O começo da história de Donald
A concretização das promessas de Trump e a
configuração de cenários da sua destituição não auguram bons tempos para
a nova ordem americana
Se havia ansiedade global a propósito do discurso de
tomada de posse de Donald Trump, rapidamente se transfigurou em
desilusão e em angústia. Se há discurso icónico na política
internacional, esse corresponde com certeza às primeiras palavras de um
Presidente norte-americano investido no cargo.
Este não ficará para a
história, mesmo que se ameace que a história dele se vá recordar. Trump
perdeu uma grande oportunidade: não revelou a mínima preparação, não
traduziu a mais leve preocupação com a sistematização, muito menos
trouxe para o palco de Washington um aceno de um programa substancial e
organizado de mandato. Trump exibiu até uma certa indigência na
formalidade do acto, como que ostentando subrepticiamente um menosprezo
pelas instituições da democracia, bem como pelos seus ritos e
procedimentos, substituídos pelos seus próprios maneirismos, tiques e
desabafos de propaganda.
Em tudo o mais, equiparou o acto a mais um
discurso de campanha, com frases e formulações feitas de retórica, que
mais não fizeram do que confirmar uma personalidade (ou um culto da sua
própria) e um estilo desviante (e desviado), feito da vontade de isolar e
concentrar. E uma estratégia (?) que está aparentemente em contradição
com o ordenamento mundial criado após a II Guerra Mundial e os
equilíbrios de poder geoestratégico que permitiram prevenir conflitos à
escala universal nestes últimos 70 anos. O que significará desgastar e
acabar lentamente com as alianças políticas e militares permanentes no
Ocidente (o atlantismo ancorado na NATO) e na Ásia (Japão e Coreia do
Sul, em concluio com a presença americana no Pacífico), com os acordos
de comércio livre, com os progressos de Obama na estabilização de
relações “perdidas” (Irão, Cuba, até a China), com a intervenção
reguladora dos conflitos “eternos” (orientando Israel, nomeadamente),
com a desistência do apoio e concertação com a União Europeia, com o
desinvestimento na actuação da ONU. Será assim? Com a China já ali à
espreita para ocupar o lugar da potência dominante, hasteando a bandeira
da cooperação? Com a Rússia desesperada por concretizar uma espécie de
anexação da Europa sem crédito e esburacada e aniquilar a frente de
resistência aberta por Merkel?
Desde a posse, passar da retórica à prática significou para Trump
exibir na Sala Oval e nas primeiras aparições públicas e institucionais o
cumprimento das suas promessas, desde o princípio do fim do “Obamacare”
até à compatibilização com os interesses das petrolíferas e da
indústria do armamento (para arrasar os terrorismos religiosos), sem
esquecer a directiva para construir o muro com o México.
Uma espécie de
confirmação de que as ameaças mais fracturantes são para se cumprir à
primeira oportunidade, sem espera pelo compromisso e pelo consenso.
Autoritarismo puro, caucionado por regras de democracia formal.
Populismo económico, legitimado pelo isolacionismo para com os que não
interessam e outorgado pelo interesse para com as potências emergentes e
reemergentes. Ameaça gratuita sobre a imigração e a abertura aos
refugiados. E rapidamente se sublevou a esperança dos cépticos,
adversários e manifestantes de rua de que algum escândalo passado possa
submergir – na cama ou nos negócios – ou que o voluntarismo e a
inexperiência de Trump se precipitem em alguma violação da Constituição.
Lembram-se de algum Presidente dos EUA que começasse logo à partida com
cenários de “impeachment”?
Claro que votaram nele pela mudança, mas não
seria necessariamente esta…
IN "i"
26/01/17
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