27/02/2013

LEONÍDEO PAULO FERREIRA

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Matar nazis a coice 
não é coisa para bife

Sabe-se que Alexandre chorou quando soube da morte de Bucéfalo. Velho e doente, havia muito que não era montado pelo conquistador macedónio, mas este nunca esqueceu o seu companheiro em tantas batalhas Ásia adentro. Também Napoleão estimava os seus cavalos de guerra e Vizir é até hoje exibido, embalsamado, nos Inválidos, não longe do túmulo do imperador. 

Mas a melhor história sobre um cavalo tem de ser a de Íris XVI: acabou frente ao pelotão de fuzilamento após matar um nazi com um coice. Foi condecorado herói de França.
Que se come cavalo é de há muito sabido, basta pensar nos exércitos de séculos passados obrigados tantas vezes a fazê-lo para matar a fome, os de Napoleão incluídos. Os cavaleiros mongóis até inventaram assim o bife tártaro, imitado pelos cossacos e que só bem mais tarde ganhou a sua versão bovina, tão popular na Europa de Leste.

Em alguns países europeus, como a Suíça, a França ou até Portugal, a tradição de consumir a carne de cavalo manteve-se, embora discreta. Uns dizem apreciar o sabor adocicado, outros falam do preço atraente, alguns recordam-se ainda de os avós elogiarem os efeitos tonificantes. Dir-lhes-á pouco a beleza do cavalo lusitano ou então separam muito bem estética e culinária.

Agora este escândalo europeu com as lasanhas e os hambúrgueres onde coexistem carnes de todo o tipo fez parecer novidade que se venda carne de cavalo e haver quem a aprecie. Ainda bem que a polémica estalou na Grã-Bretanha, onde mais que tudo os cavalos são admirados pelas corridas ou pelos saltos, porque só assim os espíritos se indignaram e o alerta chegou ao continente. É que se não faz mal comer cavalo, já fazê-lo a pensar que se trata de vaca é ser enganado. 

Mais que uma questão de haver produtores e distribuidores sem escrúpulos a tentar maximizar os seus lucros, o que se percebe é que a fiscalização é ineficaz e que se comercializa de país para país blocos de carne moída onde tudo é misturado, desde aparas de vaca até músculos vários, passando por restos de carcaças de cavalos que foram injectados com substâncias perigosas. Não se trata de um problema de rotulagem, mas sim de respeito pelos consumidores, até pela saúde pública. E mesmo em tempo de crise não pode valer tudo para se conseguir vender mais barato.

O problema não é, pois, o cavalo. Que o continue a comer quem queira. Por mim, prefiro vaca ou porco. Quando leio sobre Íris XVI, tenho a certeza de que nenhum bife estaria à altura de matar a coice um nazi. Diz-se até que o próprio Hitler nunca gostou de cavalos, ora mais uma razão para admirar estes animais fora do prato.


IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
25/02/13

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