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"OBSERVADOR"
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As 10 apps que não esperava encontrar nos smartphones dos nossos políticos
O Observador espreitou os smartphones dos deputados e descobriu apps surpreendentes que metem insónias, choro de bebés, música do Hawai e Homer Simpson.
Os corredores da Assembleia da República encheram-se de smartphones e tablets,
ferramentas de trabalho indispensáveis para a maioria dos deputados.
Mas alguns destes dispositivos escondem segredos curiosos. O Observador
espreitou os smartphones e descobriu que há deputados que têm
aplicações para cuidar da linha, outros que usam os telemóveis para
perceberem por que razão choram os bebés e, ainda, quem precise de uma
ajuda seja para dormir, tocar ukulele ou cozinhar no final de mais um
dia em São Bento.
O melhor, mesmo, é ver a lista das dez (e mais algumas) aplicações invulgares dos deputados.
O Dots and Boxes é um jogo aparentemente simples:
contra um adversário real ou contra o “computador”, o objetivo é juntar
pontos até fazer caixas. Quem conseguir desenhar a última linha de uma
caixa, ganha-a e quem fizer mais caixas, ganha o jogo. Simples, não é?
Pois bem, é a melhor solução para as insónias de uma das mais ocupadas
deputadas do Parlamento. Quem? Nem mais, nem menos do que a bloquista
Mariana Mortágua.
Os trabalhos parlamentares podem ser um desafio
hercúleo e Mariana Mortágua, que, entre as habituais comissões e
plenários, ainda tem de gerir o gigantesco “dossier BES”, já admitiu,
noutra ocasião, que o ritmo era “muito, muito, duro”, só possível de
acompanhar “à custa de horas de sono” perdidas. Ao Observador, confessou
que, para além de noites de trabalho, tem também algumas noites de
insónia, e o segredo para combater as horas em branco chama-se
Dots and Boxes. “Não há nada melhor”, conta, com um sorriso.
Reconstruir
os passos da crise que levou à resolução do Banco Espírito Santo pode
ser difícil, mas, no plano virtual, limpar a confusão deixada por Homer
Simpson pode revelar-se igualmente desafiante no jogo The Simpsons™: Tapped Out,
cujo objetivo “consiste em reconstruir a cidade de Springfield, depois
de Homer ter feito explodir a central nuclear em que trabalha”. Pelo
menos, para o deputado Michael Seufert: o centrista confessou-se
“ligeiramente viciado” no jogo e não resiste em reorganizar
“diariamente” a cidade louca de Springfield. “Excellent”, diriam os
criadores da aplicação, ao verdadeiro jeito do maléfico Mr. Burns.
Os criadores de FatSecret descrevem-na como a
aplicação “mais intuitiva para manter o controlo da alimentação, do
exercício e do peso, com acesso ao maior banco de dados do mundo sobre
alimentos de qualidade e nutrição”. No Parlamento, o FatSecret tem pelo
menos um fã: o deputado Sérgio Azevedo. O social-democrata explicou que,
como tem “de fazer dieta”, não há nada melhor que um amigo virtual que
lhe diga “olha que já comeste demais”. Como nestas coisas a distração
não pode entrar no menu, a aplicação é consultada diariamente, garantiu o deputado.
Mas ter atenção às calorias não chega – é preciso pôr o corpo a mexer. Para ajudar na dieta, há o Tabata Timer: ao som do apito do personal trainer
digital, o antigo vice-presidente da JSD vai alternando entre séries de
flexões, abdominais e dorsais. Um verdadeiro ginásio no bolso,
portanto.
O choro interminável de um bebé pode levar à exaustão até o mais
resistente e dedicado dos pais. No entanto, será possível que o sonho da
maioria se encontre numa única (e aparentemente simples) aplicação? O Cry Translator
garante que sim, que em dez segundos é possível decifrar por que razão
choram os bebés. Seja fome, sono, irritação, stress ou simplesmente
tédio, o Cry Translator decifra o motivo do choro do recém-nascido,
bastando para isso que o telemóvel capte o som sem interferências. E,
nesta matéria, há quem não resista a pedir a ajuda extra da tecnologia: é
o caso do deputado João Gonçalves Pereira, pai de uma criança com dois
anos e outra de cinco meses. O centrista garante que a aplicação resulta
na “grande maioria das vezes” e os críticos parecem concordar: o Cry
Translator já foi distinguido com vários prémios, inclusive a medalha de
ouro no Salão de Invenções de Genebra, em 2010.
