ESTA SEMANA NA
"VISÃO"
"VISÃO"
A economia da jihad
Vistas do céu, a quatro quilómetros de altitude, as filas de
camiões-cisterna estendem-se ao longo de dezenas de quilómetros,
prolongando-se além do horizonte. Apresentadas, no início da semana,
pelo Presidente russo, Vladimir Putin, aos seus colegas, durante a
cimeira do G20, as fotografias aéreas, mostrando cortejos de veículos a
formarem-se junto às instalações petrolíferas controladas pelo
autoproclamado Estado Islâmico (EI), ilustram a dimensão do problema.
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Ao
contrário da Al Qaeda e de outros grupos jihadistas, dependentes dos
donativos de patrocinadores externos, o mundo enfrenta agora uma
organização autossustentável, capaz de extrair petróleo das entranhas da
terra, transformá-lo em combustível e de o introduzir no circuito
comercial.
Controlando territórios iraquianos e sírios da dimensão
da Grã-Bretanha, a sua população e os seus recursos naturais, o EI
dispõe de abundantes fontes de financiamento. Os produtos petrolíferos
são a principal. O negócio de hidrocarbonetos do Califado envolve uma
sofisticação digna de uma “empresa petrolífera nacional”, tendo o EI
procurado recrutar no exterior engenheiros, técnicos e gestores para
garantir o seu funcionamento das instalações.
Ao contrário da
administração do território descentralizada e a cargo de governadores
regionais (walis), o negócio do petróleo é, à semelhança dos assuntos
militares, centralizado e dirigido ao mais alto nível.
Os
terroristas controlam 20 campos petrolíferos e três refinarias,
assegurando uma produção diária entre os 34 mil e os 40 mil barris.
Vendidos a um preço unitário de 20 a 45 dólares, através de uma complexa
rede de contrabando, as receitas ascenderão a 1,5 milhões de dólares
diários. O que não é usado para consumo próprio, exporta-se
clandestinamente, em bruto ou já refinado, através de uma rede de
contrabando, envolvendo a Turquia, Jordânia, Irão e inclusivamente
regiões “inimigas”, como os territórios controlados pelo Governo sírio
ou por rebeldes, inimigos de Damasco e do próprio EI, muito pragmático
nos negócios.
O petróleo renderá aos jihadistas uns 540 milhões
de dólares por ano. Os dados disponíveis, ainda que cautelosos, permitem
afirmar que, sendo esta a sua maior fonte de receitas (representa 27%
do total), não é a única, dispondo o Califado de uma economia
diversificada.
Sob a bandeira negra estão também importantes
zonas de produção de gás natural e de algodão, além de recursos como o
cimento, os fosfatos, o enxofre (para ácido sulfúrico), trigo e cevada,
bem como as instalações industriais para o processamento dessas
matérias-primas.
As receitas não se esgotam aí. O EI tem máquina
fiscal eficiente que rende 360 milhões de dólares por ano. Há impostos
para tudo e até um desconto de 5% sobre os salários para a segurança
social.
“O Estado Islâmico controla um território com 8 milhões de
pessoas e aplica impostos sobre esta população”, tem lembrado a
economista italiana Loretta Napoleoni, investigadora do financiamento de
redes terroristas desde meados da década de noventa.
Além disso,
tudo o que entra ou sai do território paga imposto – um sabonete
importado, ou, no sentido inverso, um jerricã de gasóleo, uma obra de
arte saqueada, uma barra de haxixe ou um refugiado a tentar escapar.
Este
último é o negócio do EI que mais floresceu recentemente. Se ainda em
2012 e 2013 os resgates de reféns eram uma das principais fontes de
receitas, atualmente não valem mais do que 4,3% do bolo total. “Agora,
em 2015, o tráfico de refugiados tornou-se muito mais rentável”,
salienta Napoleoni num artigo publicado, esta segunda-feira, no El País.
Rende cinco vezes mais do que os “donativos” recebidos do exterior,
cuja origem é sobejamente conhecida – Qatar, Kuwait, Arábia Saudita e
outras monarquias do Golfo Pérsico que professam o wahabismo, a versão
mais radical do Islão sunita.
* Um excelente trabalho do jornalista FRANCISCO GALOPE.
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