Para começar de vez com a cultura
Petições para não deixar morrer o Cinema Londres.
Petições para o Estado português não vender os quadros de Miró. Concordo
com isso tudo. Gostava que o Cinema Londres ainda existisse. Gostava
que o King não tivesse fechado. Gostava de ver a exposição de Miró em
Portugal. Também gostava que nos inquéritos sobre a cultura não se
apontasse a falta de interesse como a principal razão para não se ir ao
cinema, ou a um museu ou galeria ou ainda ao teatro, ao bailado, à
opera.... Mas é isso que se passa.
No último
Eurobarómetro, pergunta-se por que não iam os portugueses a um museu ou
galeria no último ano. Resposta: 51% falta de interesse. A mesma
pergunta para um bailado ou ópera. Resposta: 56% falta de interesse; E
por que não foi ao teatro no último ano? 40% falta de interesse. E ao
cinema? 35% por falta de interesse. Aqui, há uma nuance face às outras
artes. É que, perto, 32% respondem que não vão ao cinema por uma questão
de dinheiro, porque é caro. Só os concertos são também considerados
caros, afastando pessoas.
Os números ganham uma dimensão mais
preocupante se vistos à luz de outra pergunta. Quantas vezes foi, no
último ano, ao cinema? 29%; Ao teatro? 13%; A um museu ou galeria? 17%; A
um bailado ou opera? 8%; A um concerto? 19%.
São
estes números que fecham o Londres ou o King e que continuarão a
fechá-los. Apesar disso, conseguimos recordes na exposição na Ajuda da
exposição de Joana Vasconcelos. Conseguimos recordes nas bilheteiras do
filme "A Gaiola Dourada". Enchemos pavilhões para o Cirque du Soleil.
Esgotamos concertos de Verão. A exposição Rubens, Brueghel, Lorrain, do
Museu do Prado, já recebeu 20 mil visitantes. O que significam estes
números? Afinal há interesse?
Gostava
que se avaliasse, de forma séria, a falta de público no cinema, no
teatro, nas artes performativas, nos concertos. E se esses eventos
fossem promovidos? E se se falasse, de forma simples, sobre eles? E se
tivessemos formação logo de pequeninos? A arte não pode ser para
intelectuais. Não é.
Também
gostava que quando se fala de arte não houvesse logo alguém a rebolar
contra a primazia dada ao desporto, em particular ao futebol. Tudo pode
conviver. Tudo tem de conviver. É verdade que há uma primazia do
futebol. Injusta?
No domingo
estiveram 62 mil pessoas no Estádio da Luz e o País ficou em suspenso à
espera da confirmação de Cristiano Ronaldo como o melhor do mundo. Aqui
já parece haver interesse. É um espectáculo de massas, como não são uma
exposição e um teatro. E não são, porque não podem ou por que não se
quer?
*Jornalista
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
14/01/14
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