Ainda assim, nem o
(aparentemente milagroso) Cry Translator encontra respostas para todas
as angústias dos pais deputados: é preciso entreter os miúdos e nada
melhor do que jogos para os distrair – até porque, na maioria das vezes,
o telemóvel é, ou melhor, tem de ser partilhado com a pequenada. Há de
tudo: desde os já clássicos Fruit Ninja e FarmVille, ao Animais da Quinta,
usado pelo deputado socialista Marcos Perestrello para ensinar à filha
de dois anos os sons que fazem os animais que não se veem na cidade.
Mas há mais, muito mais. Por exemplo, o Crossyroad,
“uma espécie de reedição do jogo Frogger, mas com uma galinha como
protagonista”, como explicou o deputado do PSD, Nuno Encarnação, pai de
duas crianças com dez e sete anos, respetivamente.
O
social-democrata é, de resto, uma das “vítimas colaterais” de uma febre
que atingiu milhões de crianças e adolescentes em todo o mundo: a
telenovela musical Violleta. Na trama, a protagonista é fã do jogo Tsum Tsum,
criado (surpresa) também pela Disney. O jogo consiste em encontrar e
fazer linhas com as personagens mais conhecidas do universo de Mickey e
companhia – uma espécie de adaptação do velhinho Puzzle Bubble. Claro
que, do lado de cá do ecrã, os super-fãs de Violleta seguem-lhe todas as
pisadas, que o diga o paciente Nuno Encarnação.
O Night Sky promete levar a experiência de observar as
estrelas a um outro nível e mudar a forma como os utilizadores olham o
céu. Na vida e na política houve sempre quem procurasse ler a sorte e
prever o futuro nos astros. Não será, no entanto, o caso do deputado do
Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares. Apesar de se dizer um grande fã
da aplicação, garante que não é nas estrelas que um dos mais jovens
deputados do Parlamento procura respostas para os desafios da vida
política.
Existe, no entanto, quem prefira os sons do Hawai aos céus de Lisboa e
se arrisque a aprender a tocar Ukulele (ou Ukelele), através da
aplicação UkuleleTabs que, segundo a Vmlweb LTD, reúne a
maior coleção de tablaturas de música adaptadas para serem tocadas com o
primo afastado do cavaquinho português. Quem o revelou foi Michael
Seufert: o deputado do CDS diz estar a tentar “aprender” algumas
músicas, mas o tempo, esse, é que “infelizmente” não é muito, lamentou.
Já
no Bloco de Esquerda, o ritmo é diferente: Pedro Filipe Soares prefere
dedicar-se à guitarra, a “única forma de descontrair” depois de um dia a
travar batalhas no Parlamento. E como não há bons músicos sem
instrumentos à altura, aplicações como o Epic Chromatic Tuner e o Metronome ajudam-no a afinar a guitarra e a encontrar o ritmo certo.
Praia, sol, mar e surf podem não combinar com a imagem que temos da maioria dos deputados, mas há quem não dispense a Beach Cam Live: uma
aplicação que permite consultar as principais notícias do mundo do
surf, o estado do mar e espreitar as principais praias onde se pratica a
modalidade. O deputado do CDS, João Gonçalves Pereira é um dos que
gosta de consultar as marés – não as políticas, porque, essas, são mais
difíceis de prever.
Existe, no entanto, quem prefira terra bem
firme à incerteza da ondulação e opte antes por uma, ainda assim não
menos exigente, corrida ao ar livre. A aplicação Nike+ Running,
criada por uma das marcas desportivas mais prestigiadas do mundo,
monitoriza as corridas, ajuda a definir metas e, para os mais
competitivos, permite partilhar resultados e desafiar os amigos a
fazerem melhor. A deputada Francisca Almeida do PSD, por exemplo, já não
dispensa a aplicação.
Terroir? Tanino? Monocasta? Distinguir um bom vinho de um que apenas
serve para temperar comida pode ser um desafio para a maioria das
pessoas, principalmente se o objetivo for fazer boa figura perante os
amigos ou uma companhia especial. Mas, agora, existe uma aplicação que
promete facilitar a vida dos especialistas de trazer por casa: o Vivino
ajuda a escolher os melhores vinhos, a descobrir e a comparar preços e a
decidir que vinho casa melhor com determinado prato. O processo é
simples: basta tirar uma fotografia ao rótulo da garrafa e saber o que
dizem os (verdadeiros) especialistas. António Rodrigues e Nuno
Encarnação, ambos deputados do PSD, já não dispensam a ajuda
do Vivino e também aproveitam a aplicação para partilharem com os amigos
os seus vinhos preferidos.
