ESTA SEMANA NO
"OJE"
"OJE"
VW Autoeuropa terá robôs
a trabalhar junto de humanos
Os robôs colaborativos vão ser a nova realidade em grandes indústrias como a automóvel. É a revolução potenciada pela Indústria 4.0 e a academia ATEC está na vanguarda, diz João Carlos Costa, administrador técnico daquela escola, que funciona em Palmela, no meio das grandes indústrias de vanguarda nacionais.
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Conectividade e cibersegurança passaram, entretanto, a ser os grandes temas da indústria.
O que é o conceito Indústria 4.0? É mais do que digitalização industrial?
É mais do que digitalização industrial. Primeiro, foi a introdução do
vapor; depois a introdução da eletricidade; em terceiro, a introdução
de todos os sistemas informáticos; e esta, que introduz os chamados
sistemas ciberfísicos.
Ou seja, vai trazer robôs que colaboram com os humanos e a grande
diferença é, por outro lado, a conectividade entre todos os elementos,
não só da indústria, mas também na parte comercial, isto é, começa na
própria encomenda de determinado bem.
A interação com o cliente é logo feita de modo digital, chamemos-lhe
assim, e a ordem entra no sistema, depois é gerida em termos logísticos
que, por sua vez, dá instruções à produção; na produção, há uma
adaptação ao produto que foi encomendado.
Uma das outras características é que passámos de uma fase de produção
em massa para uma fase de customização em massa (ou em série) e há quem
defenda que, hoje em dia, já não estamos a fazer uma customização em
série mas quase a fazer produtos únicos. Um exemplo que se dá, e que não
tem que ver com a ATEC, é encomendar uns ténis da Nike.
Hoje, posso chegar a um site da Nike e dizer que quero metade do meu
ténis direito azul e a outra de outra cor, que tudo isso entra
diretamente na linha de produção, que se adapta à produção desses
produtos únicos.
Um caso concreto: a ATEC está ao lado da Autoeuropa. Quando a VW Autoeuropa aplicar esta nova tecnologia, como irá trabalhar?
Um dos órgãos da ATEC é o conselho consultivo. No fundo, procuramos,
quer no meio científico-tecnológico, quer com os nossos parceiros,
identificar algumas oportunidades e, no fundo, temos aqui uma visão
estratégica para o futuro. Nesta última edição, na semana passada,
convidámos os nossos três promotores tecnológicos (no fundo, aqueles que
têm indústria: a Bosch, a Siemens e a Autoeuropa) para nos virem falar
sobre o que significava para eles. Na Autoeuropa, estamos a falar, na
área de logística, a forma como é feito todo o tratamento de informação e
ligação aos fornecedores, que pode vir a ser alterada.
Também a forma como é feita a programação da produção pode vir a ser
otimizada através destes sistemas. Temos, na própria produção, a
introdução dos tais robôs colaborativos na própria produção. Estamos
muitos habituados ao robô que trabalha dentro de uma gaiola e, se alguém
abre a porta, para tudo. Passaremos a ter robôs preparados para
trabalhar lado a lado com humanos, no sentido de facilitar do ponto de
vista ergonómico e da produtividade, com vantagens bastante
significativas. Ao nível da manutenção dos equipamentos, assistiremos a
uma grande revolução que já começou a acontecer. Conceitos como
manutenção preventiva e corretiva tenderão a desaparecer.
A própria máquina comunicará que detetou que, dali a duas horas, a
peça “X” terá de ser substituída ou que o produto “Y” precisará de ser
realimentado. E situações como realidade aumentada, por exemplo, estarão
na ordem do dia. No outro dia, estive numa conferência onde se dizia
que, provavelmente, o tablet seria a principal ferramenta de manutenção
dos técnicos. Quando chegar junto da máquina que avariou, não precisará
de abri–la, pega no tablet, “pergunta” à máquina qual é o problema e ela
“responde”, por exemplo, que um sensor tem de ser trocado e qual é esse
sensor.
Isto significa que, com esses robôs colaborativos, em grandes
unidades como a VW Autoeuropa a organização do trabalho das pessoas
também será diferente?
Seguramente. E não só com os robôs colaborativos. Dou-lhe o exemplo
não só da Autoeuropa, mas também da Siemens ou da Bosch, onde já há
casos práticos, em que o trabalhador terá um cartão com um chip que
aproximará da linha onde vai trabalhar de modo a que este se reconfigure
e adapte às características daquele colaborador que vai iniciar o
turno, pois é diferente ter alguém que meça 1,80 m e alguém com 1,60 m a
trabalhar, ou um canhoto.
