14/10/2012

FRANCISCO SARSFIELD CABRAL

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O terceiro sector

O Estado português só há escassas décadas passou a conceder apoios sociais de algum significado. Durou pouco, porque o Estado providência está em recuo, em Portugal e um pouco por toda a parte no mundo ocidental e no Japão (mas não nas economias emergentes da Ásia).
Nascem menos crianças e a esperança de vida subiu, o que complica as finanças da Segurança Social (cada vez menos trabalhadores activos a descontarem, para cada vez mais reformados). E sobrecarrega o Orçamento do Estado (OE), sobretudo por causa da subida explosiva das despesas de saúde, que aumentam com a idade. Ao mesmo tempo, o crescimento económico caiu.
Em Portugal as restrições financeiras do Estado Social são muito agravadas pelo imperativo de reduzir o défice orçamental, obrigando a programas de austeridade. Por isso, os portugueses começaram a reparar no trabalho de numerosas instituições particulares de solidariedade social.
Aliás, em todo o mundo cresce o chamado ‘terceiro sector’, o da economia social, a par do privado e do público. Este sector inclui muitas entidades; até empresas, só que nestas o lucro é mera condição necessária para prosseguir acções de solidariedade.
A dimensão económica das Instituições Sem Fim Lucrativo ao Serviço das Famílias, em Portugal, está entre as três mais elevadas da União Europeia. Antes da crise o seu valor acrescentado bruto (VAB) ultrapassava, por exemplo, o VAB da indústria de material de transporte ou o das indústrias de madeira, pasta, papel e cartão. Encontram-se estes dados num estudo, As Instituições Particulares de Solidariedade Social num Contexto de Crise Económica, elaborado pela IPI Consulting para a Fundação Millennium BCP e a CNIS (Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Social - IPSS).
Ora, as IPSS têm sido financiadas, sobretudo, por transferências do Estado, que em 2008 representaram 46% das receitas globais dessas instituições; em anos anteriores a proporção foi superior. Tudo indica que a escassez de recursos do Estado leve – já está a levar – a uma mais acelerada diminuição do dinheiro público destinado às IPSS. Isto, numa altura em que as instituições de solidariedade recebem um número crescente de solicitações de ajuda.
O estudo referido apresenta sugestões práticas para tentar ultrapassar essa ‘quadratura do círculo’. Sugestões que vão desde a melhoria da gestão das IPSS, recorrendo nomeadamente a mais voluntários com experiência na matéria, até ao aumento das receitas próprias. O que exige um maior envolvimento da sociedade civil – apesar da crise, mas por causa da crise – nas acções de solidariedade social.
Apesar das limitações orçamentais, o actual Governo tem colaborado com as instituições privadas que estão no terreno e conhecem melhor do que a burocracia estatal quem verdadeiramente precisa de auxílio. Nos governos de Sócrates manifestava-se, por vezes, um pendor estatizante, fazendo concorrência às entidades privadas. Um desperdício de recursos escassos.
De facto, há quem, por razões ideológicas, encare, negativamente, uma maior intervenção das IPSS e outras entidades privadas no apoio social aos portugueses carenciados. Entendem os críticos que os apoios são direitos dos cidadãos e rejeitam o que chamam ‘assistencialismo’ ou até ‘caridadezinha’. Faz lembrar o velho dito de que ‘dar esmola a um pobre é atrasar a revolução’.
Claro que o Estado não se deve demitir das suas responsabilidades sociais. E muitas autarquias fazem notáveis esforços nessa área. Mas, na situação de emergência em que estamos, o Estado tem pouco dinheiro, chamando a sociedade civil a um maior esforço, caso contrário muito mais gente passará mal. As pessoas estão acima das ideologias.

IN "SOL"
09/10/12

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