A porta dos fundos
O Conselho Estratégico do Futebol Profisssional da UEFA, na sua
reunião de 18 de maio, abordando a questão dos fundos de jogadores,
ponderou negar a inscrição nas competições europeias a jogadores, cujos
passes, ou parte deles, pertençam a terceiras entidades. Esta questão
dos fundos de jogadores é assunto bicudo, porquanto, se por um lado,
alivia a pressão financeira dos clubes, por outro é instrumento da maior
opacidade nas transações que envolvem esses passes, bem como compromete
a transparência e verdade desportivas.
Efetivamente, é
confortável para os clubes cederem, no todo ou em parte, os chamados
direitos económicos sobre os jogadores a estruturas financeiras
externas, por uma razão óbvia: gastam, no imediato, menos dinheiro. O
pior vem depois. Com efeito, para os titulares do chamado investimento
em ativos, o que conta prioritariamente é a valorização do mesmo, com
vista à sua rápida alienação, o que envolve determinados pressupostos,
qual seja o de que esse jogador tem de jogar e dar nas vistas.
São
várias as estórias conhecidas de treinadores que na hora de fazer a
linha são confrontados com as exigências dos ditos fundos de incluir os
seus activos na equipa. É mais um afloramento do princípio de que o
dinheiro fala sempre mais alto, colocando os clubes numa situação de
dependência e transformando-os em verdadeiras barrigas de aluguer.
Mas
não fica por aqui o desconforto. É que as conveniências dos fundos não
coincidem necessariamente com os interesses dos clubes nos quais os
jogadores estão “parqueados”. Os clubes olharão sempre mais para as
prioridades desportivas e os fundos para a vertente económica. São
ilustrativas as diligências que a Traffic fez no defeso de colocar o
Xandão no mercado italiano, com o Sporting sem saber se ele ficava ou
partia...
Quanto à transparência, estamos conversados. Em
primeiro lugar, a verdadeira titularidade dos fundos e organizações
congéneres está normalmente ocultada por convenientes localizações em
paraísos fiscais, por forma que ninguém nunca sabe, ao certo, quem é o
dono de quê.
Depois, os fundos têm frequentemente os seus
activos dispersos por diversas equipas, muitas das quais, concorrentes
entre si; e a lógica das aplicações financeiras pode levar a que
determinado jogador seja posto mais em destaque, que determinado jogador
faça tudo para não se magoar, que determinado jogador se guarde para as
competições europeias em detrimento das nacionais, tudo isso ao arrepio
da verdade desportiva.
Finalmente, todos estes circuitos
financeiros tão tortuosos e sofisticados, conduzem inexoravelmente à
dúvida se, em alguns casos, não estaremos perante verdadeiras
lavandarias de dinheiro.
O aprofundamento das regras
internacionais do fair play desportivo, trará, com toda a probabilidade,
o fim deste modelo; os clubes portugueses que estão nele alavancados (e
são muitos!), que se cuidem.
PS – Ajudava à
transparência, saber-se como foi a repartição dos dinheiros, nas vendas
do Hulk e do Witsel; penso, porém, que o generoso Zenit deve estar muito
agarrado com cláusulas de confidencialidade...
IN "RECORD"
06/09/12
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