Em termos gerais, um estudo do Fórum Económico Mundial diz que 65%
das crianças que ingressam hoje no ensino básico terão, no futuro,
profissões diferentes. Se perguntarmos aos especialistas quais serão, a
resposta é “não se sabe”.
Sabe-se apenas que serão diferentes; em que aspetos, é algo difícil
de antecipar e temos de adaptar-nos à nova realidade. Para além das
competências técnicas e das novas tendências tecnológicas, onde
procuramos estar sempre na linha da frente para que os nossos formandos
saiam daqui muito bem artilhados, na ATEC, temos de trabalhar onde há
pistas mais concretas, ou seja, no perfil do trabalhador do futuro.
E quando falamos do perfil não estamos a falar das competências
técnicas. Aliás, as competências técnicas começarão a perder alguma
importância devido ao nível de especialização (pelo que haverá
especialistas em cada área), mas estamos a falar de questões
comportamentais.
Temos de apostar em pessoas que sejam empreendedoras,
na perspetiva de aceitar a mudança, de terem pro-atividade na resolução
de problemas; na questão de resolução de problemas, serem pessoas com
uma capacidade de análise boa na solução daquele tipo de questões; a
questão das línguas: o inglês é, cada vez mais, a língua universal, pelo
que as pessoas têm de sair bem preparadas a esse nível.
Com a Indústria 4.0, teremos um novo modelo de pessoas, um
novo modelo de relação das pessoas com o trabalho e vamos ter também
novos modelos de negócio. No futuro, os negócios, tal como as pessoas,
serão diferentes? De que forma é que a ATEC se está a adaptar?
A primeira questão é a da conectividade e da coordenação. Muita da
base tecnológica já existe, o que mudará é a forma como será feita a
ligação entre as várias componentes, seja a humana, sejam os
equipamentos, seja a parte do mercado – os modelos de negócio irão
evoluir dessa forma. Na ATEC, tendo em conta as várias vertentes na
nossa formação, que vão desde a formação nas áreas de tecnologias de
informação e comunicação, passando pelas áreas de eletrónica, da parte
automóvel, passando pela metalurgia e pela metalomecânica, o que vai
mudar é a relação entre os homens e as máquinas.
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Outra questão é a que se relaciona com a conectividade entre os
vários modelos de negócio e um dos principais aspetos tem que ver com a
cibersegurança. Se o nosso computador sofre um ataque informático e
perdemos os documentos, isso é algo aborrecido. Mas se estiver a guiar e
o carro começar a acelerar, a travar excessivamente ou a virar para
onde não quero porque sofri um ataque cibernético, o caso muda de
figura. Logo, a cibersegurança é uma área que irá ganhar grande relevo
nos próximos tempos.
Nesse sentido, a ATEC tem participado ativamente, desde o ano
passado, num grupo de trabalho da NATO e desenvolveu um curso de
especialização tecnológica na área da cibersegurança que já consta do
Catálogo Nacional de Qualificações. Nos próximos meses, arrancaremos com
as primeiras edições desse curso. Contamos, para isso, com a
colaboração dos nossos parceiros.
Para além de academia Cisco, somos academia Kaspersky, academia
Microsoft, academia SAP, temos todas estas valências para dotarmos os
nossos futuros ex-formandos das competências e certificações necessárias
para poderem entrar no mundo do trabalho.
Em termos de certificações, até onde é que a ATEC consegue chegar?
Os níveis de certificação dependem das diferentes áreas de formação e dos níveis de qualificação.
A ATEC faz parte do comité estratégico do Governo que visa
desenvolver todo este tema da indústria nacional rumo à Indústria 4.0?
Não direta mas indiretamente.
Via VW Autoeuropa?
Não. No início deste ano, aderimos à Coligação para a Empregabilidade
Digital, com enfoque nas necessidades de profissionais na área
extraordinária das tecnologias de informação e, do ponto de vista da
indústria, somos também membros do recente cluster de competitividade da
indústria automóvel, o Mobinov (cuja comissão instaladora integramos),
que incorpora tudo o que é fabricante automóvel de Portugal, porque
resulta de uma associação da ACAP e da AFIA (fornecedores da indústria
automóvel), e aí, sim, contamos participar ativamente. Neste âmbito, já
tivemos, inclusivamente, reuniões com o Governo.
