04/06/2012

JOSÉ ANTÓNIO LIMA

  
 Dito&Feito 


A telenovela das pressões de Miguel Relvas sobre jornalistas do Público pode resumir-se a uma única questão relevante: o ministro ameaçou, ou não, revelar detalhes da vida privada de uma jornalista?

 Tudo o mais é, como confirmam os próprios responsáveis do Público, basicamente irrelevante. Não era notícia e, portanto, não era publicável o facto de o ministro não responder a mais duas ou três perguntas da jornalista (que pouco ou nada adiantavam, assinale-se, ao caso). 

Não era, igualmente, notícia o facto de o ministro ter feito um telefonema de protesto, mais ou menos ríspido e agressivo – pois quem anda no jornalismo sempre lidou com telefonemas desses e ultrapassa-os mostrando que não se deixa condicionar. 

Todo este episódio – típico do chamado jornalismo queixinhas – só se tornou, aliás, notícia pela divulgação intencional, e à revelia da direcção do Público, de um comunicado corporativista, irresponsável e com óbvios intuitos noticiosos do Conselho de Redacção do jornal. Resta, pois, o único ponto relevante. Se Relvas ameaçou que colocaria na internet detalhes privados da jornalista, então só podia começar a tratar, no momento seguinte, da sua demissão do Governo – isso seria uma ameaça pessoal intolerável e um ataque indesculpável à liberdade de imprensa. 

Se Relvas não ameaçou, está a ser alvo de uma campanha difamatória. O problema é que a jornalista assegura que sim e o ministro jura que não. E não parece haver meio de verificar qual a versão verdadeira, reduzindo o caso a uma acusação sem provas. Para já, o episódio teve mais efeitos e aproveitamentos políticos do que deontológicos, o que não abona a favor dos jornalistas. 

Veremos a que (in)conclusões chegará a ERC. Não perdendo a oportunidade, o líder parlamentar do PS, Carlos Zorrinho, veio exigir «que este caso não gangrene e não fique a inquinar as relações entre jornalistas e políticos». 

Ora um partido como o PS, que manteve ao longo dos seis anos do Governo de Sócrates uma relação manipuladora e doentia com a comunicação social – com pressões directas a propósito de notícias sobre a licenciatura de Sócrates, tentativas de asfixia económica sobre o SOL devido aos casos Freeport e Face Oculta, ensaios de compra e silenciamento da TVI, etc. – devia ter, agora, um mínimo de decoro e de vergonha quando fala de jornalismo. E de pressões indevidas. 

IN  "SOL" 
28/05/12 


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