Destruir o planeta
para criar milionários
O mundo está cada vez
mais rico. Mas quais são os custos humanos e ecológicos desse aumento
da riqueza global? Será que a esmagadora maioria da população global
está a ser beneficiada por esse aumento?
Foram
recentemente publicados e noticiados dois trabalhos que são reveladores
do rumo socioeconómico global. Um foi a oitava edição do “Global Wealth Report” do “Credit Suisse Research Institute” sobre a distribuição da riqueza mundial e outro foi um artigo na revista “BioScience”,
subscrito por cerca de 15 mil cientistas de 184 países, sobre a
evolução das condições ecológicas do planeta. As informações
apresentadas nestas pesquisas reflectem o modelo de “desenvolvimento”
que tem sido seguido a nível global.
1. Segundo o relatório
do “Credit Suisse” o mundo está 27% mais rico desde a crise financeira
mundial de 2007/2008, estando cerca de metade da riqueza mundial
concentrada em apenas 1% da população. O 1% que em 2008 possuía 42,5% da
riqueza mundial tem actualmente 50,1%. A concentração da riqueza no 1%
está a aumentar desde a crise, tendo superado em 2013 o nível de 2000 e
alcançado desde então novos picos históricos. O número de milionários
(riqueza superior a um milhão de dólares norte-americanos) tem
aumentado. Esse número, que tinha caído em 2008, triplicou desde o
início do milénio, totalizando hoje 36 milhões de pessoas, mais 2,3
milhões que no ano anterior. Estas pessoas com mais de um milhão de
dólares representam 0,7% da população mundial e controla aproximadamente
46% do total da riqueza mundial. Na base da pirâmide estão os 3,5 mil
milhões mais pobres que dispõem de apenas 2,7% da riqueza mundial.
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2. Segundo o artigo
na “BioScience” estão em curso danos ecológicos irreversíveis e
substanciais na Terra. Este alerta é uma sequela de um outro realizado
em 1992, quando mais de 1.700 cientistas assinaram um artigo intitulado
“Alerta dos cientistas do mundo à humanidade”. De acordo com as
informações publicadas, desde 1992 houve uma redução de 26% na
quantidade de água doce disponível “per capita”; um aumento de 75% do
número de áreas mortas nos oceanos; uma perda de 129 milhões de hectares
de floresta; um aumento significativo nas emissões globais de gases com
efeito de estufa; uma redução de 29% nos mamíferos, répteis, anfíbios,
aves e peixes. Muitas formas de vida actuais podem ser aniquiladas ou
condenadas à extinção até ao final deste século. Está em curso a “Sexta
Extinção em Massa” dos últimos 540 milhões de anos.
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3. Estas
duas dimensões da economia política dominante estão relacionadas entre
si. O mundo está cada vez mais rico. Mas quais são os custos humanos e
ecológicos desse aumento da riqueza global? Será que a esmagadora
maioria da população global, na sua vida concreta, está a ser
beneficiada por esse aumento? É provável que muita gente esteja pior do
que estava antes da crise financeira mundial. Ao analisarmos a evolução
económica podíamos ser levados a acreditar que o objectivo da humanidade
é criar milionários e que isso é bom. Mesmo à custa da vida no planeta e
das perspectivas das gerações futuras.
Os estudos que têm sido
realizados nestas matérias são claros nas conclusões. O sistema
capitalista global tem gerado ao longo da sua história dois resultados
consistentes: degradação dos ecossistemas e concentração da riqueza numa
minoria, em parte riqueza fictícia baseada em expectativas de que o
rumo se mantém no futuro. Um sistema que funciona assim não é apenas
questionável sobre a sua sustentabilidade ecológica e social é também
questionável sobre a sua racionalidade e moralidade.
Que sentido tem a
acumulação de riqueza se ela põe em causa a sociedade e a própria vida –
humana e não humana? Não é uma destruição criativa “Shumpeteriana” é
mesmo a destruição das bases da existência. Este é o caminho da ruína
social e ecológica. A abundância e a capacidade de carga do planeta na
actualidade não é a mesma que existia há duzentos ou cem anos atrás. É
tempo de olhar para o essencial antes que seja tarde demais.
* INVESTIGADOR
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
21/11/17
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