Estamos aqui a focar-nos muito na questão de formandos jovens e/ou
adultos desempregados. Mas não nos podemos esquecer, sobretudo com as
questões demográficas, de que será necessário fazer também uma
reconversão dos trabalhadores hoje no ativo, pelo que eu diria que esse
será também um desafio em que a ATEC poderá, com certeza, colaborar,
ajudando as empresas. Falamos aqui de duas vertentes: a reconversão
técnica (que será, no fundo, uma adaptação desses profissionais às novas
realidades tecnológicas) e a reconversão da mentalidade – teremos de
fazer aqui uma redução de alguma iliteracia digital que ainda possa
haver no mundo das empresas e isso passa, muitas vezes, por mudar também
as mentalidades, implica uma gestão da mudança que terá de ser feita
nas organizações porque cada vez mais, nas organizações, temos três
gerações a coexistir na mesma empresa. Pelo que temos de trabalhar na
reconversão de ativos para esta nova mentalidade.
Diria que será provavelmente aí que reside o maior desafio. Formar os
jovens em novas tecnologias e adaptá-los a esta nova realidade talvez
não seja o mais difícil. Mas reconverter pessoas que trabalham há 20 ou
30 anos e que, hoje em dia, ainda têm, em termos profissionais, mais 20 à
sua frente, será o grande desafio, começando até pelos vários níveis de
chefia nas próprias empresas.
Diria até que, pela experiência que já tem de intervenção em empresas
ao nível da identificação dos perfis necessários, sobretudo em termos
dos vários níveis hierárquicos e de chefias intermédias, fazer uma
análise dos perfis necessários, fazer uma proposta em termos de qual é o
desvio em relação à situação existente, a fazer a aplicação de
programas de desenvolvimento dessas mesmas pessoas dentro das empresas,
fazer depois avaliações a nível de progressões de carreira das quais
saem recomendações, há aqui uma relação que se estabelece com algumas
empresas que dura… não diria décadas, por a ATEC não tem décadas, mas
quase – dura há quase uma geração.
Portanto, este acompanhamento – e aí, sim, a ATEC, pela forte ligação
que tem à indústria, não só por via dos seus promotores mas também
pelas empresas com as quais tem parcerias para as formações práticas em
contexto de trabalho (por exemplo, estágios) com algumas centenas de
empresas – permite-lhe ter um conhecimento da realidade industrial e
empresarial que, acho, será uma mais-valia neste programa.
Voltando ao tema inicial. Com a Indústria 4.0, acredita que
no período de uma geração, Portugal poderá vir a assumir uma outra
posição como um país com a indústria que perdeu nos últimos 40 anos?
Sem dúvida. Diria que é o único caminho. Se Portugal continuar a
insistir num modelo de indústria com mão-de-obra intensiva, dificilmente
será competitivo. A única forma que Portugal e a generalidade da Europa
tem de crescer será a aposta num modelo diferente e que assente sobre a
Indústria 4.0.
Terá de ser avançado sob o ponto de vista tecnológico, com uma
capacidade e uma adaptabilidade das unidades de produção muito grande,
procurando responder à tendência de mercado de cada vez haver
necessidade de as pessoas sentirem que aquele produto foi feito para si e
só para si, depois de termos passado o tema da massificação dos
produtos. Esta será a única forma de Portugal se afirmar como potência
industrial.
O país está numa boa posição pois em termos do ponto de vista técnico
tem o reconhecimento internacional dos profissionais. Esta necessidade
de profissionais qualificados será europeia e temos de criar condições
em Portugal de forma a conseguir reter essas mesmas pessoas, senão
estaremos a fazer aqui um investimento para depois exportarmos esta
mãode- obra qualificada.
Como responde a ATEC a nível de providers know-how?
Em termos sucintos, temos aqui uma oferta cada vez mais dirigida à
Indústria 4.0. Precisamos que tudo esteja articulado entre o ensino, a
educação vocacional e também a parte académica. Somos uma academia
situada entre o ensino obrigatório e a faculdade, que se encaixa em
tudo.
Temos cursos de aprendizagem que vão até ao 12.º ano e depois vai-se
para as universidades, no sentido de articular tudo. E quando
perguntamos às empresas o que necessitam, a resposta é que nem sempre
necessitam de engenheiros e sim de pessoas que têm as competências de um
engenheiro já adaptado à indústria, com outros percursos que vem mesmo
de formação profissional, sendo estas pessoas que, numa empresa, sabem
praticamente mexer, programar e trabalhar com as máquinas. A par da
parte académica junto das universidades, a academia ATEC permite a
aprendizagem. Temos uma dúzia de protocolos a funcionar entre a ATEC e
as universidades que mostram que estamos bem ligados a estas e esta
fusão de know how providers é muito relevante para o país onde há nichos
de necessidades. A ATEC responde com essas competências.
* ATEC, uma pedrada no charco!
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