa, que teve também em 2017 o seu valor mais baixo (6,9%) desde que é publicada;
- A taxa de pobreza dos idosos, que tinha aumentado em 2014 e 2015, retomou o seu ciclo descendente fixando-se em 17,0% em 2016.
Não
é ainda possível identificar rigorosamente os principais determinantes
destas alterações. Porém, não lhes serão certamente alheios a
recuperação económica e a diminuição do desemprego, as políticas de
reposição dos rendimentos familiares e, em particular, dos das famílias
de menores rendimentos, e o reforço das políticas sociais de combate à
pobreza, as quais tinham sido muito enfraquecidas durante o período de
crise e das políticas de austeridade.
Mesmo sendo muito
encorajadores quanto à tendência e às dinâmicas ocorridas nas condições
de vida da população, os resultados anteriores não devem fazer esquecer
alguns factores de preocupação que são visíveis. Em primeiro lugar,
persistem grupos da população com elevados níveis de incidência da
pobreza, como as famílias monoparentais (com uma taxa de pobreza de
33,1%) e as famílias alargadas com crianças (com 41,4%). Estas famílias
só beneficiaram da melhoria das condições económicas e sociais de uma
forma muito mitigada e devem-se tornar um targeting group prioritário das políticas sociais.
A
população em situação de desemprego constitui igualmente um grupo
social extremamente vulnerável às situações de pobreza e de exclusão
social. A sua taxa de pobreza de 44,8% em 2016 foi 2,8 pontos
percentuais superior à de 2015, mostrando como, apesar da sua redução, o
desemprego permanece um dos principais factores de pobreza.
Por
último, a taxa de pobreza da população empregada permanece praticamente
inalterada nos últimos anos (10,8% em 2016). A existência de uma taxa
tão elevada de working poor tem de constituir um forte factor
de preocupação social. Deve igualmente questionar-nos sobre as
fragilidades do nosso mercado de trabalho e sobre as políticas laborais e
salariais vigentes.
Estes resultados globalmente positivos sobre a
evolução recente dos indicadores de pobreza, de exclusão social e de
desigualdade económica não nos podem fazer esquecer que Portugal
continua a ser um país com elevados níveis de pobreza, de precariedade
social e de assimetrias sociais. Neste contexto, continua a ser
necessário um papel mais actuante das políticas públicas no combate às
situações de maior vulnerabilidade social.
Mas a redução
sustentada da pobreza e da exclusão social não pode ser alcançada
exclusivamente através de medidas dirigidas à população pobre. Pressupõe
alterações profundas nas prioridades que presidem à noção de
desenvolvimento do país, a implementação de políticas que promovam o
emprego e o crescimento económico, conjuntamente com um sistema de
protecção social mais eficiente no apoio aos indivíduos e famílias que
dele efectivamente carecem. Pressupõe, ainda, uma política efectiva de
combate às desigualdades sociais.
* Professor do ISEG - U. Lisboa
Presidente da Direção do IP
IN "PÚBLICO"
04/12/17
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