Quem tramou o
Novo Banco?
Na altura em que escrevo estas linhas, a venda rápida do Novo Banco é uma inevitabilidade.
Se o banco não for vendido no curto prazo, o risco para o
Estado e para o sistema bancário será cada vez maior. Mas nem sempre
foi assim: o Novo Banco poderia ter sido uma estória completamente
diferente, se o Governo e o Banco de Portugal (BdP) quisessem.
Recuemos um pouco no tempo, para melhor analisar o que está em causa.
Até porque há duas questões a que as autoridades ainda não responderam com clareza.
A primeira é o porquê de se utilizar o Fundo de Resolução para resgatar o BES, quando existia a alternativa da capitalização por instrumentos híbridos convertíveis (‘CoCo bonds'), como foi feito no BCP (três mil milhões), BPI
(1,3 mil milhões) e na própria CGD (900 milhões). Estes bancos também
tinham créditos "tóxicos", mas não foi necessário retalhá-los em "bons" e
"maus".
A solução foi simples e eficaz: o Estado injectou dinheiro e cobrou
um juro considerável (cerca de 9% ao ano). Em troca, os bancos têm feito
a sua parte: colocando a casa em ordem e, a custo, reembolsando as
‘CoCo bonds'. Sob o olhar atento do Estado, que tem uma palavra a dizer.
Apesar do sucesso destas capitalizações realizadas no auge da crise, o Governo e o BdP alegam que tal não seria possível no BES,
devido às novas regras europeias e ao facto de a capitalização por
‘CoCo bonds' expôr o Estado ao risco dos bancos. Haverá também outra
razão, que é o facto de o Novo Banco não conseguir pagar um juro de 9%
sobre 4,9 mil milhões.
Desta forma, a capitalização por ‘CoCo bonds', durante anos
propagandeada como ideia genial que até trazia lucros ao Estado,
depressa passou de bestial a besta. O que era bom para o Estado no BCP e no BPI, deixou de servir para o BES,
disseram-nos. Explicação difícil de entender, dado que o mesmo Governo
que alterou leis num fim-de-semana, para viabilizar a resolução, também
poderia, se quisesse, encontrar soluções que permitissem os ‘CoCo
bonds'.
O Governo e o supervisor optaram, em vez disso, pela divisão do BES em dois bancos, o "bom" (Novo Banco) e o "mau" (BES,
S.A.). O primeiro foi transferido para o Fundo de Resolução (entidade
pública tutelada pelas Finanças) e o segundo ficou nas mãos dos
accionistas do "velho" BES.
E que vemos seis semanas depois?
Vemos que a opção pela resolução pode fazer com que o banco "bom" se
transforme em "mau". Assim, em vez de um banco "mau", ficaríamos com
dois bancos "maus". E porquê?
Porque com a resolução, o Novo Banco foi colocado em gestão corrente e
impedido de competir verdadeiramente com os outros bancos, que,
compreensivelmente, não aceitam contribuir para um fundo público que
sustente um concorrente directo.
Tornou-se assim um alvo fácil, sendo
toureado pelos concorrentes, que lhe ‘roubam' clientes e quadros. Isto
porque Vítor Bento precisava do ‘OK' do Banco de Portugal para as
decisões mais comezinhas, desde o reembolso de obrigações à aprovação de
linhas de crédito para empresas.´
Independentemente da responsabilidade de Vítor Bento - e de
concordarmos ou não com a forma como abandonou o barco - a verdade é que
o Novo Banco foi asfixiado no berço. Como a borboleta que o simboliza,
foi condenado a uma existência efémera.
O que nos leva à segunda questão. Porque é que as autoridades optaram pela venda rápida do banco?
Os outros bancos - incluindo os que querem comprar o Novo Banco a
preço de saldo - têm interesses legítimos a defender, mas, até à data, o
Estado é, de longe, o maior contribuinte do Fundo e quem mais tem a
perder. Assim, porque não deu tempo e poder a Vítor Bento para valorizar
o Novo Banco o mais possível?
IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
15/09/14
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