Que o Estado queira taxar o açúcar não passa de hipocrisia refinada. O Estado vai arrecadar mais alguns milhões, numa altura em que dão muito jeito, com o argumento piedoso de agir para nosso bem. Até porque ninguém vai deixar de beber coca-cola por causa da nova taxa.
O Governo vai avançar com um imposto especial sobre os produtos
com alto teor de açúcar, o chamado ‘fat tax’, com o qual deverá obter
uma receita fiscal adicional na ordem dos 30 milhões de euros, segundo
alguns especialistas. O tema é relevante não pelo aspeto orçamental, mas
antes pela conceção do que deve ser o papel do Estado numa sociedade
moderna.
Vamos supor que a razão deste imposto é, de fato, a necessidade de
promover hábitos saudáveis. Há dois argumentos que poderão ser
utilizados para o fundamentar: por um lado, a crença de que o Estado tem
o dever de penalizar os comportamentos menos saudáveis, para promover a
saúde pública. Por outro, o argumento economicista dos que dizem que o
Estado tem o direito de se imiscuir na nossa dieta, pelo facto de o
Sistema Nacional de Saúde (SNS) ter custos acrescidos com as doenças
causadas por hábitos menos saudáveis.
Uns e outros não têm razão. Em primeiro lugar, porque o Estado não
tem o direito de nos dizer o que comer ou beber. Não podemos deixar lixo
na via pública porque isso põe em causa a saúde de terceiros e a nossa
liberdade termina quando começa a dos outros. Mas o açúcar que cada um
ingere, por dramático que seja, é problema de cada cidadão. É evidente
que, em circunstâncias extremas, o Estado pode proibir a venda de uma
determinada substância, se concluir que a mesma é altamente nociva para a
saúde, tal como faz com as drogas. Mas que o Estado queira taxar o
açúcar, supostamente para nosso bem, é hipocrisia refinida. Até porque
ninguém vai deixar de beber coca-cola por causa do novo imposto. A única
diferença é que o Estado vai poder arrecadar mais alguns milhões, numa
altura em que dão muito jeito, com o argumento piedoso de agir para
nosso bem.
Quanto ao argumento “economicista”, imaginem como seria se o Estado
cobrasse impostos adicionais em todas as atividades que pudessem levar a
encargos atuais ou futuros para o SNS. Não poderíamos sequer sair de
casa sem pagar mais uma taxa. n.
IN "JORNAL ECONÓMICO"
14/10/16
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