Mas se há conselho que merece ser
seguido com atenção é que não dá bom resultado beber álcool de barriga
vazia. Há os que gostam de seguir as receitas dos melhores chefes ou,
então, os que criam e partilham as próprias receitas através de uma
única aplicação: a Evernote Food. O
deputado do CDS, Michael Seufert, um confesso “aprendiz de cozinheiro”,
garantiu ao Observador que a app “funciona lindamente”.
A AppGree pode vir a tornar-se uma das principais
ferramentas digitais dos novos movimentos e partidos políticos que fazem
da aproximação entre eleitores e elegíveis as suas grandes bandeiras. A
aplicação, que pode funcionar, por exemplo, como um gigantesco
referendo online, foi, de resto, adotada pelo espanhóis do
Podemos e tem feito muito sucesso entre os simpatizantes do partido. Em
São Bento, há quem use a aplicação para espreitar o que vai sendo feito
em Madrid, como contou Pedro Filipe Soares ao Observador. Será que o
Bloco de Esquerda vai ser o próximo a adotar a aplicação?
O Forza Football é uma das
muitas aplicações disponíveis no mercado que permitem ao utilizador
consultar resultados de jogos de futebol em tempo real e ser notificado
quando determinada equipa marca um golo. No Parlamento, não faltam
apaixonados pelo desporto-rei e os smartphones espelham isso
mesmo. Nuno Encarnação, por exemplo. O deputado “laranja” confessa-se
“adepto do Futebol Clube do Porto e da Académica”, paixões que, diz, “ao
contrário do que muita gente pensa, não são irreconciliáveis”. Por
isso, a aplicação é a melhor forma de seguir os resultados dos dois
clubes quando os trabalhos parlamentares ou outros compromissos se
intrometem no caminho.
Prova de que “colegas, colegas, cores
clubísticas à parte” é uma verdade mesmo entre parceiros de coligação,
está no facto de João Gonçalves Pereira não abdicar nem por um segundo
da aplicação oficial do Sporting – o deputado do CDS é, inclusive, membro do Conselho Leonino dos verdes. O que talvez ajude a explicar a devoção ao clube.
Ao contrário da maioria das aplicações que permitem gravar áudio, o Voice Record
oferece a possibilidade de partilhar o ficheiro de som através
de várias plataformas e até diretamente nas redes sociais. O socialista
José Magalhães, descrito pelos colegas do partido como um “verdadeiro geek” dos smartphones,
é um adepto da aplicação e contou ao Observador que na última vez que
usou o Voice Record para gravar a intervenção de Inês Medeiros na
apresentação do livro do deputado, houve quem lhe perguntasse do outro
lado do Atlântico se Inês Medeiros era sua namorada.
“Claro que há
pessoas que me perguntam: ‘Mas quem é que ouve isso?’ Mas depois
acontece também como aconteceu com os meus amigos brasileiros que me
vieram logo perguntar: ‘Pôxa, quem é essa menina tão interessante? Sua
namorada?'”, relatou, com direito a sotaque brasileiro e tudo. “Já uma
pessoa não pode participar em sessões literárias sem ser por uma questão
de afeto”, lamentou.
Mas o smartphone de José Magalhães
esconde uma verdadeira coleção de aplicações, a maioria relacionada com
comunicação e trabalho – jogos não, revelou, porque “qualquer jogo, como
por exemplo o World of Warcraft, seria um buraco negro de distração”.
Há o inevitável Viber, o PearlTrees, que permite organizar e partilhar tudo que esteja relacionado com os principais interesses dos utilizadores, e, ainda, a OneDrive, a aplicação que lhe permitiu guardar numa única pasta online
os documentos relativos à comissão de inquérito ao caso dos submarinos
“com um nome idiota” para fugir ao radar de alguém, eventualmente, mais
curioso.
Por falar em submarinos, José Magalhães contou, por fim, que uma das aplicações que mais usa é o Facetime,
que lhe permite comunicar em qualquer lugar com “a sua musa
inspiradora” e “mosca que anda de patas no ar,” a eurodeputada Ana
Gomes, numa referência clara às palavras de Paulo Portas, quando foi
ouvido na comissão de inquérito ao “caso BES”.
Arte: Milton Cappelletti
* Venialmente parlamentar.
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