A defesa do mexilhão
Vem desde os idos do Século XV e da “Empresa dos Descobrimentos”
aquela mania dos nossos historiadores considerarem os portugueses como
comerciantes. A tese, apesar de pouco abonatória às sérias e religiosas
intensões do Infante Dom Henrique, tem fundamento na nossa secular
habilidade para explorar mercados. De facto negociamos tudo: escravos,
ouro, prata, pedras preciosas, pimenta, canela, tecidos e o mais que se
aprouvesse.
Nas caravelas de quinhentos levamos aos confins do mundo esta nossa
arte, religiosamente preservada ainda hoje como verdadeira identidade
lusa. É verdade que um tanto adulterada pelos efeitos do progresso, mas o
jeito mantêm-se, com maior especialidade na venda internacional.
Exportamos a juventude e importamos vistos gold, vendemos energia aos
chineses, a banca aos angolanos, aeroportos aos franceses, comunicações
aos brasileiros e aviões a quem por eles der mais, por hélice ou por
asa, pouco importa.
Aparte alguns empecilhos no transporte, tudo se faz com o aparato dos
novos tempos. As naus portuguesas chegaram à Índia e ao Brasil, hoje,
os modernos submarinos de Portas raramente saem à barra do Tejo, mas
isso são pormenores. Com a pendão da Cruz de Cristo soubemos impor os
nossos interesses no Médio Oriente, na Ásia, na África e nas Américas,
agora, nem com a bandeira nacional e uma estátua do Ronaldo a República
consegue uma reclamação em Bruxelas, mas isso são, outra vez, detalhes.
Nesta cruzada interessa é manter o sangue na veia para o negócio e
substituir os governos por especuladores, já que as possibilidades na
venda do Portugal de hoje estão longe do fim, saindo mais em conta a
venda do país à peça. E no caso de falha de outras alternativas, ao
português desenrascado ainda sobram três boas e inovadores hipóteses: a
emigração, a venda de pastéis e de mensagens a dois de Belém.
É por aqui que o nosso regente Passos afirma o crescimento da
economia e do emprego, contra a bárbara pesca de arrasto ao mexilhão…Que
ele até agora lixou.
Estejamos tranquilos. 2015 está garantido e o mexilhão também.
BOM ANO.
IN "AÇORIANO ORIENTAL"
30/12/14
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